Análise: Ideias de atirador norueguês devem ganhar divulgação?

Analistas debatem se o espaço dado ao manifesto do extremista na internet é benéfico ou prejudicial

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Por Alex Hudson
Atualização:

A divulgação de trechos do manifesto de 1.518 páginas do assassino confesso norueguês, Anders Behring Breivik, despertou polêmica. Será que as palavras e as ideias do atirador devem ser divulgadas, ou isso significa dar uma plataforma para visões extremistas?

 

 

 

A Justiça norueguesa realizou a audiência de Breivik a portas fechadas, para evitar que ele a usasse para enviar mensagens a cúmplices. Para alguns, a medida evita que o atirador usasse a oportunidade para propagar suas opiniões para uma audiência mais ampla.

Desde já, os ideais de Breivik, expressos no documento de 1.518 páginas, foi alvo de enorme escrutínio, o que jamais teria ocorrido se não fosse a tragédia da última sexta-feira. Sempre há um apetite público para tentativas de explicar as ações de assassinos de massas. Após tragédias como a norueguesa, o "por quê?" muitas vezes se torna tão importante quanto o "quê?". E esta não é a primeira vez que uma ideologia política ganhou notoriedade após uma tragédia de grandes proporções. Em 1995, um manifesto de 35 mil palavras, escrito por Ted Kaczynski, conhecido como Unabomber, foi publicado no New York Times e no Washington Post. Era uma exigência do autor de 16 atentados em quase 20 anos (que mataram três pessoas e feriram 23) para cessar suas atividades. Kaczynski foi preso a partir do depoimento de seu irmão, prestado após este ter lido o manifesto nos jornais. Mas, para alguns, atender às exigências do Unabomber aumentou a probabilidade que outros promovessem ataques semelhantes. "Foi um erro publicar o documento", opina James Fox, professor da Universidade Northeastern (EUA) e autor de estudos sobre o Unabomber. "Mesmo que o manifesto não tivesse sido publicado, o crime ainda teria sido solucionado." 'Oxigênio de publicidade' Em outros casos relacionados à divulgação das plataformas de assassinos, o motivo alegado não é a busca pelo culpado. Após os ataques na Universidade Virginia Tech, nos EUA, em 2007, quando 32 pessoas foram mortas por Seung-Hui Cho (que em seguida se matou), a rede de TV NBC recebeu uma gravação com um longo pronunciamento do atirador. A decisão de divulgar o material levou familiares das vítimas a boicotar a emissora, criticando-a por dar o "oxigênio de publicidade" que o atirador desejava. Outras emissoras também mostraram trechos do vídeo, incluindo a BBC. "Você pode alegar que (a divulgação) é pelo bem do público, mas ela coloca o assassino sob os holofotes", afirma James Fox. "Para alguns, ele vai se tornar um herói. Está certo jogar luz sobre um crime, mas é algo totalmente diferente lançar os holofotes (sobre o atirador)", ele opina. Em contrapartida, comentaristas defenderam a NBC e outras emissoras, alegando que o vídeo oferecia pistas sobre as motivações de Cho. "A acusação de que a transmissão pode provocar ataques cópias parece se basear na noção de que distúrbios mentais severos são contagiosos", escreveu Bronwen Maddox, do jornal The Times. Ao mesmo tempo, para extremistas, atos drásticos são muitas vezes vistos como a única forma de se fazer ouvir. "As pessoas sabem agora que, se fizerem uma grande matança, receberão atenção", diz o filósofo Julian Baggini. Algumas pessoas e meios de comunicação já traçaram paralelos entre o manifesto do Unabomber e o de Breivik. Muitos também creem que documentos e audiências do atirador são temas de interesse público. "Acho que (fechar a audiência de Breivik) é algo ruim", opina Gro Holm, diretor de notícias da rede pública norueguesa NRK. "Uma das coisas que o premiê (norueguês) disse é que seríamos uma sociedade mais aberta. Na imprensa, somos em geral a favor de audiências abertas. É algo importante à sociedade norueuguesa." Sem alternativa Defensores da liberdade de expressão dizem que abrir argumentos de extremistas ao escrutínio público é a melhor maneira de desacreditá-los, diante de nenhuma outra opção viável. "Não sei qual é a alternativa (a apresentar tais argumentos ao público)", afirma Jonathan Heawood, diretor da English PEN, organização que apoia a liberdade de expressão a escritores. "Se você diz que precisamos impedir a circulação desse manifesto (de Breivik), então precisamos de uma lei que torne a circulação um crime. Não creio que seja uma lei que desejemos", prosseguiu ele. "Há mais riscos em limitar a expressão do que em abri-la. Quanto mais se lança luz sobre essas crenças (extremistas), mais se dá a chance para que elas sejam destruídas em debates públicos." BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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