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Análise: Donald Trump quer reduzir debate a duelo entre Ordem versus anarquismo

Para o seu eleitorado, Trump quer vender Biden como o candidato anti-Deus, anti-ordem e anti-prosperidade

Por Hussein Kalout
Atualização:

Depois da convenção do partido Republicano, o presidente Donald Trump inaugurou uma nova fase na disputa com o seu adversário do partido Democrata, Joe Biden. O padrão de enfrentamento trumpista busca reduzir o debate a uma escalada retórica balizada por dois eixos principais: Ordem versus Anarquismo e o “The american way of life” versus Socialismo. 

Para o seu eleitorado, Trump quer vender Biden como o candidato anti-Deus, anti-ordem e anti-prosperidade. Por isso, o presidente americano não mede esforços para enganchar Biden em temas polarizadores que servem de forma mais eficaz aos propósitos de sua própria narrativa. 

Donald Trump em evento de campanha em Oshkosh, Wisconsin Foto: Tom Brenner/Reuters

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Colar a pecha de “anarquistas” nos apoiadores do partido Democrata é um mote forte em estados onde a disputa está praticamente no limiar da margem de erro como, por exemplo, na Carolina do Norte – um estado dividido entre os dois partidos e caracteristicamente de corte conservador. Posar ao lado das forças policiais e colocar no seu adversário, Joe Biden, a pecha de inimigo do aparato securitário, tem surtido efeito para reduzir a diferença entre o inquilino da Casa Branca e o seu desafiante. 

Quanto maior o número de manifestações populares e o confronto entre manifestantes e policiais, mais forte a narrativa de Trump, que busca criminalizar o caráter das manifestações ao negligenciar a sua legitimidade e propagar a ideia de que as tensões sociais que o país hoje vive são parte da estratégia do partido Democrata para instaurar a desordem e o caos – e, consequentemente, controlar a nação. 

Em busca de sua reeleição a qualquer preço, Trump vai explorando ao máximo o temor do americano médio com o aumento real ou potencial da insegurança. Uma vitória democrata, insiste Trump e sua campanha, significaria a revogação de direitos, a subjugação de adversários e a instalação de um Estado que interfere na vida privada. 

O comitê de campanha de Trump procura, ademais, subtrair de Biden a capacidade de tracionar a sua própria narrativa sobre os fracassos do governo incumbente. Para alcançar esse objetivo, Trump não responde a Biden. Pelo contrário, provoca a ele e aos democratas para obriga-los a discutirem somente o que lhe interessa discutir. Manter Biden na defensiva é parte central da estratégia do presidente americano. O que o candidato republicano quer é reduzir o escopo da disputa eleitoral a poucos temas por ele determinados, idealmente relegando Biden ao imobilismo. 

Diferentemente do que Trump vem espalhando em condados de estados chave como Pensilvânia, Michigan e Florida, se existe algo que os EUA não correm perigo algum é o de se tornarem um país socialista. Os cartazes espalhados com o mote “100% Trump e 0% socialismo” mexe, ainda, com parcela nada desprezível do eleitorado indeciso e fundamentalista. Colocar em dúvida o sacrossanto direito à propriedade é outro artifício utilizado pela campanha republicana para disseminar o medo. Trump quer que o eleitor americano acredite que a vitória de Biden transformará o país uma nação socialista, onde os seus bens e propriedade serão confiscados. 

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Para se apossar do pleno domínio da narrativa, a fabricação de “fatos e versões” pelo candidato republicano transformou essa etapa da disputa eleitoral em um vale-tudo – a agressividade de Trump já não rende sequer respeito aos heróis de guerra de seu próprio país por ele tachados, em seu discurso, de “perdedores”. 

No cálculo da campanha republicana, a eleição será definida na Flórida, Pensilvânia e Carolina do Norte. Dos seis estados decisivos na disputa, são esses três que possuem número elevado de delegados no colégio eleitoral e nos quais os republicanos podem virar o jogo, já que a diferença em favor de Biden varia entre 1% e 3% em relação a Trump. Quem vencer dois desses estados, sairá praticamente consagrado do pleito eleitoral. 

Com certo êxito, Trump conseguiu traduzir os dois eixos de narrativa fabricados por sua campanha em vetores de força. Se Biden aceitar que as regras do engajamento eleitoral sejam ditadas pelo seu arquirrival, as suas chances de vitória diminuem consideravelmente.

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