Análise: Vazamento de livro reduz opções para defesa de presidente

Fazendo jus ao cliente, a abordagem que a equipe de advogados de Donald Trump adotou para defendê-lo do impeachment no julgamento no Senado concentra-se em bravatas, indiferença e negação

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Por Philip Bump e W. Post
Atualização:

WASHINGTON - Fazendo jus ao cliente, a abordagem que a equipe de advogados do presidente Donald Trump adotou para defendê-lo do impeachment no julgamento no Senado concentra-se em bravatas, indiferença e negação. “Uma vez descartadas as interferências indevidas, os palpites, os vazamentos seletivos e os interrogatórios sigilosos de testemunhas escolhidas a dedo, o que sobra são fatos-chave que não mudaram nem vão mudar”, disse no sábado o advogado Michael Purpura, da equipe de defesa. 

Entre esses fatos, está a argumentação do conselheiro da Casa Branca Pat Cipollone de que a transcrição da conversa telefônica de 25 de julho entre Trump e o presidente da Ucrânia, Volodmir Zelenski, “mostra que o presidente não impôs condições para a concessão de ajuda militar ou para um encontro com Zelenski”. Não na ligação, explicitamente. Mas a equipe de Trump entrou em contato com um assessor de Zelenski antes do telefonema, dizendo que uma reunião na Casa Branca dependia de uma das investigações políticas que Trump desejava.

O advogado Mike Purpura integra a defesa de Trump Foto: Senate Television via AP

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Outro fato alegado por Purpura é que “nem uma única testemunha afirmou que o presidente disse haver relação entre investigação, concessão de ajuda militar e um encontro com ele”. As palavras mais importantes nessa frase são “testemunha” e “afirmou”. Ao incluí-las, a equipe de Trump restringiu o alcance do que está em pauta, usando a mesma artimanha adotada ao ignorar na avaliação da transcrição um contraponto óbvio.

Em 17 de outubro, o chefe interino de gabinete da Casa Branca, Mick Mulvaney, convocou uma entrevista coletiva na qual fez o que nenhuma testemunha fizera sob juramento: conectou as investigações a um ato oficial da Casa Branca. No telefonema de julho, Trump pediu uma investigação sobre uma teoria da conspiração centrada na interferência russa na eleição de 2016 e no hackeamento do Comitê Democrata Nacional (CDN).

Mulvaney defendeu o pedido usando os mesmos argumentos que Trump usara quando surgiu o escândalo envolvendo a Ucrânia: estava preocupado com corrupção e com outros países também estarem prometendo dinheiro à Ucrânia. 

No domingo à noite, The New York Times informou que Trump disse ao então conselheiro de Segurança Nacional, John Bolton, que pretendia reter a ajuda até Zelenski concordar em fazer as investigações, segundo um livro que será publicado por Bolton.

Bolton foi convocado pela Câmara a testemunhar em novembro, mas se recusou, preferindo esperar para ver se os tribunais decidiriam em favor da Câmara em outros casos em que intimações foram questionadas.

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O surgimento de uma segunda potencial testemunha dizendo precisamente o que a equipe de Trump afirma não existir cria um grande problema para os republicanos no Senado. Purpura tenta claramente excluir Mulvaney, mas eis que se cria um novo contraponto: como argumentar contra Mulvaney e Bolton serem chamados como testemunhas? 

Os advogados de Trump e os republicanos do Senado inclinados a apoiar o presidente estão num beco sem saída. Ou eles ignoram a reportagem do Times, e deixam sobre a mesa evidências obviamente condenatórias, ou abrem as comportas para novos testemunhos e evidências.

Os advogados podem, é claro, fazer à moda de Trump: usar as más notícias para um ataque total à oposição – tática que já funcionou outras vezes. O vazamento dos detalhes do livro de Bolton deu à equipe jurídica de Trump todas as 20 horas para descobrir qual caminho eles escolheriam. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ

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