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Brasileiro na ONU acusa potências de 'alimentar' guerra síria

Para Paulo Sérgio Pinheiro, o governo de Assad, no entanto, ainda comete os principais massacres no país

Por Jamil Chade , correspondente e Genebra
Atualização:
Prédio destruído na cidade de Alepo Foto: ZEIN AL-RIFAI/AFP

GENEBRA - O brasileiro Paulo Sérgio Pinheiro, presidente da Comissão de Inquérito da ONU para os Crimes na Síria, acusa a comunidade internacional de "alimentar" a guerra em Damasco e alerta que "a diplomacia fracassou". 

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Em um informe apresentado nesta terça-feira, 23, em Genebra, Pinheiro abandonou os discursos politicamente calculados que marcam a entidade e decidiu fazer uma crítica direta às potências internacionais e ao Conselho de Segurança, alertando que também são responsáveis pelos massacres. 

"A continuação dessa guerra representa um fracasso profundo da diplomacia", declarou. "Estados com influência têm atuado de forma equivocada em seu esforço de acabar com o conflito na Síria". Seu apelo é para que os responsáveis sejam levados ao Tribunal Penal Internacional. 

A guerra entra em seu quinto ano, deixou mais de 220 mil mortos e é considerado a maior crise humanitária do mundo, com metade do país afetado. Pinheiro listou crimes cometidos pelo governo, acusou o regime de Bashar Assad e alertou que grupos islamistas têm elevado o controle em dezenas de áreas. 

Pinheiro também acusou todas as partes de sitiar cidades, dando apenas duas opções: "se render ou morrer de fome". Para ele, apesar do avanço dos grupos islamistas radicais, é o regime de Assad o "grande responsável" pelas mortes. 

Mas seu recado foi direcionado em especial aos diferentes governos que apoiam os atores do conflito. "Enquanto defendem uma solução política, alguns aprofundaram seu envolvimento militar, acentuando a internacionalização do conflito", alertou Pinheiro. "Acreditando que pressão militar é um pré-requisito de qualquer processo político para ter sucesso, os atores externos inundaram as partes em guerra com seu apoio, dinheiro, combatentes e armas. Isso apenas alimentou uma escalada brutal da violência." 

Para o brasileiro, o apoio das potências a diferentes grupos criou uma "cultura da impunidade". "Aqueles que têm maior responsabilidade pelos crimes, violações e abusos contra os sírios não temem consequências", alertou Pinheiro. "Por quatro anos temos denunciado abusos, crimes de guerra e crimes contra a humanidade. Mas a Justiça não está em nosso alcance." 

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"A ausência de um ação decisiva pela comunidade internacional alimentou uma profunda cultura de impunidade", disse o brasileiro. "Uma guerra em que civis são mortos sistematicamente exige mais que compaixão para ser resolvida."

O presidente da Comissão de Inquérito apelou às potências para que mostrem "compromisso sem ambiguidades" e sejam criadas condições para uma negociação. Mas Pinheiro alerta que para chegar à paz governos estrangeiros terão de "colocar de lado os interesses nacionais de poucos e colocar os direitos humanos no centro". "Sem paz e justiça na Síria, o mundo vai sofrer as consequências", completou.

Resposta. O governo sírio acusou Pinheiro de "fabricar informações" e alertou que são grupos da oposição que atacam bairros. "Há gente que gosta de dizer que são membros da oposição moderado", disseram os representantes de Assad. "O informe traz acusações com motivações políticas e não tem lógica", declarou Damasco. 

Keith Harper, embaixador dos EUA na ONU, preferiu acusar o regime pelos "principais massacres na Síria". "Em abril, ataques do governo causaram 1,7 mil mortos, contra 109 pelo Estado Islâmico", disse. 

Já o governo da Arábia Saudita, acusado de enviar armas a grupos de oposição, insiste que a responsabilidade pela violência é do Irã. "É o governo que é o grande responsável e é o apoio do Irã que tem causado esse desequilíbrio de poder dentro do país", acusou Riad. 

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