Acordo nuclear corre perigo

'Linhas vermelhas' anunciadas pelo aiatolá Khamenei podem levar conversações ao fracasso

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Por CAROL e MORELLO
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Poucos dias antes de o secretário de Estado americano, John Kerry, viajar a Viena para participar das conversas sobre o programa nuclear iraniano, o líder supremo do Irã estabeleceu o que considera ser "importantes linhas vermelhas" - e qualquer uma delas pode impedir um acordo final.Em discurso na noite de terça-feira, o aiatolá Ali Khamenei delineou diversas demandas, como a suspensão das sanções econômicas tão logo seja firmado um acordo e antes de o Irã desmantelar parte de sua infraestrutura nuclear. O aiatolá rejeitou um congelamento da pesquisa e desenvolvimento no campo nuclear, inspeções das áreas militares e restrições que durem mais de dez anos.Os EUA lideram o grupo de negociadores que abrange os outros quatro membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU (China, Rússia, França e Grã-Bretanha), mais a Alemanha. Apesar da hostilidade entre os EUA e o Irã, o diálogo direto entre os dois países constitui a parte mais importante das negociações.Mas as limitações estabelecidas por Khamenei podem debilitar a capacidade dos negociadores iranianos de fazer concessões, com a aproximação da data fixada para um acordo final, que vencerá na segunda-feira. Essas limitações também contradizem a posição dos EUA no esboço de acordo de abril e os negociadores americanos disseram que não se afastarão dos seus termos.Khamenei reiterou que todas as sanções bancárias, financeiras e econômicas devem ser suspensas no mesmo dia em que o acordo for assinado. E não apenas as impostas pela ONU, mas também as decididas pelo Congresso americano. De acordo com o governo Obama, as sanções serão eliminadas gradativamente, mas somente depois de os inspetores da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) atestarem que foi cumprida a exigência de o Irã desmontar as centrífugas usadas para enriquecer urânio, reduzir seus estoques do material e transformar suas usinas de enriquecimento em laboratórios. O urânio enriquecido é material que pode ser utilizado como combustível para usinas nucleares e, em concentrações muito mais altas, como material físsil para armas nucleares.O Irã insiste que seu programa nuclear tem apenas fins pacíficos, como produção de energia e isótopos médicos, e o país não tem intenção de construir armas nucleares que, segundo Khamenei, são proibidas pelo Islã. Mas muitos observadores duvidam das alegações iranianas.Khamenei também atacou a AIEA, cujo trabalho deve corroborar qualquer acordo. "Como a AIEA demonstrou diversas vezes que não trabalha de modo independente, nem é imparcial, estamos pessimistas quanto a ela", declarou Khamenei no Twitter. Alguns observadores creem que as palavras do líder iraniano são uma última pressão numa negociação difícil. "É improvável que Khamenei tenha permitido a seus negociadores avançar tanto para no último momento sabotar o acordo", disse Karim Sadjadpour, analista especializado no Irã no instituto Carnegie Endowment for International Peace. "Ele não quer ser responsabilizado se o diálogo fracassar. E parece muito confiante de que o outro lado não quer um 'não' como resposta. É natural tentar extrair mais concessões."As conversas entre Irã e as seis potências mundiais vêm se realizando há mais de uma década, mas aceleraram há um ano e meio, após a eleição do presidente Hassan Rohani, que prometeu libertar o Irã do peso das sanções. As negociações têm por fim aliviar as sanções se o Irã restringir seu programa nuclear. No Irã, a ala radical se opõe a qualquer acordo com os EUA ou que comprometa um programa nuclear símbolo do orgulho nacional. Kerry participará das conversas no fim de semana pela primeira vez desde que quebrou a perna num acidente de bicicleta no dia 31. Mas antes se reunirá com o chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif, em Genebra.Embora os negociadores americanos insistam que o objetivo é firmar um acordo final até segunda-feira, o Irã e vários países europeus que participam das negociações têm insistido numa prorrogação do prazo. Em termos práticos, o governo Obama gostaria de apresentar o acordo final ao Congresso em 10 de julho. Com base em lei sancionada em maio, o Congresso terá 30 dias para examinar o acordo se apresentado em 10 de julho. Após essa data, o tempo para exame pelo Congresso será de 60 dias. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINOÉ JORNALISTA

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