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Bolívia caminha sobre a lâmina de uma faca, adverte ex-presidente

Segundo Jaime Paz Zamora, Evo Morales deve agir com cuidado porque "se não souber percorrer o caminho pode levar o país para o buraco"

Por Agencia Estado
Atualização:

O ex-presidente da Bolívia Jaime Paz Zamora (1989-1993) afirmou que com o governo Evo Morales seu país transita "por um bom caminho, mas sobre a lâmina da faca", além de ter criticado a postura agressiva do chefe de Estado diante de países amigos como a Espanha e o Brasil. "Acreditamos que vamos por um bom caminho como país e isto é importante. Mas, é um caminho que está sobre a lâmina de uma faca", declarou Paz Zamora em São Paulo, onde participou com outros ex-presidentes latino-americanos do IV Encontro do Grupo de Biarritz. Segundo Paz Zamora, a revolução que Morales realizou no governo e que inclui a nacionalização dos hidrocarbonetos era necessária "para que a Bolívia finalmente pudesse ser um país moderno", porém alertou que o presidente deve agir com cuidado porque "se não souber percorrer o caminho pode levar o país para o buraco". "Por isto, a responsabilidade de Evo Morales é gigantesca e tem que ter cuidado com o autoritarismo, com o sectarismo, com os ódios pessoais, de revanchismos, cuidado de muitas coisas", afirmou. Paz Zamora declarou que "nenhum presidente na Bolívia teve tanto capital político em suas mãos para realizar bem as coisas" como tem Morales. Sobre os hidrocarbonetos ele afirmou que "Morales não nacionalizou nada", mas adotou esse termo "porque a ordem de mudança tinha tomado este nome". Segundo o ex-presidente, o que Morales fez na realidade foi voltar a uma lei de 1990, promulgada por seu governo, que seu sucessor, Gonzalo Sánchez de Lozada mudou em 1996 e que "foi o que gerou um sentimento de que tínhamos dado nossos recursos de presente". "A comunidade internacional que fique tranqüila. Na realidade não é uma nacionalização, é o retorno a uma situação que já existia", declarou. Segundo Paz Zamora, seu partido, o Movimento da Esquerda Revolucionária (MIR) apóia o programa de Morales e espera que sua administração "atue com racionalidade e de forma mais firme naquelas que são as reivindicações do povo boliviano". Lição de Bolívar Ele disse também que Morales está cumprindo seu programa de governo, mas que a forma como tratou alguns assuntos, especialmente a relação com países amigos após a nacionalização dos hidrocarbonetos, não é a melhor. "Aqui quero citar uma frase de Bolívar que Morales deveria considerar. Bolívar dizia: ´Tudo é possível de ser feito, dependendo da forma´, e a forma está faltando ao presidente Morales", declarou. "Morales não tinha porque ser agressivo com a Espanha, não tinha porque ser agressivo com o Brasil, um país que tem 3.500 quilômetros de fronteira com a Bolívia". Paz Zamora fazia menção assim a comentários de Morales após a nacionalização dos hidrocarbonetos, que atinge especialmente os interesses da Petrobras e da Repsol-YPF. "Temos que ser muito cuidadosos com o Brasil. Para nós o Brasil é muito mais que gás. É necessário ter cuidado com a Petrobras, pois o Brasil também é o único país que abriu o mercado de gás para nós e não podemos tratá-lo mal. Algumas coisas poderão estar de uma forma ou de outra, mas é necessário um respeito fraterno", declarou. O ex-presidente considerou "maravilhoso" o fato de que a democracia boliviana tenha se consolidado a ponto de um cidadão que começou de abaixo, como Morales, tenha chegado à presidência pelo voto popular. Mas afirmou que após esta vitória política, "que é fruto de 30 anos de lutas, o país tem que avançar mais na área econômica que na social". "Agora a Bolívia tem que se transformar em uma democracia economicamente inclusiva, socialmente inclusiva e que seja um instrumento do bem-estar e do desenvolvimento nacional, de soberania individual e nacional", disse. Sobre as estreitas relações da Bolívia com a Venezuela pela amizade existente entre Morales e seu homólogo Hugo Chávez, Paz Zamora afirmou que embora seja válido incorporar a solidariedade para o desenvolvimento entre países irmãos, estão sendo cometidos "exageros". O ex-presidente também criticou a direita boliviana, que nas suas palavras "quer seguir os passos da oposição venezuelana". E concluiu: "A coisa não é por aí".

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