Presidente alinhou os EUA à narrativa de Riad sobre quem é responsável pelo terror jihadista, alimentando a instabilidade na região
Por Fareed Zakaria
Atualização:
O atentado em Manchester foi mais um sinistro lembrete de que a ameaça do terrorismo islâmico continua ativa. E a viagem do presidente Trump ao Oriente Médio ilustra mais uma vez como o país que está no centro da difusão desse terrorismo, a Arábia Saudita, tem conseguido evadir-se de qualquer responsabilidade. Trump, na verdade, deu ao país passe livre na região.
Há cinco décadas, a Arábia Saudita vem espalhando sua estreita, puritana e intolerante versão do Islã. Osama bin Laden era saudita, como eram 15 dos 19 terroristas do 11 de Setembro. E sabemos que o governo saudita, com o do Catar, vem dando apoio financeiro e logístico clandestino ao Estado Islâmico (EI) e a outros grupos sunitas radicais. Os sauditas são o segundo maior contingente de combatentes estrangeiros do EI. O reino também tem aliança tática com a Al-Qaeda no Iêmen. O EI baseia sua doutrina na versão wahabita do Islã da Arábia Saudita.
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O dinheiro saudita agora está mudando também o Islã europeu. Informações dos serviços de inteligência alemães indicam que instituições de caridade “com estreitas ligações” com os governos” de Arábia Saudita, Catar e Kuwait estão financiando mesquitas, escolas e imãs para disseminarem uma versão fundamentalista e intolerante do Islã na Alemanha.
O governo saudita começou a afrouxar algumas de suas piores práticas. O país é governado por um reformista, o vice-príncipe Mohammed bin Salman, que parece ser saudavelmente pragmático. Mas, até agora, as reformas parecem se traduzir mais em melhores políticas econômicas do que na ruptura com o establishment religioso.
O discurso de Trump sobre o Islã teve nuances e mostrou simpatia pelas vítimas muçulmanas do terrorismo. Ele chegou a parecer que atacava o problema quando disse: “Nenhuma discussão ou abordagem decisiva dessa ameaça serão completas sem mencionar o governo que dá aos terroristas o abrigo, suporte financeiro e status social necessários ao recrutamento”.
Trump, porém, não estava falando da Arábia Saudita, mas do Irã. É verdade que o Irã é uma força desestabilizadora do Oriente Médio e apoia grupos muito perigosos. Não se pode, no entanto, apontar o país como a fonte do terrorismo jihadista. Segundo uma análise do Banco de Dados do Terrorismo Global, feita por Leif Wenaar, do King’s College, mais de 94% das mortes causadas pelo terrorismo islâmico desde 2001 foram de autoria do EI, Al-Qaeda e outros grupos jihadistas sunitas. O Irã combate essas organizações, não as patrocina.
O americano adotou a linha saudita sobre terrorismo, que afasta toda culpa do reino e a redireciona para o Irã. Em 2016, o então candidato Trump postou no Facebook o seguinte: “A Arábia Saudita e muitos dos países que deram grandes somas à Fundação Clinton querem manter as mulheres escravizadas e matar os gays. Hillary tem de devolver o dinheiro que recebeu desses países”. Em suma, os sauditas dobraram Trump.
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Os EUA alinham-se agora à política externa da Arábia Saudita – uma ininterrupta série de batalhas no Oriente Médio contra xiitas e seus aliados. Essa decisão vai envolver Washington numa interminável luta sectária, alimentar a instabilidade regional e complicar os laços americanos com países como o Iraque, que desejam boas relações com os dois lados. E, mais grave: não fará nada para atacar a ameaça direta e atual sobre os americanos – o terrorismo jihadista. Eu achava que a política exterior de Trump buscava pôr os EUA em primeiro lugar, não a Arábia Saudita. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ É COLUNISTA
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