05 de outubro de 2012 | 08h53
Mehmet estava em casa com a família, na quarta-feira, quando morteiros disparados da Síria caíram perto da sua casa, em Akcakale, cidade fronteiriça turca que se viu involuntariamente levada para o conflito no país vizinho.
O faz-tudo de 36 anos, que só se identificou pelo primeiro nome, juntou a família e sua mãe, idosa, e levou todos para a rua. Só então percebeu como os foguetes haviam caído perto da casa.
"Saímos e vimos a casa do vizinho completamente destruída. Foi horrível", disse Mehmet, com olhos marejados.
Duas mulheres e três crianças da mesma família morreram na queda do morteiro sobre a casa que fica em frente à de Mehmet, e várias outras pessoas ficaram feridas.
O morteiro abriu um rombo no muro do quintal, e fragmentos deixaram marcas na construção. Um portão metálico azul agora está retorcido e cheio de furos.
"Há 20 dias não dormimos, estamos preocupados com o que vai cair nas nossas cabeças. Não foi a primeira vez que nos atingiram", disse Mehmet, apontando uma pequena cratera próxima.
Morteiros caem nesta cidade de 40 mil habitantes desde setembro, quando rebeldes conquistaram o lado sírio da ponte fronteiriça de Akcakale, atraindo ataques das forças do governo de Bashar al-Assad.
O ataque de quarta-feira foi o mais grave incidente transfronteiriço em 18 meses de conflito na Síria, que ameaça envolver nações vizinhas. Na própria quarta-feira, a artilharia turca bombardeou alvos na Síria, e o Parlamento em Ancara aprovou uma autorização para ações militares no país vizinho.
Ao longo dos 900 quilômetros de fronteira com a Síria, os turcos estão cada vez mais insatisfeitos por sofrerem os reflexos da violência no país vizinho, e dezenas de milhares de sírios estão refugiados em território turco.
"Olhe o campo de refugiados que construíram para os sírios. Onde o construíram? Bem na saída da nossa cidade. Então os sírios disparam morteiros em nós. Funcionamos como um ímã", disse Ibrahim Cilden, que mora a algumas casas de Mehmet. "Nossa cidade se tornou uma zona-tampão."
No centro desta agitada cidade, a vida prossegue normalmente, mas Mehmet e Ibrahim vivem num bairro grudado na fronteira, que agora parece mais uma cidade-fantasma, com casas vazias e lojas lacradas. As escolas locais fecharam.
A maioria da população de Akcakale tem origem étnica árabe, mas, apesar dos vínculos, Akcakale não vê com bons olhos seus vizinhos do sul -- especialmente depois do início da onda de refugiados.
"Um homem chega até a fronteira e a cruza na sua moto, dá para acreditar nisso", disse o alfaiate Abdullah Turk. "Estamos arruinados. Akcakale está arruinada."
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.