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Análise: processos de Trump nas eleições não têm fundamento legal

Mesmo as ações que podem ser aceitas e tenham uma decisão favorável ao presidente americano são fracas e podem não ser suficientes para lhe dar a vitória

Por Noah Feldman
Atualização:

Em termos legais, as várias ações movidas pelo presidente Donald Trump no âmbito das eleições carecem de fundamento. Na quarta-feira, a campanha de Trump anunciou uma série de diferentes iniciativas legais em oposição à vitória aparentemente próxima de Joe Biden no Colégio Eleitoral.

Donald Trump questionou processo de contagem dos votos em pronunciamento na Casa Branca Foto: Brendan Smialowski / AFP

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Sua estratégia incluiu tentativas de suspender a apuração dos votos em Michigan e Pensilvânia, e uma moção à Suprema Corte no caso relativo aos votos que chegaram na Pensilvânia depois das 20 horas do dia das eleições.  A campanha também entrou com uma ação na Geórgia afirmando que um funcionário encarregado da apuração misturou indevidamente os votos dos ausentes, e pediu para que os votos que chegassem atrasados fossem separados. Não é este o tipo de ação capaz de mudar uma eleição. (Os advogados de Trump também afirmaram que tentariam conseguir uma recontagem em Wisconsin, mas é extremamente improvável que isto elimine a margem de 20 mil votos de Biden naquele Estado.) Comecemos com as tentativas de parar a apuração. Estas medidas carecem de fundamento do ponto de vista legal. A ação movida por Trump em Michigan pede a interrupção da apuração dos votos, alegando que os encarregados de contar o voto dos ausentes continuam trabalhando sem a presença de inspetores eleitorais e “contestadores” de votos de cada partido, conforme exige a lei daquele estado. O problema deste argumento é que, até onde é possível determinar, Michigan na realidade admite inspetores e fiscais democrata e republicanos.

A campanha de Trump afirma ainda que o Estado violou a lei porque não mostra aos fiscais de Trump o vídeo das urnas das quais são retiradas as cédulas dos ausentes. Por mais estranho que possa parecer, a campanha de Trump está afirmando que a contagem dos votos deveria parar porque os seus representantes não puderam assistir ao vídeo das urnas.

Segundo a lei de Michigan, as “caixas contendo os votos” deveriam ser vigiadas por vídeo. Mas aparentemente não existe a exigência legal de que as campanhas vejam o vídeo das urnas. Em todo caso, não faria sentido nenhum os tribunais ordenarem a suspensão da apuração para remediar a suposta falha pela não exibição do vídeo. A coisa lógica seria o tribunal exigir que o estado fornecesse o vídeo.

É difícil fugir da conclusão de que a campanha de Trump tentou desesperadamente impedir que Michigan concluísse a sua apuração. Trump estava atrás na contagem de Michigan, então o plano não podia ser reivindicar a vitória com base nos votos já contados. Devia ser então para fugir da possível conclusão de que Biden ganhou a eleição.

Grupo pró-Trump em ato em Harrisburg, na Pensilvânia, em defesa do presidente e contra o suposto 'roubo' na contagem de votos no Estado na quinta-feira, 5. Foto: Spencer Platt/Getty Images/AFP

Na Pensilvânia, a campanha de Trump entraria (ou disse que entraria) com várias ações. Uma delas foi movida na noite de segunda-feira contestando as instruções da Secretaria de Estado que permitem que os eleitores que cometeram algum erro em seus votos pelo correio possam corrigi-los. Esta ação talvez tenha mais chance de ser bem-sucedida, considerando que as instruções chegaram no último minuto. Outra é uma tentativa de parar a apuração, usando aparentemente uma teoria semelhante àquela que a campanha tentou em Michigan. 

Suprema Corte

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Em seguida vem a moção à Suprema Corte. Se lhe for permitido intervir, Trump pedirá que os juízes excluam os votos enviados pelo correio que chegam depois do fechamento das sessões. A Suprema Corte provavelmente permitirá que Trump intervenha, considerando que esta ação é anterior à eleição, mas isto não garante que eles darão uma sentença favorável a Trump. Sabemos que há quatro votos – os três liberais mais o do presidente da Corte, John Roberts – para rejeitar a afirmação de Trump. Três juízes conservadores mais ou menos abriram este processo e é previsível que apoiem a solicitação de Trump. Isto deixa indecisos dois conservadores dos Estados-chave, os juízes Amy Coney Barrett e Brett Kavanaugh.

É concebível, embora ultrajante, que a maioria conservadora possa jogar fora estes votos, apesar de terem sido enviados por pessoas que tinham a garantia dos tribunais de que os seus votos seriam computados. Mas ainda que seja uma péssima decisão, talvez não garanta a vitória de Trump. Mesmo que os juízes atendam Trump, isto não será importante, a não ser que a eleição se reduza à Pensilvânia, e a não ser que estes votos retardatários proporcionem a margem de vitória necessária para ganhar a presidência. Este pesadelo seria a repetição do que aconteceu com Bush e Gore, e ainda não é de se excluir. Mas a hipótese está se tornando menos provável no momento. Em suma, a estratégia legal de Trump parece fraca. Está ficando mais difícil imaginar como ele poderia usar os tribunais para deter ou reverter a contagem dos votos. Evidentemente, nada impedirá Trump de afirmar que a eleição foi roubada somente porque ele perde nos tribunais – e perde no voto popular e no Colégio Eleitoral. Talvez as ações constituam principalmente esforços preliminares do que poderá ser uma estratégia para tirar a legitimidade do resultado. Dentro em breve saberemos.*Esta coluna não reflete necessariamente a opinião do conselho editorial ou da Bloomberg LP e dos seus proprietários. Feldman é colunista da editoria de Opinião da Bloomberg e professor de direito da Universidade Harvard.

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