''''A Colômbia está vencendo o terrorismo''''

Álvaro Uribe: presidente da Colômbia[br]Uribe explica por que não aceita uma zona desmilitarizada e elogia a discrição de Lula a respeito dos reféns das Farc

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Por Ricardo Kirschbaum , Paula Lugones e CLARÍN
Atualização:

O presidente da Colômbia, Álvaro Uribe, afirmou que seu colega brasileiro, Luiz Inácio Lula da Silva, tem ajudado muito a solucionar o conflito envolvendo os reféns das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). Os elogios a Lula foram feitos em entrevista ao jornal argentino Clarín, na semana passada, quando Uribe acompanhou a posse da presidente argentina, Cristina Kirchner. A seguir, os principais trechos da entrevista do presidente colombiano. Presidente, sobre as Farc, o senhor é o vilão da história? Pela primeira vez, em muitos anos, a Colômbia tem um governo que está atingindo um objetivo claro: a segurança democrática efetiva. Essa política tem por fim fortalecer a democracia pluralista, derrotar um terrorismo mafioso sustentado pelas drogas e ter uma segurança eficiente, baseada nos direitos humanos, para proteger a todos os colombianos. Contudo, a impressão é de que a Colômbia ficou na defensiva depois da iniciativa de Chávez e do presidente da França. Fiz mais de dez tentativas de libertar os reféns. Quando era candidato, disse que não negociaria com o terrorismo. Aceitei mudar de posição depois de conversar com a Igreja Católica e com os familiares dos reféns. Libertei 77 presos das Farc e acatei o pedido do presidente Sarkozy para libertar Rodrigo Granda com a ilusão de que as Farc libertariam os reféns. Contudo, a única resposta que tivemos foi o assassinato de 22 seqüestrados. A zona desmilitarizada é meu limite. Isso eu não posso oferecer. Por que não? Porque no passado isso não adiantou. Ela se tornou refúgio da guerrilha. No governo anterior estabeleceu-se uma zona desmilitarizada durante três anos e meio e os reféns não foram libertados. Essas zonas deixam desprotegidas a população local. O povo colombiano tem o direito de derrotar o terrorismo democraticamente. Quando me perguntam se tenho a obrigação ética de facilitar a libertação, digo que já fiz de tudo e que tenho outro dever ético, que é evitar que os seqüestros se intensifiquem. Em uma negociação sempre se cede alguma coisa. Em que o governo está disposto a ceder? A negociação não pode ser uma reconciliação com o terrorismo. Os campos de concentração de Hitler cresceram enquanto a Europa procurava se apaziguar com ele. Graças à firme determinação deste governo, estamos derrotando o seqüestro. O senhor acha que o governo continua ganhando? Ainda não vencemos, mas vamos ganhar. Por isso não podemos retroceder. Por que o senhor descarta as negociações diretas? Temos mostrado disposição para entrar em negociações diretas, mas não podemos atender à condição imposta pelas Farc, de uma zona desmilitarizada, porque não vamos permitir que nossa política de segurança seja debilitada. Por que então os paramilitares tiveram uma zona desmilitarizada? Nesse caso não houve uma zona desmilitarizada. Mas sim uma zona que eles usaram para entregarem as armas e se desmobilizarem. Este é o primeiro governo que combateu os paramilitares e os derrotou. Na Colômbia existem guerrilhas e narcotraficantes, juntos ou separados, mas já não temos organizações criminosas privadas para combater outros criminosos. O senhor propõe uma zona "de encontro". O que é isso? Uma zona rural, despovoada, para que não deixemos os colombianos à mercê do terrorismo. A zona poderia ser de 150 quilômetros quadrados. Nela, não deve existir nenhum posto policial ou do Exército. Assim, não é preciso falar em "desmilitarizar". Ofereci também um fundo de US$ 100 milhões para pagamento de recompensas aos guerrilheiros que estão vigiando os reféns para que desobedeçam seus chefes e entreguem os seqüestrados. Essa proposta é muito similar a outra que o governo fez há dois anos. Por que as Farc aceitariam agora? Não sei. Ao aceitar a proposta da Igreja, ponderei duas coisas. Primeiro, que meu governo deveria dar um passo a favor da libertação dos seqüestrados, mas que esse passo fosse dado sob certas condições. O senhor sente as pressões internacionais? As únicas pressões que sinto são as da minha própria consciência. E ela está tranqüila quanto ao que a Colômbia já fez. Na mediação da Venezuela, o governo colombiano ignorou os riscos políticos ao facilitá-la, dando prioridade ao interesse humanitário. Depois, quando a mediação foi suspensa... Por que o senhor a suspendeu? O governo colombiano emitiu comunicados exaustivos explicando o assunto e não vou repeti-los. É preciso lidar com esse assunto com prudência porque sinto ter deveres para com os países irmãos. O senhor não acha que a gestão de Chávez poderia ter prosperado? Eu estava convencido de que a guerrilha poderia entregar os reféns a Chávez. Tanto que autorizei a mediação. No entanto, se a guerrilha quiser entregar os reféns ao governo de Sarkozy, a algum organismo internacional ou ao governo da Venezuela, tudo bem. Os vídeos de Ingrid Betancourt demonstram que as Farc tinham concordado em fornecer as provas de vida... (Desconcertado) São provas de vida e de tortura, incompletas. Eles entregaram apenas 16 e não as 750 pessoas seqüestradas nos últimos anos. Mas não era um sinal de que Chávez estava conseguindo algo? Não quero pronunciar-me sobre esse assunto. Quando se soube que esse material havia sido confiscado, ele foi entregue à opinião pública. Vimos Ingrid nos vídeos, em um estado miserável. Qual seria o impacto sobre o senhor se ela morresse no cativeiro? Causou-me muita dor o assassinato de colombianos em circunstâncias semelhantes. Meu pai foi assassinado em uma tentativa de seqüestro. Mas o senhor tem os instrumentos na mão para fazer alguma coisa... Já dei muitos passos, mas tenho de ter muito cuidado. Peço a Deus que me ilumine para que esses passos não afetem nossa política de segurança. Como chefe de estado, o senhor não sente o peso de haver ainda pessoas seqüestradas há dez anos? Sinto muita dor porque faço parte das famílias colombianas que sofreram com essa violência. Neste caso, o senhor recebeu alguma proposta do presidente Lula? Ele ajuda muito. Falamos bastante sobre todos os assuntos e ele os maneja com uma discrição que eu admiro. O que o senhor espera da Argentina? Um diálogo construtivo. Escutar a presidente Cristina, esclarecer suas dúvidas e ouvir. Quero falar da necessidade de o povo colombiano superar essa tragédia. Enfraquecemos a guerrilha, os investimentos na Colômbia estão crescendo, reduzimos o desemprego à metade e a pobreza em 15%. O senhor pensa em outro mandato? A Colômbia é um país de leis. Mas, na região, as Constituições estão sendo mudadas... Isso é tema de romance... Bom, a Colômbia tem bons romancistas (Rindo) Sim, mas escrevem sobre outros temas.

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