Argentinos acusam Ministério Público e Justiça de omissão

Manifestantes acusam a procuradora Gils Carbó de não levar adiante a investigação sobre o caso Lava Jato para proteger Cristina Kirchner

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Por Márcio Resende e Buenos Aires
Atualização:

Cerca de 5 mil pessoas, na sua grande maioria acima de 50 anos de idade, enfrentaram o frio de 10° C e o feriado do Dia da Bandeira para pressionar juízes e promotores a avançar contra a corrupção. Sob o lema "prisão para os corruptos" e "juízes e promotores, cúmplices da corrupção", a manifestação concentrou-se em frente aos tribunais penais de Buenos Aires. As sentenças da Lava Jato contra empresários e políticos no Brasil foram a grande referência para os manifestantes.

"Estou exigindo justiça neste país onde não existe justiça. Quem dera tivéssemos a justiça que vocês têm no Brasil", diz à reportagem do Estado Agustina Méndez, 52 anos, enquanto sustenta a faixa "Basta de juízes cúmplices". "Decidimos sair às ruas porque não conseguimos nada. Vocês no Brasil saíram e conseguiram", compara.

Manifestantes pedem um "juiz Moro" na Argentina para lidar com casos de corrupção Foto: Márcio Resende

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"É preciso mudar os juízes e a procuradora Gils Carbó. Se estamos assim, em grande parte, é por culpa dela", sentencia.

Várias faixas pedem "Destituição já para Gils Carbó". A procuradora-geral argentina, Alejandra Gils Carbó, indicada pela ex-presidente Cristina Kirchner, é acusada tanto pelos manifestantes quanto pelo governo de não dar andamento à investigação para proteger a ex-presidente. Gils Carbó também está sob suspeita de corrupção.

"Aqueles que deveriam investigar são cúmplices da corrupção. Com Gils Carbó é impossível porque ela é uma procuradora militante kirchnerista. É impossível ter uma justiça militante. Enquanto ela não sair, não vamos avançar", concorda Osvaldo Castaño, de 57 anos. Ao seu lado, a mulher Marcela Nigro, de 55 anos, sustenta o cartaz: "Vem Moro".

"Eu quis escrever Janot (por Rodrigo Janot) também, mas resumi para ficar mais claro", conta Marcela. "É indispensável termos justiça para termos instituições. A partir do momento que tivermos justiça, vamos gerar uma catarata de exemplos que vão tornar a sociedade viável", acredita. "Queremos aprender com o Brasil. Se o Brasil, conseguiu, devemos fazer o que o Brasil fez", afirma.

Nas grades dos tribunais, várias faixas aludiam ao exemplo brasileiro. "Senhores juízes, façam um curso no Brasil" ou "No Brasil, são presos; aqui, candidatos" diziam. Outros apontavam contra a ex-presidente: "Prisão para CFK", em referência a Cristina Fernández de Kirchner.

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Mas, enquanto manifestantes protestavam contra juízes e a procuradora-geral, Cristina Kirchner discursava no município de Avellaneda, na Grande Buenos Aires. Era a prévia da sua candidatura ao Senado nas eleições legislativas de outubro numa estratégia para manter vivo o kirchnerismo, mas também para ganhar imunidade parlamentar em razão de uma série de processos por corrupção.

A Odebrecht aceita confessar os seus crimes na Argentina, mas faz duas exigências para um acordo: poder continuar atuando no país e imunidade para seus executivos.

O acordo, no entanto, esbarra na legislação argentina. Não há no país uma Lei de Responsabilidade Penal para Pessoas Jurídicas que permita replicar aqui o acordo de delação premiada com a empresa no Brasil. E a atual lei de delação para as pessoas físicas, aprovada no ano passado, não contempla o perdão total da pena; apenas uma redução.

As investigações locais não avançaram e a Argentina é um dos poucos países que ainda não chegou a um acordo com a Odebrecht. Sem um acordo prévio, o Ministério Público brasileiro não vai enviar à Argentina as delações da companhia no Brasil.

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O governo de Mauricio Macri quer os nomes e acusa a procuradora Gils Carbó de proteger os envolvidos. O presidente Macri tem certeza de que todos os envolvidos rodearão o ex-ministro do Planejamento, Julio de Vido, braço direito da ex-presidente. A Odebrecht confessou ter pago US$ 35 milhões na Argentina entre 2007 e 2014. A cifra real, no entanto, pode ser cinco vezes mais alta, segundo cálculos extra-oficiais.

Os procuradores-gerais do Brasil, Rodrigo Janot, e de Argentina, Alejandra Gils Carbó, assinaram, na sexta-feira em Buenos Aires, um acordo de cooperação específico para o caso Odebrecht com a criação de uma equipe conjunta para investigar e para cruzar os crimes da construtora nos dois países. As atividades da equipe bilateral de promotores vão incluir novos elementos por fora das delações premiadas da Odebrecht no Brasil.

A Lava Jato e o caso Odebrecht prometem ter desdobramentos políticos à medida que surgirem dados que envolvam os candidatos em plena campanha eleitoral.

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