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Assassinato de opositor causa revolta na Tunísia e faz líder dissolver governo

Onda de violência. Premiê, pertencente ao partido islamista moderado Ennahda, anuncia a formação de um gabinete integrado por tecnocratas até a realização de novas eleições, convocadas para, no máximo, até dezembro; França e EUA expressam preocupação

Por TÚNIS
Atualização:

O primeiro-ministro da Tunísia, Hamadi Jebali, anunciou ontem a dissolução do governo e novas eleições. A decisão foi tomada horas depois do assassinato do líder da oposição, Chokri Belaid, da Frente Popular, aliança de partidos de esquerda crítica dos islamistas no poder. O crime desencadeou nova onda de protestos no país, dois anos após a deposição do presidente Zine al-Abidine Ben Ali, estopim da Primavera Árabe.Belaid, advogado de 48 anos, foi morto com quatro tiros quando deixava sua casa, em Túnis. Assim que receberam a notícia, milhares de tunisianos foram para as ruas da capital. Um policial morreu no confronto com os manifestantes. O Exército colocou tanques nas ruas para ajudar a conter os protestos. Líderes de quatro partidos da oposição ameaçaram deixar a Assembleia Nacional e convocaram uma greve geral, o que levou o primeiro-ministro a decidir pela dissolução do gabinete.Ele anunciou a formação de um governo de transição integrado por tecnocratas para conduzir o país até a realização de novas eleições no fim do ano ou "o mais rápido possível". "Depois do fracasso das negociações entre as partes sobre mudanças no gabinete, decidi formar um pequeno governo tecnocrata", disse Jebali, em discurso. O primeiro-ministro classificou o crime como "ato de terrorismo" e "assassinato político, o assassinato da revolução tunisiana". A crise política lança dúvidas sobre o sucesso e o futuro da transição da ditadura de Ben Ali - regime que durou 23 anos - para a democracia, que até agora era vista como modelo a ser seguido no mundo árabe.Como há dois anos, os manifestantes gritavam slogans pedindo o fim do governo: "O povo quer a queda do regime".Eles acompanharam a ambulância que levava o corpo de Belaid ao longo da Avenida Bourguiba e reuniram-se na frente do prédio do Ministério do Interior, no centro da capital, palco da Primavera Árabe. A polícia usou bombas de gás lacrimogêneo para dispersar a multidão.Opositores acusam o governo de negligência, se não cumplicidade, no assassinato. Belaid era conhecido como um dos maiores críticos do atual regime, nas mãos de uma coalizão liderada pelo partido moderado islamista Ennahda. A viúva do líder político, Basma Belaid, disse que ele vinha recebendo ameaças e acusou abertamente o Ennahda pelo crime. A oposição pedia ontem a renúncia de ministros do Ennahda. Parte do motivo está na criação, há alguns meses, pelo partido islamista da Liga de Proteção da Revolução, que se tornara, segundo críticos, um esquadrão velado contra comícios da oposição. Na noite anterior ao seu assassinato, Belaid pediu em entrevista à TV Nessma a dissolução da liga e acusou o Ennahda de "incitar a violência". Disse ainda que aqueles que se opõem ao Ennahda "tornam-se alvos de violência." Em discurso no Parlamento Europeu, em Estrasburgo, na França, o presidente tunisiano, Moncef Marzouki, do partido secular que é parte da coalizão no poder, disse que o assassinato de Belaid representa uma ameaça a todos os tunisianos. Diante da crise, ele cancelou uma visita agendada ao Cairo.Reação. "Não há justificativa para um ato de violência covarde e ultrajante como este", disse a porta-voz do Departamento de Estado americano, Victoria Nuland. "Não existe lugar para a violência na nova Tunísia. Pedimos ao governo que conduza uma investigação justa, transparente e profissional para garantir que os responsáveis sejam levados à Justiça, de acordo com as leis da Tunísia e o direito internacional."O presidente da França, François Hollande, demonstrou preocupação com a onda de violência no país. "Esse assassinato priva a Tunísia de uma de suas vozes mais corajosas e livres", expressou. O funeral de Belaid está previsto para sexta-feira, para quando os manifestantes prometem novos protestos. / AFP, AP e REUTERS

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