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A paz na Colômbia

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Por Mac Margolis
Atualização:

Há poucos meses, o presidente colombiano, Juan Manuel Santos, estava em franca ascensão. Com o crime sob controle, instituições consolidadas, inflação em baixa e gás e óleo brotando a quase cada perfuração, o modesto país andino tinha perspectivas invejáveis. Enquanto o Mercosul patinava, Bogotá comemorava uma série de novos acordos comerciais com uma guinada para a Ásia. Sua economia, de US$ 370 bilhões, desbancou a da Argentina, tornando-se o quinto PIB latino. Com investimentos fartos e o aval dos eleitores, o governo de Santos quis mais. Quiçá demais. No início do ano, Santos apostou seu capital político numa nova rodada de negociação com as Forças Armadas Revolucionários da Colômbia (Farc), levando a guerrilha à mesa de negociações em Havana, Cuba sob a guarida da Noruega. Foi uma ousadia. A guerra das Farc flagela o país há meio século e ainda teima, enterrando atestados de óbitos precoces e queimando carreiras políticas. Para que Santos salve a sua, terá de superar empecilhos diversos, equilibrando-se entre bombas e urnas, sem abandonar a delicada ofensiva diplomática em que o tempo joga contra. A um ano das eleições, ele amarga queda de popularidade: 46% dos colombianos já desaprova seu governo e seis em cada dez não querem sua reeleição. A queda é recente, mas coincide com as espichadas negociações de paz, que já mostram sinais de fadiga. No início do ano, Michael Shifter, do centro de estudos Inter-American Dialogue, de Washington, viu na Colômbia esperança e um grande temor. "Se a negociação se estender por mais de seis meses, periga fracassar." Já são mais de oito meses e a paz ainda está longe.Divisão. O passado não inspira. Em 1999, a liderança insurgente vagou a mesa de conciliação e deixou o então presidente Andrés Pastrana falando sozinho. Antes dele, os presidentes Belisário Betancour, Virgilio Barco, César Gaviria e Ernesto Samper fracassaram, ora perdendo terreno para a guerrilha, ora desperdiçando a confiança nacional.Contudo, Santos chegou a sua vez com condições excepcionais. Deve muito a seu antecessor Álvaro Uribe, o belicoso líder que descartou negociar com "bandidos" e "terroristas" e declarou guerra à guerrilha. Dizimou as Farc, matando meia dúzia de comandantes e empurrando a tropa mata adentro. Como ministro da Defesa do governo Uribe, Santos teve papel fulcral nas vitórias no campo de batalha. Eleito seu sucessor, mais que o silêncio das armas, Santos queria um contrato de paz.Após nove meses, o governo anunciou um acordo no primeiro de cinco itens da pauta: uma reforma fundiária, centrada na devolução de terras apropriadas à força. Não é pouco. O embate de décadas matou 600 mil pessoas e desterrou 3 milhões das zonas rurais.Essa foi a parte mais fácil. Agora, os negociadores debatem a participação política dos rebeldes desmobilizados. Em resumo: para firmar um acordo de paz, a guerrilha quer assentos garantidos no Congresso. A proposta afronta os colombianos que, em sua maioria, apoiam a reintegração dos rebeldes à sociedade, mas apenas para quem assuma seus crimes e pague por eles. Para boa parte do país, pular da barricada para a tribuna soa como lavagem de reputação. Para Uribe, soa pior. De cabo eleitoral e mentor, Uribe converteu-se em um dos maiores desafetos de Santos. No Twitter, dispara sem trégua: "Paz fictícia", "Insulto à nação" e "3 anos de nada". Com padrinhos assim, quem precisa de adversários?Santos sabe do desafio. Provável candidato à reeleição, entende que o próximo ano, provavelmente, será um de conversa longa, diplomacia espinhosa e contenção de danos. Para quem imaginava selar um acordo duradouro de paz, é pouco. No entanto, entre tiros e tuítes, uma paz negociada ainda pode ser a melhor opção.* É COLUNISTA DO ESTADO, CORRESPONDENTE DA REVISTA NEWSWEEK, EDITA O SITE WWW.BRAZILINFOCUS.COM

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