Análise: Massacre expõe profundas divisões internas no país

O alvo do atirador de Istambul era um símbolo de uma cidade cosmopolita cada vez mais sob ameaça: uma boate muito animada onde pessoas de todo o mundo podiam festejar juntas, livres do caos e da violência que se abate sobre a região

PUBLICIDADE

Por Tim Arango/NYT
Atualização:

O alvo do atirador de Istambul era um símbolo de uma cidade cosmopolita cada vez mais sob ameaça: uma boate muito animada onde pessoas de todo o mundo podiam festejar juntas, livres do caos e da violência que se abate sobre a região.

Policiais turcos mantém vigilância no perímetro do clube Reina, onde atirador matou 39 pessoas na noite de ano-novo Foto: AP Photo/Halit Onur Sandal

PUBLICIDADE

Foi ali, na boate Reina, no Estreito de Bósforo, local frequentado por artistas de novelas, atletas profissionais, turistas turcos e ricaços, que aquelas pessoas que esperavam dizer adeus a um ano particularmente atribulado morreram juntas.

Foi o segundo ataque em duas semanas na Turquia, expondo as divisões num país cada vez mais despedaçado em meio a taques terroristas e instabilidade política.

Com o atirador em fuga na noite de domingo e uma caçada por todo o país à sua procura, esses assassinatos sublinham brutalmente um dilema enfrentado pelo autoritário presidente Recep Tayyip Erdogan: embora tenha adotado duras medidas de repressão contra oponentes e implementado medidas de segurança para dar estabilidade ao país, os ataques aumentaram.

A Turquia já vinha cambaleando há vários anos, arrastada cada vez mais para a guerra civil na Síria. Ao abrir suas fronteiras para combatentes estrangeiros que tentam chegar à Síria, o país inadvertidamente contribuiu para o avanço do Estado Islâmico, que agora perpetra ataques dentro da Turquia. Em 2015, a guerra com militantes curdos foi retomada e, no ano passado, a Turquia sofreu uma tentativa de golpe de Estado contra o presidente Erdogan.

O ataque ocorrido na madrugada de domingo – um golpe contra o Ocidente, a face urbana de Istambul –, provavelmente, vai restringir ainda mais a democracia no país. O presidente Erdogan ficará mais livre para intensificar a repressão contra seus oponentes, o que acelerou após a tentativa de golpe. E, provavelmente, vai corroer a economia do país, que já sofre em razão do declínio do turismo e dos investimentos estrangeiros.

“Nada que o governo tem feito está tornando a Turquia mais segura”, disse Asli Aydintasbas, conhecido escritor e membro do European Council on Foreign Relations. “A repressão contra dissidentes domésticos desestabilizou ainda mais o país e existe uma polarização cada vez mais perigosa aqui.”

Publicidade

Como ocorreu depois de outros atentados, o governo turco impôs novo blecaute de notícias e os meios de comunicação só podem reportar comunicados oficiais. Mesmo antes das revoluções da Primavera Árabe, a Turquia tentava se colocar à parte e manter uma política externa “sem problemas com os vizinhos”.

Agora, tudo mudou. A Turquia foi tragada pelas forças sombrias e desestabilizadoras no Oriente Médio, onde tudo parece convergir: terrorismo, crise migratória, aumento do autoritarismo.

A retomada de uma longa guerra entre o governo turco e militantes curdos deixou cidades no sudeste do país, dominadas por populações curdas, em destroços e trouxe o terror para os centros urbanos da Turquia. A explosão de uma bomba em um estádio de futebol em Istambul, em dezembro, matou dezenas de pessoas e foi o mais recente ataque reivindicado por um grupo terrorista curdo. Menos de duas semanas antes do atentado de domingo, um policial, que não estava em serviço, assassinou o embaixador russo na Turquia, em mais um sinal de instabilidade. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

*É JORNALISTA 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.