Brexit e eleições em 4 países-chave ameaçam União Europeia em 2017

Partidos eurocéticos e de extrema direita crescem e podem chegar ao poder na Holanda, na Alemanha, na França e possivelmente na Itália, após a queda do primeiro-ministro Matteo Renzi; unidade do bloco corre risco com avanço do nacionalismo

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Por Andrei Netto CORRESPONDENTE e PARIS
Atualização:

Uma tempestade perfeita se forma na União Europeia para 2017. No ano em que o Tratado de Roma completa 60 anos, o bloco enfrentará o divórcio com a Grã-Bretanha e quatro eleições gerais em países importantes, nas quais partidos nacionalistas têm chances concretas de vitória. 

Líderes do G-7 se reúnem para uma foto no hotelSchloss Elmau, en Krün, na Alemanha.Da esquerda para a direita:o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk,o primeiro-ministro do Japão, Shinzo Abe, oprimeiro-ministro canadense, Stephen Harper, opresidente dos EUA, Barack Obama,a chanceler alemã, Ângela Merkel,o presidente francês, François Hollande,o premiê britânico, David Cameron,o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi e opresidente da Comissão Europeia,Jean-Claude Junker Foto: Stephen Crowley/The New York Times

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Em meio a uma onda populista e antissistema e à desconfiança crescente em relação a Bruxelas, eleitores da França, da Alemanha, da Holanda e provavelmente da Itália escolherão novos líderes políticos. Para especialistas, jamais o bloco esteve tão ameaçado de implosão. 

Em diferentes capitais do continente, a preocupação com a degradação política é real. Na sexta-feira, a Comissão Europeia lembrou com discrição e sem festejos os 25 anos do Tratado de Maastricht, que transformou a comunidade econômica, criada em março de 1957, em união política. Nenhum chefe de Estado ou de governo participou de solenidades ou de homenagens, uma situação que escancarou a impopularidade da união. 

Coube ao presidente da comissão, Jean-Claude Juncker, admitir o momento de fraqueza e defender a integração, quando poucos líderes o fazem em Berlim, Paris, Roma ou Amsterdã. “Pela primeira vez na história europeia do pós-guerra, nem todos os países-membros estão aplicando as leis”, reconheceu Juncker, lembrando a recusa da Hungria e da Eslováquia em aceitar as cotas de imigração criadas em 2015 e jamais implementadas. 

Para o dirigente, líderes políticos e eleitores esqueceram o peso diplomático e econômico da União Europeia no mundo. “Dentro de 20 anos, nenhum dos países-membros sozinho estará no G-7”, lembrou o dirigente luxemburguês.

Nas entrelinhas do discurso de Juncker está o temor de líderes políticos pró-integração de que a UE não resista aos desafios de 2017. Para analistas, a ameaça é real, porque nas quatro maiores potências do bloco partidos políticos nacionalistas ameaçam a hegemonia das legendas favoráveis a Bruxelas. 

É o caso da França, onde a líder de extrema direita, Marine Le Pen, da Frente Nacional (FN), continua a comandar parte dos cenários em pesquisas de opinião para as eleições presidenciais de abril e maio. “Se Marine Le Pen vencer, isso produzirá um choque existencial para a estabilidade da União Europeia”, entende Simon Tilford, vice-diretor do Centro para a Reforma da Europa, de Londres.

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O risco na França, porém, está longe de ser o único. Em Berlim, a Alternativa para a Alemanha (AfD), partido populista e xenofóbico, pode obter um lugar inédito no Parlamento, enquanto na Holanda Geert Wilders, líder populista do Partido pela Liberdade, é um dos líderes das pesquisas de opinião. 

Não bastasse, agora a situação é instável também na Itália, que na semana passada ficou sem primeiro-ministro após a demissão de Matteo Renzi. Com isso, a perspectiva de eleições antecipadas ainda em 2017 é cada vez mais provável, o que abriria uma janela de oportunidade para um forte crescimento do populista Movimento 5 Estrelas, liderado por Beppe Grillo. 

“A UE enfrentará nos próximos meses uma forte avanço de partidos que chamamos de populistas”, adverte Jean-Jacques Kourliandsky, cientista político do Instituto de Relações Internacionais e Estratégicas (Iris), de Paris, para quem a situação é grave.  “O que está em questão, antes mesmo da sobrevivência da Europa, é a democracia, seus valores, seus princípios de base. São os cimentos compartilhados pelos europeus que estão seriamente colocados em questão em vários países.”

Para Mark Leonard, diretor do Conselho Europeu de Relações Exteriores, é a ordem liberal que impera na Europa que está sob ameaça direta. “Pressionada de todas as direções, a Europa pode não ser capaz de suportar a pressão. Populistas à esquerda e à direita estão tentando reverter a ordem liberal. Essa insurgência está sendo apoiada ativamente pela Rússia de Putin, e, agora, ao que parece, a América de Trump”, entende Fredrik Wesslau, diretor do Programa Europa Ampliada do Conselho Europeu de Relações Exteriores, de Bruxelas. 

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“O próximo ano será decisivo, uma vez que haverá eleições importantes na França, na Holanda e na Alemanha, nas quais os partidos populistas anti-UE devem avançar. A própria União Europeia corre o risco de ser uma vítima precoce.”

Três Perguntas Para: Mario Telo, cientista político da Universidade Livre de Bruxelas e da Universidade Luiss, de Roma

1. Quais são os riscos para a UE nas eleições de 2017? O que é novo é que o crescimento dos populistas e antissistema não está mais apenas no nível de movimentos de protesto. Agora visam o poder político. Chegaram ao poder não só na Hungria e na Polônia, mas também nos EUA. As mudanças de governo causam efeitos, como protecionismo, nacionalismo e xenofobia.

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2.Onde o risco é maior? O país mais inquietante é a Holanda, onde as pesquisas anunciam que o partido de Geert Wilders está em primeiro nas eleições de março. Na França, Marine Le Pen chegará ao segundo turno, mas 65% dos franceses recusam seu nome e François Fillon (direita liberal-conservadora) pode ganhar se aceitar um programa mais centrista.

3.Qual é a chance de a UE sair reforçada da crise?  As tendências pela desintegração vêm acompanhadas de tendências pela integração. Fora da UE são ignorados os progressos enormes de união econômica na zona do euro nos últimos seis anos: união bancária, fundo comum contra crises, com € 800 bilhões, que salvou Irlanda, Portugal e Grécia da falência. 

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