Brown e Sarkozy lançam nova agenda

Líderes europeus se afastam da política externa de Bush e tentam retomar influência de seus países no cenário mundial

PUBLICIDADE

Por Gabriella Dorlhiac
Atualização:

Gordon Brown, primeiro-ministro britânico, e Nicolas Sarkozy, presidente francês, estão há poucos meses no poder. Mesmo assim, vêm dominando as manchetes dos jornais. Em iniciativas para Darfur, União Européia e luta contra a pobreza, os dois parecem determinados a distanciar-se dos respectivos governos anteriores e , ao mesmo tempo, introduzir mudanças na agenda internacional até agora imposta pelos Estados Unidos. O foco das atenções sobre Brown e Sarkozy deixa clara a perda da força americana no cenário mundial. Há anos o mundo havia se acostumado à liderança dos EUA em assuntos internacionais, especialmente após os atentados de 11 de setembro de 2001, quando o presidente George W. Bush declarou guerra ao terror, liderou a coalizão que atacou o Taleban no Afeganistão e invadiu o Iraque. Mas o fracasso até agora das ofensivas americanas minou a chamada ''''autoridade moral'''' de Washington, deixando um vácuo no cenário mundial e abrindo caminho para novos atores, com diferentes prioridades. ''''Hoje há um enorme espaço para influência européia no cenário mundial'''', explicou ao Estado o americano Charles Kupchan, especialista em Europa do centro de estudos Council on Foreign Affairs, em Washington. Segundo Kupchan, já se pode observar uma clara tendência de distanciamento de vários países das políticas de Washington. ''''Isso não apenas com aliados tradicionais, mas também com outros, como o presidente russo, Vladimir Putin, que está sendo persistente em questionar a liderança dos EUA em várias frentes'''', disse. Brown certamente é o principal exemplo para o distanciamento dos aliados. Preocupado em apagar a imagem negativa deixada pelo antecessor Tony Blair, apelidado de ''''poodle de Bush'''', Brown fez suas primeiras viagens como premiê britânico para a Alemanha e França. Nos EUA, mesmo ressaltando a relação próxima do país com Washington, imprimiu um tom impessoal durante o encontro com Bush. ''''Brown não quer comprar briga com os EUA, mas defenderá fortemente seus interesses nacionais'''', diz o britânico Jack Hayward, especialista em políticas européias da Universidade de Hull, na Inglaterra. Pragmático, Brown deve escolher melhor suas ''''frentes de batalha'''' no cenário mundial, evitando o desgaste desnecessário da imagem britânica. Ainda segundo Hayward, Brown focará suas política no desenvolvimento de países pobres, aproveitando sua experiência como ministro da Economia. Enquanto Brown adota uma política ''''pé-no-chão'''', Sarkozy imprime um ritmo alucinante à sua política externa. Horas após despedir-se de Jacques Chirac, seu antecessor, na porta do Palácio do Eliseu, Sarkozy viajou para a Alemanha, onde reuniu-se com a chanceler Angela Merkel e prometeu ''''acabar com a paralisia da Europa''''. Desde então empenhou-se pessoalmente pela libertação da senadora colombiana Ingrid Betancourt, que é cidadã francesa, participou da negociação de um novo acordo da UE, e foi decisivo para libertação das enfermeiras búlgaras presas na Líbia - onde assinou acordos militares que causaram polêmica na França. Sarkozy ainda teve tempo de propor a criação de uma união de países mediterrâneos. Apesar de vaga, a proposta poderia ajudar a França a lidar com o problema da imigração ilegal de africanos. ''''Sarkozy quer estabelecer sua presidência como o retorno do ''''hiperpresidencialismo''''. Ele tem um estilo clássico de política gaullista. A política externa será um ponto forte do governo'''', explicou o britânico Paul Smith, especialista em França da Universidade de Nottingham. Segundo ele, Sarkozy será hábil o suficiente para reaproximar a França dos EUA, após os anos de antiamericanismo do governo Chirac, mantendo-se independente. Os especialistas, no entanto, ressaltam que apesar do sucesso a curto prazo, tanto Grã-Bretanha quanto França não têm força para, sozinhas ,equiparar-se aos EUA - com seu poder militar e econômico insuperáveis. ''''É preciso ter uma cooperação maior entre os países da UE'''', avaliou Kupchan. Um exemplo de que as parcerias funcionam é a resolução para o envio de forças de paz para Darfur, no Sudão, aprovada no dia 31 pela ONU após pressão de Brown e Sarkozy. ''''Darfur foi uma coincidência feliz. A resolução saiu porque beneficiava Paris e Londres. Por enquanto não podemos dizer se haverá outras iniciativas do tipo. Não vemos cooperação em outros assuntos'''', disse Smith. Para o especialista, as políticas da UE funcionam como montanha-russa - às vezes estão em alta, às vezes em baixa. ''''No momento, a UE passa por um momento de inércia'''', disse Smith. De qualquer forma, a cooperação entre países europeus - seja por meio da UE ou por associações momentâneas - pode ter impacto profundo na agenda internacional, mudando o foco bélico até agora imposto por Washington em direção ao desenvolvimento economômico e multilateralism o. Pelo que mostraram até agora, Sarkozy e Brown são os líderes naturais para conduzir essa transformação .

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.