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A traição de Obama

Normalização das relações com Cuba favorecerá apenas os irmãos Castro, dizem dissidentes

Por MARC A. e THIESSEN
Atualização:

O presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, vem desfrutando de uma aclamação global por sua decisão de normalizar as relações com Cuba. Mas há um grupo que não se impressiona com a reconciliação com o regime de Havana: o dos dissidentes na ilha, que arriscam suas vidas em defesa da democracia e dos direitos humanos. Segundo Yoani Sánchez, a blogueira mais influente de Cuba, com a decisão de Obama, "o Castrismo venceu". Guillermo Fariñas, jornalista dissidente e vencedor do Prêmio Sakharov pela Liberdade de Pensamento de 2010, concedido pela União Europeia, disse ao jornal The Guardian que a medida é "um desastre". "Vivemos um temor diário de que seremos mortos pelo governo fascista. E agora os EUA - nosso aliado - nos dão as costas e preferem negociar com nossos assassinos."Ángel Moya, recentemente libertado depois de passar oito anos na prisão, declarou ao New York Times que Obama "traiu todos os que lutam contra o governo cubano". "Haverá mais repressão, só que desta vez com a bênção dos EUA", disse. Para o opositor, os dissidentes "são totalmente contra a flexibilização do embargo" porque o governo cubano terá mais acesso a tecnologia e dinheiro que podem ser usados contra eles. Moya está certo. O turismo e os investimentos dos EUA em Cuba não beneficiarão os cubanos comuns, mas ajudarão o regime a continuar a reprimi-los. Isso porque os irmãos Castro são o único empregador do país. Basicamente todos os cidadãos trabalham para o Estado. O monopólio do emprego pelo regime é fonte de controle político. Os cubanos dependem dos Castro para tudo - trabalho, habitação, educação, alimentação, e tudo lhes é negado face à manifestação de algum sentimento contrarrevolucionário. Isso significa que as empresas americanas que investirem em Cuba terão como parceiros os irmãos Castro. Elas não terão permissão para contratar trabalhadores cubanos diretamente ou pagar o salário deles em dólares. Terão de reembolsar o regime em torno de US$ 10 mil por empregado, que pagará para o trabalhador algumas centenas de pesos cubanos e embolsarão o restante. Assim, em vez de ajudar os cidadãos cubanos a se tornar independentes do Estado, as empresas americanas vão subsidiar diretamente o Estado policial cubano e, ao mesmo tempo, utilizar o que na verdade equivale a uma mão de obra escrava cubana. Essa seria uma razão suficiente para bloquear os investimentos americanos em Cuba. Mas há uma outra razão para os dissidentes se oporem à medida de Obama: ele abdicou da predominância dos EUA para influir no sentido de uma transição democrática pós-Castro. Depois de cinco décadas, está claro que Fidel e Raúl Castro nunca seguirão o exemplo do regime de Mianmar, que negociou um afrouxamento da repressão em troca da suspensão de sanções e a normalização das relações. Mas aqueles que sucederão aos Castros provavelmente o farão quando os irmãos desaparecerem. Praticamente todos na ilha - dentro e fora do regime - estão à espera de que eles finalmente morram para o processo de normalização dos vínculos políticos e econômicos se iniciar. Agora o regime não tem de esperar ou oferecer alguma coisa em troca porque Obama unilateralmente ofereceu ao governo cubano o reconhecimento político que ele buscava desesperadamente. Obama deu legitimidade aos Castros e espera que em breve comece o fluxo de turistas e investimentos empresariais que ajudarão o regime a manter seu sistema totalitário. Aparentemente ele não exigiu de Havana qualquer tipo de liberalização em troca - que permitisse uma imprensa livre, partidos políticos independentes, reformas de livre mercado ou eleições livres, muito menos um fim da repressão contra os dissidentes. Obama está impedido de suspender totalmente o embargo porque ele foi inserido em 1996 na Lei Helms-Burton. A suspensão completa das sanções econômicas por lei está condicionada a que um regime pós-Castro adote medidas expressivas para desmantelar o Estado policial, visando uma sociedade democrática e uma economia de livre mercado. As restrições legais remanescentes sobre o comércio com Cuba constituem o pouco de influência que os EUA ainda têm para pressionar por mudanças democráticas na ilha quando os irmãos Castro desaparecerem. O Congresso americano deveria ouvir os dissidentes e rejeitar uma nova flexibilização das sanções econômica, a não ser que mudanças democráticas ocorram de fato em Cuba. Os EUA não devem desperdiçar o que lhes resta de influência uma vez que o tempo se prepara para fazer o que o embargo não conseguiu - ocasionar o fim do regime Castro. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ COLUNISTA

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