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'As relações com o Brasil receberão tratamento especial'

Liberal aposta na imagem de um Paraguai moderno para derrotar o rival colorado, a quem acusa de representar o passado

Por Roberto Simon
Atualização:

A eleição de hoje é um conflito entre dois "Paraguais": o do narcotráfico, do contrabando e da lavagem de dinheiro, representado pelo colorado Horacio Cartes, e o do agronegócio e da busca pela industrialização, simbolizado pelo Partido Liberal. É nessa mensagem que aposta o candidato Efraín Alegre - apesar das acusações de corrupção que também pesam contra ele próprio. Alegre conversou com o Estado na quarta-feira. Prometeu manter uma boa relação com o Brasil, mas disse ser "normal" pressionar o vizinho poderoso em temas como o preço pago pela energia paraguaia de Itaipu. Acusado de envolvimento com o crime organizado, Cartes recusou-se a conceder entrevista.Seja pela questão fundiária dos brasiguaios ou por Itaipu, o governo brasileiro costuma ver os colorados como "mais confiáveis" do que os liberais. Como o sr. responde a isso? Efraín Alegre - O que eu posso dizer é que, com a nossa aliança no poder, as relações com o Brasil receberão um tratamento especial. Historicamente, o Partido Colorado tem sido incapaz de preservar nossos grandes interesses nacionais.E isso se aplica a uma renegociação da tarifa de energia em Itaipu? Efraín Alegre - No último governo (de Lugo), as compensações para a energia vendida ao Brasil triplicaram. O Paraguai vende a energia de Itaipu que não é consumida internamente e, enquanto houver essa transação comercial, é normal que os dois lados tentem negociar. Os paraguaios vão querer um preço mais alto; os brasileiros, mais baixo. Isso faz parte de qualquer negociação. Acreditamos que o caminho para o Paraguai é usar a energia gerada em Itaipu - e não vendê-la.Como seria possível isso? Efraín Alegre - Temos de nos industrializar. O Paraguai tem a energia mais barata de toda a região, algo que nos torna muito competitivos. Queremos trazer mais indústrias, incluindo brasileiras. A Fiesp está analisando vários setores brasileiros que não são mais competitivos no mercado internacional, mas aqui no Paraguai poderiam voltar a ser. Isso é fantástico para nós! Que venham ao Paraguai!O sr. concederia algum tipo de incentivo específico para essas empresas brasileiras? Efraín Alegre - O baixo custo de produção é o grande incentivo. Aqui, a energia é barata e as condições trabalhistas e fiscais, muito favoráveis.Sobre o Mercosul, um Paraguai sob governo dos liberais aceitará plenamente a presença da Venezuela? Efraín Alegre - Meu partido foi o único a defender no Congresso a incorporação venezuelana ao Mercosul. Os colorados recusaram a Venezuela. Portanto, somos os que têm as melhores condições para renegociar esse retorno ao bloco. Queremos o caminho da institucionalidade, sempre.Após a suspensão do Paraguai, o governo de Federico Franco, seu colega de partido, colocou em votação no Congresso a entrada venezuelana e isso foi recusado. Como ficaria essa situação? Efraín Alegre - Isso foi parte daquela conjuntura (após a destituição de Lugo). Naturalmente, será mudado.O Congresso voltará atrás para desfazer a decisão? Efraín Alegre - Claro que sim. Estive (na semana passada) com o presidente do Uruguai, José Mujica (que ocupa a presidência rotativa do Mercosul), e já está decidido que, passando as eleições, vamos iniciar imediatamente o diálogo para normalizar nossa situação no bloco. O objetivo de todos é retomar o funcionamento pleno do Mercosul.Muitos brasiguaios temem a proposta de um imposto de 10% sobre a soja. Qual é a posição do sr. quanto a essa proposta? Efraín Alegre - Apoiamos o projeto do governo de colocar um imposto sobre a renda - e não sobre a exportação - da soja. Precisamos fazer com que o Estado paraguaio consiga arrecadar mais e um imposto sobre a renda agropecuária é o caminho.A ação do crime organizado no Paraguai, do narcotráfico à lavagem de dinheiro, preocupa muito o Brasil. O que pode ser feito? Efraín Alegre - Esse é o modelo do Paraguai do passado - o qual o meu oponente representa. Triangulação (de dinheiro), contrabando, máfias. Cartes é esse passado. Nosso projeto é o do Paraguai da produção, do trabalho e da legalidade. Temos de aproveitar a nova imagem que tem o Paraguai diante do mundo. Nosso país, hoje, tem capacidade agropecuária para alimentar, sozinho, o mundo por oito dias. Somos esse Paraguai.Durante a campanha, o sr. foi acusado de ter superfaturado obras públicas enquanto era ministro. O que o sr. tem a dizer sobre isso? Efraín Alegre - Não existe nada. Tentaram mostrar irregularidades em uma estrada feita depois que eu havia deixado o cargo. Foi uma campanha de desprestígio contra mim levada adiante por assessores de Cartes. Como ele tem um antecedente obscuro - todos sabem disso -, então, tentaram manchar minha honra e a honestidade que a minha candidatura representa.E a decisão do presidente do Congresso, Jorge Oviedo Matto, de renunciar após acusações de que ele recebeu uma quantia milionária do governo para apoiar a campanha do sr.? Efraín Alegre - Que se investigue. É uma questão do governo, que não me diz respeito.Mas, supostamente, foi isso que teria levado o partido dele a apoiar a sua candidatura. Efraín Alegre - Temos promotores e juízes para isso. Que as autoridades investiguem e os responsáveis respondam.O sr. foi ministro de Lugo e apoiou a destituição do presidente. Valeu a pena? Efraín Alegre - Certamente, pois estávamos em uma conjuntura que demandava o restabelecimento da ordem. Era uma crise. A resposta de Franco devolveu a tranquilidade e a paz no campo. Hoje, o setor produtivo trabalha com preocupações normais - o clima, a seca, etc - e não diante da ameaça de ter suas propriedades invadidas. Cumprimos plenamente nosso propósito, que era garantir o bem-estar.Mas isso teve um custo político: vocês estão suspensos do Mercosul e isolados internacionalmente. Efraín Alegre - Ganhamos muito mais. Restabelecemos a paz, a institucionalidade, o desenvolvimento. Como paraguaios, isso é prioritário.

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