Favoritismo do 'brother' Obama desperta frenesi no Quênia

Democrata virou celebridade em Kisumu, cidade que o candidato só conheceu aos 27 anos

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Por Ferdinando Casagrande
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Pela janela do avião, a cidade de Kisumu parece acanhada, quase a se afogar nas águas barrentas do imenso Lago Vitória, que alaga parte da fronteira entre o Quênia e Uganda. Em terra firme, porém, Kisumu ferve. Os cerca de 503 mil habitantes dessa cidade a 340 quilômetros da capital, Nairobi, vivem há meses um frenesi chamado Barack Obama. Veja também: Estadao.com.br na terra dos Obamas Diário de bordo da viagem ao Quênia  Confira os números das pesquisas nos Estados Obama x McCain  Entenda o processo eleitoral   Cobertura completa das eleições nos EUA Filho do economista queniano Barack Hussein Obama, natural da aldeia de Kogelo, localizada a 60 quilômetros da cidade, o candidato democrata à presidência dos Estados Unidos é no momento a principal celebridade em Kisumu. A avó de Obama, Sarah, de 86 anos, vive até hoje numa casa simples na vila. Cria patos, galinhas e mantém uma roça de milho. O pai dele, morto num acidente de carro em 1982, está enterrado nas terras da família. Nas ruas, as pessoas usam bonés e camisetas da campanha o democrata e gritam "brother Obama" sempre que algum jornalista surge com câmeras a tiracolo. "Todos estão torcendo pelo Obama e não só aqui, mas no país todo", diz o comerciante Evans Kokeyo, de 49 anos. "Se os quenianos pudessem votar nos Estados Unidos, o candidato branquelo não teria a menor chance." Fotos de Obama estampam as capas dos principais jornais quenianos e várias músicas cantam sua história e suas qualidades em swahili, a segunda língua oficial do país, e em luo, a língua da região. "Nos Estados Unidos, ele é americano. Aqui, ele é queniano", resume o publicitário Andrew Musiga, de 63 anos. "Ele representa um novo jeito de fazer política, não só nos EUA, mas no mundo inteiro. Quando o vê pela televisão, a África toda se reconhece nele." Voluntária Na entrada do shopping center Nakumatt, uma jovem americana da Califórnia vende botons do candidato. "Eu vim para o Quênia como voluntária, para trabalhar num projeto com crianças", explica a estudante Erika Cordoma, de 24 anos. "Decidimos aproveitar esta febre para levantar fundos para a fundação." Os preços do botons variam de 150 a 600 shillings (algo entre US$ 2 e US$ 8). "As pessoas compram bastante porque todos amam o Obama." Esse amor não se deve apenas ao fato de Obama pai ter nascido em Kogelo, uma vila rural que Obama Junior sequer conhecia até os 27 anos de idade. O candidato democrata é idolatrado porque, ao brilhar numa eleição americana, ele atrai atenção do mundo inteiro para a etnia luo no ápice de um processo de auto-afirmação política do grupo. Apesar de serem a terceira maior etnia do país, com 13% da população, os luos sempre foram subjugados pelos kikuyos, que representam 20% dos quenianos, na divisão do poder. Em dezembro, o presidente Mwai Kibaki, que é kikuyo, foi declarado vencedor numa eleição que o candidato oposicionista Raila Odinga, que é luo, declarou fraudulenta. O resultado eleitoral foi o estopim da explosão de tensões étnicas no país, que causaram 800 mortes desde então. O empresário Charles Odunga, que concorreu ao Parlamento nas eleições de dezembro pela oposição, acha que a vitória de Obama pode ajudar a consolidar a paz, que já vem sendo costurada pelos políticos do país. "Nossos irmãos Raila e Kibaki estão encontrando o caminho para retomar a convivência pacífica", afirma. "Mas Obama é um filho do Quênia e, como também é uma pessoa de paz, uma vitória dele representa muito para o nosso país neste momento em que precisamos colocar todos os quenianos juntos de novo."

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