O novo governo americano deverá estreitar os laços com a América Latina, mas, mesmo assim, a região ainda continuará em segundo plano para os Estados Unidos, disse à BBC Brasil o especialista em relações internacionais Moisés Naím, editor da revista americana Foreign Policy. "Há uma piada de mau gosto que diz que a América Latina não é competitiva nem como ameaça", disse Naím, que participou do Fórum Econômico Mundial na América Latina, encerrado nesta quinta-feira, no Rio de Janeiro. A piada citada por Naím se refere ao fato de a região não ter ameaças como bombas nucleares ou ataques extremistas.
Segundo o especialista, temas emergenciais, como Afeganistão e Paquistão, devem continuar a ser prioridade para Washington. No entanto, Naím diz que há um compromisso real do governo de Barack Obama de dar mais atenção à América Latina, região que, na opinião de muitos analistas, foi ignorada durante o governo de George W. Bush. "Há uma atitude de maior engajamento e mais disposição para ouvir da parte de Obama", disse Naim.
Na opinião do analista, o recente anúncio do relaxamento de algumas restrições a Cuba, por exemplo, seria um indicativo dessa nova postura americana e um movimento em direção ao fim do embargo.
Cúpula das Américas
Nesta sexta-feira, líderes de 34 países da América Latina estarão reunidos em Trinidad e Tobago na 5ª Cúpula das Américas, e é grande a expectativa em relação à participação de Obama no encontro. Segundo Naím, a cúpula ocorre em um momento em que as divisões internas na América Latina são até mais profundas do que a própria divisão entre a região e os Estados Unidos.
"A América Latina está dividida internamente. Há um eixo de Hugo Chávez e outro de Lula", disse Naím, que foi ministro de Indústria e Comércio da Venezuela no início dos anos 1990. Para ele, o eixo alinhado a Chávez inclui, além da Venezuela, países como Bolívia, Equador, Paraguai, Argentina, Cuba, Honduras e Nicarágua. "São países com posições até hostis em relação aos investimentos privados e aos Estados Unidos."
O grupo liderado pelo presidente brasileiro, segundo Naím, é formado por países como Chile, Colômbia e Peru e tem uma atitude mais aberta em relação aos investimentos do setor privado. "São países muito engajados com o resto do mundo e que têm uma relação muito próxima e amigável com os Estados Unidos", afirma.
Nesse contexto de aproximação do governo americano com a América Latina, o Brasil deve assumir uma posição de destaque, segundo o especialista. Naím disse que o Brasil recebe pouca atenção dos Estados Unidos se comparado, por exemplo, a Cuba. Para ele, há vários temas em que Estados Unidos e Brasil podem trabalhar de maneira mais próxima, como comércio e meio ambiente. "A questão ambiental não pode ser resolvida sem o Brasil", disse.
Apesar de toda a expectativa quanto à participação de Obama na reunião de Trinidad e Tobago, Naím disse que o clima da cúpula será de "speed dating" (encontros rápidos em que casais têm poucos minutos para conversar e se conhecerem). "São 34 presidentes e todos querem se reunir com Obama. Se ele conceder 30 minutos para cada um, seriam 17 horas", disse. "Não vai acontecer."