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Basta de opções econômicas falsas

Por Robert E. Rubin e Jared Bernstein
Atualização:

Enquanto economistas e cientistas políticos tentam entender em que ponto estamos, como chegamos aqui e para onde vamos, nos vemos cercados por dicotomias: temeridade fiscal versus retidão fiscal; capital versus trabalho; livre comércio versus protecionismo. O novo presidente terá de fazer uma escolha entre essas polaridades. Mas essas diferenças são reais? A nossa visão - e partimos de perspectivas diferentes - é de que, sob muitos aspectos, elas são falsas e servem mais como distração e não como um plano. RETIDÃO FISCAL VERSUS INVESTIMENTO PÚBLICO A Bíblia já tratou dessa questão muito tempo atrás: há um tempo para gastar e um tempo para poupar. Concordamos que existe um tempo para a disciplina e outro para a liberalidade fiscal. No caso da atual crise financeira, nossa visão é a de que a nossa economia a curto prazo precisa de um enorme estímulo fiscal que possa criar uma demanda econômica substancial. Acreditamos também que esse estímulo fiscal deve estar vinculado a um compromisso de se restabelecer condições fiscais sólidas, com um programa para vários anos, com espaço para o investimento público. Nosso futuro econômico também exige investimentos públicos em áreas críticas, como educação, saúde, energia e muito mais. O novo presidente tem de avançar em múltiplas vias, com a restauração de um regime fiscal saudável e investimentos públicos cruciais. Em primeiro lugar, com base no programa de US$ 700 bilhões aprovado para socorrer o sistema financeiro, o governo deve comprar ativos, seja na forma de uma participação patrimonial ou comprando dívidas de bancos. Em seguida, alguns investimentos públicos podem ajudar a fazer frente aos desafios fiscais. A maior causa de nossos projetados desequilíbrios fiscais está nos programas assistenciais para idosos e para os mais pobres, o que realça a importância de uma reforma dos programas de assistência à saúde que amplie a cobertura para mais americanos, diminuindo os custos. As alíquotas de imposto de renda de pessoa física e outros impostos para aqueles que estão no topo poderiam retornar aos mesmos níveis da era Clinton. Tais alíquotas ajudaram a financiar a redução do déficit e colaboraram para o investimento público, contribuindo para a mais longa expansão econômica de nossa história. CAPITAL VERSUS MÃO-DE-OBRA Além de restaurar um regime fiscal sólido, precisamos trabalhar com outros países para chegar a taxas cambiais equilibradas e resolver nossos atuais desequilíbrios de conta corrente. Mas essa idéia de que não podemos ser responsáveis em matéria fiscal e ao mesmo tempo realizar investimentos públicos é um mito. Nesse caso também, apesar do alegado conflito, nossos mercados de mão-de-obra e de capital, dinâmicos e flexíveis, se combinaram, gerando ganhos de produtividade impressionantes nos últimos anos. O problema é que tais ganhos não chegaram aos trabalhadores. Embora a produtividade tenha crescido cerca de 20% de 2000 a 2007, a renda real da classe média e trabalhadora diminuiu US$ 2 mil, uma queda de 2%. Uma causa por trás desse resultado foi a redução drástica do poder de barganha dos trabalhadores e a queda no número de adesões aos sindicatos. Uma verdadeira economia de mercado precisa ter verdadeiros mercados de mão-de-obra, em que empresa e trabalhador negociem como pares. Uma política pública sólida, como investimentos na educação, saúde, energia e infra-estrutura, financiada por uma taxação progressiva, também pode propiciar um crescimento vigoroso e uma confiança empresarial para investir e contratar. Além disso, políticas que levam a um crescimento forte também ajudam a elevar os salários, equipando melhor os trabalhadores para se saírem bem no mercado global e encorajando as empresas a criarem mais empregos. LIVRES MERCADOS VERSUS REGULAMENTAÇÃO E PROTEÇÃO Importantes lições podem ser tiradas dos transtornos verificados no nosso sistema financeiro. Precisamos ter como meta tornar cada vez mais eficaz o equilíbrio entre uma proteção do consumidor cada vez maior e um risco sistêmico cada vez menor de um lado e, de outro, preservar os benefícios de um sistema baseado no mercado. As conseqüências da crise são profundas para os americanos, com a perda de empregos e queda da renda. Medidas para reformar e fortalecer o sistema financeiro precisam ser avaliadas nesse contexto: no final, elas vão se traduzir numa melhora no nível de emprego, renda e patrimônio dos trabalhadores americanos? Quanto ao comércio, a escolha não está entre liberalização do comércio versus protecionismo. Pelo contrário, à medida que o comércio se expande, precisamos reconhecer que proteger os trabalhadores não significa protecionismo. Precisamos preparar melhor as pessoas para que consigam competir e ajudar aquelas que foram prejudicadas. Ou seja, precisamos investir melhor os benefícios obtidos com o comércio, implementando redes de segurança mais eficientes. Escolhas erradas, fundamentadas em ideologia, nos impediram de resolver eficazmente tais problemas. Nesta conjuntura tão crítica, não temos outra escolha, a não ser nos afastarmos dessas falsas dicotomias e partirmos na direção de um pragmatismo equilibrado, cujo objetivo é dividir amplamente a prosperidade e aumentar a segurança econômica. * Robert E. Rubin, ex-secretário do Tesouro e diretor do Citigroup, e ** Jared Bernstein, economista do Instituto de Política Econômica

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