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Atual governo seria refilmagem do brutal regime de Somoza

Como o ditador, Ortega também usa a força letal contra a oposição que pede sua renúncia

Por Charles Lane
Atualização:

Daniel Ortega pode até já ter sido um idealista – talvez quando garoto, ao ouvir o pai contar como lutou com os rebeldes de César Augusto Sandino contra os fuzileiros navais dos EUA antes da 2.ª Guerra. Ou talvez nos anos 50, quando engrossou os protestos contra a dinastia de Anastasio Somoza, apoiada pelos EUA. Sem dúvida, algum grande sonho político deu forças a Ortega nos sete anos que passou na prisão, entre 1967 e 1974, acusado de terrorismo pelo governo de Somoza. 

O presidente da Nicarágua, Daniel Ortega (D), e sua mulher e vice, Rosario Murillo Foto: AFP

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E alguma crença em liberdade, independência e igualdade deve ter ajudado Ortega e seus camaradas da Frente Sandinista de Libertação Nacional a chegar ao poder na revolução de 1979, que depôs Somoza. 

Hoje, aos 72 anos, Ortega é o presidente da Nicarágua – e se a atual repressão aos protestos contra seu governo de 11 anos fosse um filme, daria para dizer que é uma refilmagem da guerra brutal desfechada por Somoza contra seus opositores nos anos 70. Como Somoza, Ortega usa força letal. Desde que o levante popular começou, em abril, quase 300 morreram.

Não se sabe qual explicação é mais apavorante: a de que esse ex-revolucionário esquerdista abandonou seus ideais ou a de que continua fiel a eles. 

Para pessoas como Ortega, não há nunca contradição entre as metas da humanidade e os instrumentos necessários para atingi-las: os fins sempre justificam os meios. Desde que retomou a presidência, em 2006, Ortega – como Somoza no apogeu – governou com relativa estabilidade. Os nicaraguenses o aceitaram como aceitaram o somozismo, principalmente pelo medo da instabilidade e da ruptura. Como Somoza, Ortega se convenceu de que isso era apoio popular e legitimidade política. E, como Somoza, manteve o poder e o dinheiro em família. 

Hoje, todo o idealismo na Nicarágua está com os estudantes e os manifestantes de classe média, que vêm exigindo democracia. Mas o fato de Ortega estar deliberadamente empurrando os opositores para o extremismo por meio do uso desenfreado da violência é motivo para se temer uma guerra civil.

Durante a Guerra Fria, a questão do que fazer com a Nicarágua praticamente dominou a política externa dos EUA. Nos anos 80, estávamos divididos sobre a Nicarágua, mas, apesar de todas as discordâncias, havia uma crença comum: a de que nossos ideais importavam, tínhamos obrigação de aplicá-los no mundo. Poderíamos hoje usar mais dessa crença. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ É JORNALISTA

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