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Análise: É preciso lidar com o imprevisível para negociar com a Coreia do Norte

Regra básica para negociar com países como a Coreia do Norte é saber que não há regras.

Por Paul Reynolds
Atualização:

Então houve mais um retrocesso nas relações da comunidade internacional com a Coreia do Norte. Furioso com as críticas feitas pelo Conselho de Segurança da ONU e com a ameaça de mais sanções por causa do lançamento de um foguete no início do mês, o governo de Pyongyang retaliou. Nesta terça-feira, a Coreia do Norte anunciou sua retirada das negociações de seis partes (que também incluem EUA, China, Rússia, Japão e Coreia do Sul) e afirmou que irá restaurar o reator nuclear da usina de Yongbyon, que estava parcialmente desativado. A questão agora é saber se os norte-coreanos irão realmente iniciar o trabalho de desenvolvimento de novas armas nucleares ou se eles ainda podem ser convencidos a voltar atrás para renovar e completar o compromisso feito em 2007 de desmantelar suas instalações atômicas. O caso da Coreia do Norte é um exemplo clássico dos dilemas que envolvem as negociações com países cujo comportamento é previsivelmente imprevisível. Poder militar A regra básica para negociar com países como a Coreia do Norte é saber que não há regras. Mas, a mais importante consideração a ser feita é saber o quão poderosos estes países são. Em 2002, por exemplo, a Líbia pode ser pressionada a admitir e posteriormente desistir de um programa nuclear secreto porque estava fraca e exposta. Já a Coreia do Norte, no entanto, tem um Exército de cerca de 1 milhão de homens, mais de 4 mil tanques e cerca de 18 mil peças de artilharia, de acordo com o centro de pesquisas britânico International Institute for Strategic Studies. Além disso, suas forças estão posicionadas a uma pequena distância de Seul, a capital da Coreia do Sul, o que torna uma invasão ao estilo do que foi feito no Iraque impossível. Assim, as opções em relação à Coreia do Norte são limitadas. Guerra e diplomacia Quase tudo já foi tentado com a Coreia do Norte. Primeiro, foi usada a força militar. Em 1950, depois que o país - sob a liderança de Kim Il-sung, pai de Kim Jong-il - lançou uma invasão contra a Coreia do Sul, o Conselho de Segurança da ONU - sem a presença da União Soviética, que estava boicotando o órgão - autorizou uma resposta militar. A guerra continuou até julho de 1953, deixando, no entanto, a situação do mesmo jeito que estava anteriormente, com as duas Coreias divididas. Depois de tentar a guerra, a comunidade internacional optou por tentar isolar o país. Mas a Coreia do Norte sobreviveu, graças à proteção da União Soviética e da China, cujas forças evitaram que o país fosse derrotado no conflito. Negociações A questão norte-coreana voltou à tona em 1994, quando a comunidade internacional começou a usar a diplomacia para tentar resolver os conflitos com o país. É o que vem sendo tentado desde então. A crise foi iniciada pelo carregamento do reator de Yongbyon com hastes de combustível que poderiam ser usadas para plutônio, o que tornaria possível a construção de armas nucleares. Informações dão conta de que, na época, militares dos Estados Unidos acreditavam que o país poderia estar à beira de um conflito com a Coreia do Norte. Mas isto aconteceu durante o mandato de Bill Clinton, que não era inclinado a empreender ações militares, a não ser que fosse muito pressionado. Clinton então considerou duas ações diplomáticas em relação à Coreia do Norte: tentar aumentar o isolamento do país e as sanções, ou tentar negociar. Ele acabou optando por priorizar as negociações. Outro ex-presidente dos Estados Unidos, Jimmy Carter, também acreditava no poder das negociações. Foi a ele que Clinton recorreu para tentar solucionar a questão. Carter foi então à Coreia do Norte e, depois de certo tempo, conseguiu-se chegar a um acordo pelo qual Pyongyang se comprometia a interromper seu programa nuclear em troca de suprimentos de combustível. Mas o acordo acabou fracassando depois de um atraso no envio de combustível, reforçando a percepção de que a Coreia do Norte sempre pode voltar atrás em acordos por falhas verdadeiras ou falsas da outra parte. Abordagem de Bush A diplomacia para a Coreia do Norte foi endurecendo e, quando George W. Bush chegou ao poder, foi praticamente abandonada, a partir do momento em que os EUA incluíram o país no chamado "Eixo do Mal". As sanções foram as armas usadas pela equipe de Bush contra a Coreia do Norte. Mas, mesmo elas acabaram falhando. Em 2006, a Coreia do Norte anunciou ter testado uma arma nuclear e continuou com os trabalhos para desenvolver um míssil balístico, apesar das resoluções do Conselho de Segurança da ONU que a proibiam de fazê-lo. Assim, no final do governo Bush, as negociações foram retomadas, com a ajuda de uma amiga próxima da Coreia do Norte, a China. Em 2007, a Coreia do Norte se comprometeu mais uma vez a interromper seu programa nuclear, o que fez com que o governo Bush a retirasse da lista de países que apoiam o "terrorismo". A vez de Obama Com os últimos acontecimentos, no entanto, as negociações mais uma vez fracassaram. Mas isto não significa que elas não possam ser retomadas. Um dos padrões de comportamento do governo de Pyongyang é que, depois de marcar posição, ele costuma voltar atrás. A esperança de longo prazo em situações deste tipo é que o próprio regime acabe por ruir. Esta foi a solução da Guerra Fria. O perigo em relação à Coreia do Norte é que, dada a natureza militarista do regime, seu colapso, ou o medo dele, pode levar a uma guerra. Então, um outro desafio neste caso é como balancear a pressão de modo que ela não leve a uma calamidade. Enfim, não há respostas fáceis para a questão. Agora é a vez de Barack Obama tentar. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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