24 de novembro de 2012 | 22h45
A decisão do presidente egípcio Muhammad Mursi de assumir novos poderes é uma grande aposta política que tem dividido o Egito.
A medida foi anunciada no dia seguinte ao início do cessar-fogo em Gaza, cuja negociação foi intermediada pelo líder egípcio.
Incentivado pelo prestígio internacional lucrado com o acordo, o presidente Mursi tentou consolidar seu poder em casa.
Mas, ele pode ser acusado de excesso de confiança, ou ingenuidade política.
O presidente disse estar agindo para proteger a revolução.
Especificamente, ele desejava evitar que a Justiça dissolvesse, pela segunda vez, a Assembleia Constituinte que prepara a nova Constituição do país.
Houve relatos de que os tribunais estavam, de fato, prestes a fazer isso.
A dissolução poderia atrapalhar seriamente o processo de transição democrática, atrasando ainda mais as novas eleições parlamentares - o que pode impedir os líderes polítcos egípcios de tomar decisões difíceis enquanto aguardam a formação do Parlamento.
Fúria
Muitos dos atuais juízes foram nomeados durante o governo do ex-presidente Hosni Mubarak. As indicações não eram feitas diretamente pelo Executivo, mas muitos egípcios suspeitam que eles ainda sejam leais ao antigo regime.
O mesmo raciocínio se aplica ao procurador geral - que Mursi acaba de destituir.
Seu substituto agiu rapidamente para reabrir as investigações criminais sobre o ex-mandatário, seus familiares e funcionários do antigo regime.
Uma série de julgamentos sobre corrupção, e a respeito de assassinatos cometidos durante a revolução, resultou até agora apenas em resultados dúbios. Isso levantou questionamentos sobre a lealdade do procurador-geral, embora o próprio Mubarak esteja cumprindo uma longa pena de prisão.
Divisões amargas
O presidente Mursi terá o apoio de muitos egípcios nesses dois pontos. Mas é a forma como as ações foram tomadas que está despertando tanta fúria.
Mursi falhou em consultar outras forças políticas, agindo de uma forma autocrática que lembra o governo de seu antecessor.
Na verdade, ele se deu mais poder do que Mubarak jamais teve - sem quase nenhuma restrição.
Sua tentativa de marginalizar o Judiciário faz lembrar o início da chegada ao poder do movimento dos Oficiais Livres, que derrubou a monarquia na década de 1950. O episódio foi o início do período que atualmente começa a ser descrito como as seis décadas de ditadura militar no Egito.
Como resultado, muitos egípcios começam a acreditar que a agenda real do governo não é proteger a revolução, mas aumentar o poder do presidente Mursi e da Irmandade Muçulmana, o movimento islâmico que o lançou.
Também estão sendo feitas acusações de que o objetivo subjacente de Mursi é permitir que a Assembleia Constituinte - atualmente dominada por políticos islâmicos - escreva uma Constituição de orientação islâmica para o país.
É por isso que as ações do presidente Mursi produziram tão amargas, e potencialmente perigosas, divisões no Egito.
As ações do governo e os protestos de segmentos da população podem transformar a questão em uma batalha, que terá muçulmanos de um lado e liberais, defensores do secularismo e cristãos do outro. Há portanto temores de que o processo se transforme em uma luta sectária.
Tais temores podem ser exagerados. Mas não há dúvidas de que esse é um momento importante para o Egito.
Todas essas questões são uma luta titânica para determinar a direção que seguirá no futuro um país que frequentemente traça o caminho do Oriente Médio. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.
Encontrou algum erro? Entre em contato
Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.