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ARTIGO: Com desistência de Paul Ryan, era Reagan chega ao fim

Paul Ryan viu sua aprovação cair quando deixou os republicanos à vontade para se afastar de Trump

Por FAREED ZAKARIA
Atualização:

A decisão de Paul Ryan de se aposentar do Congresso está sendo interpretada por muitos republicanos como um sinal de que muitos deles vão se sair mal nas eleições de meio de mandato. Isso pode ser verdade, mas a saída de Ryan também simboliza a ampla mudança dentro do partido. Ela marca o fim da revolução de Reagan.

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O presidente da Câmara dos EUA, Paul Ryan, disse que se aposentará ao final de seu mandato, em janeiro, para se dedicar à família Foto: Tom Brenner/ The New York Times

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O Partido Republicano dos anos 1950 e 1960 era o partido das empresas americanas, atraindo amplo apoio de profissionais de colarinho branco e empresários que frequentavam clubes de campo. Tinha uma orientação direta vinda da Câmara de Comércio, defendendo baixos impostos, pouca regulamentação e responsabilidade fiscal. Mas era uma parte minoritária, disposta a seguir os contornos básicos do New Deal de Franklin Roosevelt.

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Para entender a extensão da marca de Roosevelt na política americana em meados do século 20, deve-se levar em consideração este fato: de 1933 a 1969, os únicos homens que ocuparam o Salão Oval foram Franklin Roosevelt, fervorosos discípulos dele ou um general escolhido a dedo e apoiado por ele – caso de Dwight Eisenhower. 

Nas relações exteriores, o Partido Republicano na década de 1950 só recentemente havia minimizado sua postura isolacionista, mas ainda era cauteloso em envolvimento internacional. Em relação aos direitos civis, o partido era progressista e ativista. O presidente da Suprema Corte, Earl Warren, um ex-governador republicano, emitiu a decisão histórica que proibia a segregação escolar e o presidente Eisenhower despachou as tropas federais para o Arkansas para cumprir a sentença.

Nixon conduziu o início da primeira transformação republicana. O partido há muito tempo tinha um lado nacionalista, mas a adoção do presidente democrata Lyndon Johnson ao movimento dos direitos civis criou as circunstâncias para uma das grandes viradas da história americana.

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Os democratas, até então o partido das leis do sulista Jim Crow (leis que institucionalizaram a segregação racial), tornaram-se o partido dos direitos civis, enquanto os republicanos, o partido de Lincoln, começaram a refletir os ressentimentos dos brancos sulistas contra o governo federal e a legislação dos direitos civis.

Em outras áreas da política interna, Nixon governou como liberal. Reagan terminou o que Nixon havia iniciado, transformando o Partido Republicano em um partido ideologicamente orientado, defendendo firmemente o livre mercado, o livre-comércio, um governo limitado e um entusiasta do internacionalismo, que promoveu a democracia no exterior. Os republicanos do velho clube de campo nunca foram verdadeiros adeptos fiéis, mas aceitaram a redefinição de Reagan após seu sucesso eleitoral.

A decisão de Reagan de redefinir o partido, como uma organização quase libertária, persistiu durante os anos Clinton, embora o Partido Republicano sempre continuasse a trazer sua base socialmente conservadora. Então veio Donald Trump. Sua primeira grande causa política foi a alegação nociva e falsa de que o presidente Obama era um muçulmano nascido no Quênia.

Quando Trump concorreu à indicação republicana em 2016, ele estava virtualmente sozinho no pódio na rejeição à fórmula de Reagan. Ele afastou qualquer perspectiva de reforma no direito a benefícios, ao mesmo tempo em que criticava intervenções estrangeiras e a promoção da democracia.

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Mesmo na economia de livre mercado, ele flertou com ideias como grandes gastos em infraestrutura até assistência médica universal. Mas ele foi coerentemente linha-dura em algumas questões fundamentais – imigração, comércio, raça e religião. Em todas essas questões, ele se apegou a uma linha nacionalista, protecionista, anti-imigrante, antimuçulmana e favorável a policiais. Como alguém estranho às fileiras do partido, derrotou 16 talentosos republicanos. 

Um mês antes das eleições de novembro de 2016, quando todos esperavam que Trump perdesse, Paul Ryan falou pelo telefone com outros congressistas republicanos dizendo-lhes que ficassem à vontade para se distanciar de Trump. Após a chamada, o índice de aprovação do líder da Câmara entre os eleitores republicanos caiu quase 20 pontos. A base do partido – agora mais velha, mais branca e menos instruída – estava com Trump, não com Ryan.

Ryan teve seus defeitos. Ele incorporou a hipocrisia do “reaganismo”, defendendo a probidade fiscal ao mesmo tempo em que explodia o déficit. Ele foi um mau estrategista legislativo, incapaz de revogar o Obamacare depois de anos para se preparar para isso. Mas ele era um genuíno e ardente defensor das ideias de Reagan. Seus sucessores não serão. / TRADUÇÃO DE CLAUDIA BOZZO ] É COLUNISTA

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