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11/9: o dia em que o mundo parou para lembrar

Veja nosso especial Veja o especial The New York Times-O Estado de S. Paulo

Por Agencia Estado
Atualização:

O lamento de um trompete no Afeganistão. Uma cruz de metal retorcido em Roma simbolizando a carnificina de um ano atrás. Um árabe na Jordânia desejando que os Estados Unidos recebam outro golpe terrorista. No aniversário dos atentados de 11 de setembro, o mundo tornou-se hoje um grande palco para lembrar e refletir sobre o que antes era inimaginável. "Nenhuma situação de dor, nenhuma filosofia ou religião podem justificar tão grave ofensa à vida humana", disse o papa João Paulo II. Também não há justificativa, acrescentou, para as "escandalosas" injustiças que fomentam o terrorismo. Homenagens da Ásia à América Latina buscavam expressar como os ataques tocaram os cidadãos do mundo e sacudiram o núcleo da política, segurança e religião. Na Noruega, mais de 3.000 tochas queimaram na frente da Prefeitura de Oslo - uma para cada vítima. O mesmo número de pétalas de rosas foram jogadas no interior da Catedral St. Paul, em Londres. Coros na Nova Zelândia e Japão deram início a um réquiem de Mozart que foi repetido em 20 fusos horários. Numa missa realizada na Basílica Santa Maria degli Angeli, em Roma, uma cruz de metal retorcido sobre uma pilha de pedras simbolizava a devastação dos ataques. Líderes prometeram nunca sucumbir à principal arma dos terroristas: insegurança e pânico generalizados. "As forças das trevas contra a civilização", afirmou o premier grego, Costas Simitis. Mas a mensagem soou vazia em alguns lugares. "Ninguém conseguirá nos fazer sentir que o mundo seja novamente um local seguro até que aqueles por trás desses ataques tenham sido capturados e punidos", afirmou Romaine Iskandar, depois de uma cerimônia fúnebre em Beirute, Líbano, para seu sobrinho e três outros libaneses que morreram nos ataques. Autoridades, também, vêem o mundo de forma diferente. Políticas mais agressivas têm atraído críticas de ativistas dos direitos humanos e grupos muçulmanos. No Paquistão, autoridades invadiram um suposto esconderijo da rede Al-Qaeda, de Osama bin Laden, em Karachi. Dois suspeitos foram mortos e cinco policiais ficaram feridos num tiroteio de três horas. Cinco suspeitos foram capturados. Em Hamburgo, Alemanha - onde viveram três dos seqüestradores de 11 de setembro -, a polícia vasculhou um centro islâmico depois de ter recebido informações de que uma bomba estava sendo preparada no local para um ataque. Não foi encontrada evidência de atividade terrorista. "Mesquitas estão sob extrema vigilância extrema aqui, agora, e eu não gosto disso", reclamou Zullajrat Fejzullahi, um albanês étnico da Macedônia que imigrou para a Alemanha. O aniversário levou autoridades a intensificar alertas de segurança. Citando ameaças "confiáveis e específicas", o Departamento de Estado dos EUA e alguns dos aliados mais próximos dos americanos fecharam escritórios diplomáticos em nove países. Todos menos um - na nação africana de Malawi - estavam na Ásia e Oriente Médio. Muitos aeroportos davam mostra das profundas preocupações públicas: terminais repletos de seguranças, mas com bem menos viajantes do que o normal. No aeroporto de Heathrow, em Londres, a British Airways cancelou metade de seus vôos transatlânticos por falta de passageiros. Líderes políticos - mesmo aqueles que entraram em choque com os EUA sobre um possível ataque ao Iraque - expressaram pêsames e solidariedade. "A França sabe o que deve aos EUA", disse o presidente francês, Jacques Chirac, numa cerimônia na residência do embaixador americano em Paris. "O povo francês está com seus corações ao lado do povo americano". O presidente russo, Vladimir Putin, telefonou para o presidente americano, George W. Bush, para expressar suas condolências. "Na Rússia, dizem que o tempo cura, mas não podemos esquecer. Nós temos que não esquecer", teria dito Putin, segundo a tevê russa. Nas Nações Unidas, o secretário-geral Kofi Annan pediu que comunidade internacional mostre sua união contra o terrorismo. "Tudo aquilo em que acreditamos está ameaçado: o respeito pela vida, a justiça, a tolerância, o pluralismo e a democracia", afirmou. No Afeganistão, forças dos EUA ficaram sob fogo. Um atirador fez disparos contra uma guarita da guarda em Bagram, quartel-general das forças lideradas pelos EUA que caçam remanescentes da Al-Qaeda. Soldados responderam ao fogo, mas o atacante fugiu. Na cidade sulista de Khost, dois mísseis foram disparados por desconhecidos contra o aeroporto onde forças especiais dos EUA estão baseadas. Ninguém ficou ferido. Mas a capital, Cabul, testemunhou uma melancólica cerimônia na Embaixada dos EUA, reaberta depois da queda do Taleban. O lamento de um clarinete dava o tom da cerimônia. A bandeira americana foi hasteada a meio mastro. Um bloco fundido de cimento e vidro do World Trade Center foi enterrado sob o mastro da bandeira. "Meu medo é o de que as pessoas passem a achar tudo natural e esqueçam o que aconteceu", disse o capitão Farrel Sullivan, que coletou os destroços. "Que algum tipo de amnésia domine". Autoridades garantem que isso nunca irá ocorrer. "Esta data foi fundida em nossas memórias", afirmou a primeira-ministra da Nova Zelândia, Helen Clark. "Esses ataques são atos de violência absolutamente incompreensível". Mas no mundo árabe - e especialmente no Oriente Médio - muitos dizem compreender claramente as razões dos ataques: supostas políticas dos EUA para obter um domínio incontestável e o apoio incondicional de Washington a Israel. "Espero que a Casa Branca seja atingida", afirmou Mohammad Ali Masa´id, um oficial militar jordaniano da reserva. "Sentimos revolta e ódio em relação ao governo americano e às companhias americanas que o apóiam", disse Abdel Aziz el-Husseini, um engenheiro do Cairo que tem ajudado a liderar um boicote a produtos americanos. Líderes palestinos e israelenses condenaram os atentados - mas não concordavam sobre seu significado. Numa cerimônia em Jerusalém, o primeiro-ministro israelense, Ariel Sharon, incluiu a Autoridade Palestina, de Yasser Arafat, entre os patrocinadores do terrorismo, que "são todos partes inseparáveis do mesmo eixo do mal que ameaça a paz e a estabilidade em toda parte do mundo". O ministro palestino Saeb Erekat acusou Sharon de "sequestrar" o 11 de setembro para reprimir os palestinos. No Iraque, o jornal estatal Al-Iktisadi trouxe em sua primeira página uma foto do World Trade Center em chamas com a manchete em vermelho: "Castigo de Deus". Em toda a região existe um profundo desconforto com a possibilidade de uma campanha militar dos EUA para derrubar o líder iraquiano Saddam Hussein. "O mundo não é uma selva onde um país poderoso decide pelo resto do mundo", disse o iraniano Morad Musseinpour, cujo país foi rotulado como parte de um "eixo do mal" pelo presidente Bush por supostamente apoiar terroristas. Em Nairóbi, Quênia, uma cerimônia teve um significado especial. Atentados a bomba contra Embaixadas dos EUA no Quênia e Tanzânia em 1998 mataram 231 pessoas, entre elas 12 americanos. "O Quênia foi vítima de um ataque terrorista", lembrou o ministro da Saúde Sam Ongeri. "Os quenianos podem se solidarizar com as vítimas de 11 de setembro." Em meio a incontáveis cerimônias e eventos, alguns dos momentos mais profundos ocorreram em silêncio. Depois de dois minutos de silêncio em Copenhagen, Dinamarca, o prefeito Jens Kramer Mikkelsen declarou: "Não deixaremos que o medo tome conta de nós". Numa faixa na Torre de Pisa, na Itália, lia-se: "Da torre para as torres. 11 de setembro de 2002. Lembrança, solidariedade paz".

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