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Após ascensão populista na Europa, Bannon elege China como maior rival

Ao ‘Estado’, ex-estrategista de Trump fala sobre planos de montar uma escola para líderes conservadores na Europa e da importância de Bolsonaro para o movimento nacionalista

Foto do author Beatriz Bulla
Por Beatriz Bulla ,  CORRESPONDENTE e WASHINGTON 
Atualização:

O livro em cima da mesa de jantar de Steve Bannon dá uma pista. Guerra Irrestrita sugere que países tecnologicamente mais preparados podem perder confrontos militares para nações que manejarem melhor política internacional, guerra econômica e redes digitais. As 212 páginas foram a leitura de fevereiro do ex-estrategista de Donald Trump, que na época preparava as malas para uma de suas viagens à Europa. 

Bannon, ex-estrategista da Casa Branca, durante conferência de ativistas conservadores em Roma: espalhando ideias nacionalistas Foto: Washington Post / Jabin Botsford

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Desde que foi mandado embora da Casa Branca, em 2017, Bannon trabalha como agitador de uma onda nacionalista de direita fora dos EUA, fomentando o que outros conservadores chamam de guerra cultural nos campos ideológico e político. 

O primeiro passo foi a Europa, onde criou o que chama de “Movimento” e posou ao lado de Marine Le Pen, na França, e Matteo Salvini, na Itália – ambos já acusados de xenofobia. Agora, passada a eleição europeia, Bannon elege um novo foco: a China, considerada a “maior ameaça econômica e de segurança nacional que os EUA já enfrentaram”. 

Bannon esteve por trás da eleição de Trump e do site Breibart, de plataforma de extrema direta, anti-imigração e de supremacia branca. Também foi conselheiro da Cambridge Analytica, consultoria acusada de fornecer dados de milhões de usuários do Facebook para prejudicar Hillary Clinton em 2016. 

Escanteado por Trump, Bannon montou base nos últimos meses em suítes de hotéis de luxo na Europa para acompanhar as eleições do Parlamento Europeu e pretende lançar em breve na Itália uma escola para fomentar jovens lideranças que espalhem mundialmente valores “ocidentais judaico-cristãos”, de nacionalismo de direita. 

A real influência do americano fora dos EUA é questionada pela imprensa internacional, que aponta que parte da extrema direita eurocética rejeitou aparecer ao lado dele nos últimos meses. “Sou um colega e amigo de muitos líderes de diferentes partidos, mas não sou um conselheiro formal”, diz o americano, em entrevista ao Estado.

A intenção de Bannon é criar uma onda fisiológica e ideológica, mais do que partidária. E, para isso, vê espaço na Europa, apesar de haver diferentes nuances na direita de cada país europeu. O discurso de Bannon para limitar a entrada de imigrantes encontra eco na extrema direita europeia que tenta acabar com o “governo central de Bruxelas”. A ideia da União Europeia como foi formada contraria um dos pilares do “Movimento”, um populismo nacionalista e descentralizador. 

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“Superou minhas expectativas”, disse Bannon sobre a nova composição do Parlamento Europeu, pontuando três vitórias. Para ele, o presidente francês, Emanuel Macron, fez da eleição um “referendo” sobre políticas de imigração e foi “derrotado”. “Além disso, você vê as possibilidades de um supergrupo de Itália, França, Reino Unido, Polônia, todos os populistas, unidos, pessoas com as mesmas ideias, os mesmos conceitos que Jair Bolsonaro”, disse Bannon. “O terceiro ponto é que eleições que sempre foram um show lateral realmente mudaram a política nacional”, afirma.

O avanço dos verdes na eleição europeia é observada por ele de perto. “Vimos nos EUA, em 2018, com a (deputada) Alexandria Ocasio-Cortez”, disse, destacando que é um grupo jovem, energizado e com capacidade de mobilização à esquerda. Bannon não acredita que seja um sinal de limite do populismo de direita, que estaria apenas começando. 

A escola que ele tenta criar já tem sede: um mosteiro do século 13 no topo das montanhas de uma comuna italiana. A “Academia Ocidental Judaico-Cristã” quer atrair financiamento de doadores privados para formar jovens “gladiadores”, como define o americano.

A pauta é religiosa filosófica, voltada ao conservadorismo populista. O parceiro de Bannon é Benjamin Harnwell, um católico que fundou um grupo de lobby religioso. A ideia é começar com cursos curtos de verão, como piloto, para depois lançar programas de especialização. “Estamos fazendo entrevistas com o possível corpo docente”, disse Bannon.

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O jornal Financial Times revelou que moradores da região têm protestado contra a instalação da escola e entendem que é preciso levantar uma bandeira antifascista contra radicais. Um dos professores convidados será o escritor brasileiro Olavo de Carvalho, que Bannon conheceu em janeiro e reencontrou em março, com a ida de Bolsonaro a Washington. 

Guerra Irrestrita, livro que ele carregava nos braços, foi escrito em 1999 por dois ex-militares do Exército de Libertação Popular chinês. Nos EUA, a tradução inclui o subtítulo: “O plano da China para destruir a América”. O Brasil, para Bannon, “está no centro dessa guerra econômica”. “Eles (chineses) adorariam comprar o Brasil. Isso não é o povo chinês, eles são trabalhadores, isso são os líderes, os radicais que controlam a China.” 

O americano passa o dia em reuniões, palestras e jantares com integrantes ou interessados no populismo de direita. As telas dos seus celulares (no plural), escondidas embaixo de um guardanapo em cima da mesa, não param de piscar. Quando está em Washington, os primeiros compromissos na “embaixada Breibart”, como chama a casa onde vive, começam antes das 7 horas – e os últimos convidados chegam por volta das 21 horas. 

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