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A passividade dos EUA na Síria

Falta de ação para conter excessos de Assad, um líder distante de Washington, tornou-se inescrupulosa e amoral

Por Jackson Diehl
Atualização:

Chegam ao Ocidente relatos de novos episódios nos quais forças de segurança sírias abriram fogo contra uma multidão de manifestantes pacíficos. Isso nos leva a perguntar: o que será necessário para levar as democracias ocidentais a responder aos massacres em série de tantos civis nas mãos do regime de Bashar Assad? O mais recente caso de derramamento de sangue ocorreu ontem - no funeral de algumas das 104 vítimas do massacre da véspera, em várias cidades do país. Na terça-feira, em Homs, a polícia já reprimira com violência um outro protesto, após milhares de pessoas terem ocupado a praça central.As informações são desencontradas. A Síria proibiu a entrada de jornalistas estrangeiros e tem se esforçado para censurar a internet. No entanto, relatos de moradores obtidos pela BBC e vídeos divulgados no YouTube indicam que as forças de segurança atacaram a praça de Homs na madrugada, disparando com armas automáticas contra a multidão. "Ouçam os disparos", disse uma pessoa à BBC por telefone. "Podem ouvi-los? Está chovendo balas sobre os manifestantes." O número total de vítimas nos vários episódios de repressão ainda se desconhece. Os ataques em massa contra civis por parte das forças de segurança estão se tornando uma ocorrência quase diária na Síria. Na cidade de Deraa, no sul do país, onde o movimento dos manifestantes teve início no mês passado, múltiplos massacres ocorreram, entre eles o do dia 8, quando atiradores abriram fogo contra a multidão que marchava com ramos de oliveira. Ao menos 27 pessoas morreram. Houve episódios parecidos na cidade de Banias e em muitos vilarejos da região. E esses são apenas os casos que os grupos de defesa dos direitos humanos conseguiram documentar. Promessas vazias. Ao todo, o número de mortos pelo regime deve passar dos 300. O governo mistura promessas vazias de mudança com repressão: horas após o tiroteio de terça-feira, anunciou a suspensão de uma lei de emergência que estava em vigor há décadas. No entanto, abrir fogo contra multidões não era permitido nem mesmo sob o regime de leis de emergência. Não há indício de que isso signifique o fim dos massacres, a não ser que o governo seja derrubado ou que se torne alvo de uma intensa pressão internacional. Em quase todos os casos nos quais os assassinatos promovidos pelo Estado atingiram tamanhas proporções nos últimos anos, a reação dos EUA e de outras democracias foi enérgica. O massacre de manifestantes no Usbequistão, na cidade de Andijon, em 2005, levou ao rompimento das relações de EUA e União Europeia com o país. A Otan interveio na Líbia para proteger os civis dos ataques de Muamar Kadafi. No entanto, a resposta ao derramamento de sangue desencadeado por Assad na Síria se limitou à retórica. O presidente dos EUA, Barack Obama, descreveu os ataques em Deraa como "revoltantes". A Casa Branca classificou de "inaceitável" o massacre em Banias, na semana passada. O governo americano evitou até mesmo a adoção de medidas diplomáticas para manifestar sua insatisfação, como convocar de volta seu embaixador em Damasco. O caso da Síria não foi denunciado ao Conselho de Direitos Humanos da ONU e muito menos ao Conselho de Segurança. Direitos humanos. A Síria, aliás, não é aliada dos EUA. Trata-se da principal parceira do Irã no mundo árabe e patrocinadora do Hezbollah e do Hamas.Durante anos, o país serviu como entreposto para homens-bomba que rumavam para o Iraque com o objetivo de matar soldados americanos. Além disso, o país tentou secretamente construir um reator nuclear com o auxílio da Coreia do Norte. No entanto, mesmo diante de repetidos casos de notáveis crimes contra os direitos humanos, como os disparos feitos contra manifestantes desarmados, o governo Obama se mantém passivo. Inicialmente, sua resposta provocou confusão. Depois, pareceu ser profundamente equivocada. Agora, tornou-se apenas inescrupulosa e amoral. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL.É COLUNISTA