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Bush prepara EUA para "um novo tipo de guerra"

Por Agencia Estado
Atualização:

"Este conflito começou num momento e em termos escolhidos por outros. Ele terminará de uma maneira e numa hora de nossa escolha." Com essas duas frases, o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, expressou nesta sexta-feira a "fúria silenciosa" dos americanos diante dos ataques terroristas da última terça-feira e começou a prepará-los para o que chamou de "um novo tipo de guerra", durante uma missa realizada na Catedral Nacional de Washington em memória às mais de 5.000 pessoas que morreram no World Trade Center, em Nova York, no Pentágono, e num dos quatro boeings seqüestrados que caiu no sul da Pensilvânia. Mobilização À tarde, Bush visitou os escombros do World Trade Center, que se converteu no epicentro de uma mobilização cívico-patriótica nacional como os norte-americanos não viam desde a Segunda Guerra Mundial. Três outras decisões confirmaram hoje a determinação dos Estados Unidos de ativarem seu enorme poderio econômico e militar contra o inimigo invisível que golpeou seus principais centros financeiro e de defesa e provocou, num intervalo de menos de meia hora, destruição e morte numa escala que o país não conhecia, dentro de seu território continental, desde a guerra civil de 1860-1865. Resolução Pouco depois do encerramento da missa - uma impressionante demonstração de unidade nacional à qual comparaceram quatro ex-presidentes republicanos e democratas, os líderes dos dois partidos, que compartilham o poder num Congresso dividido ao meio, e o ex-vice-presidente Albert Gore, que perdeu as eleições à Casa Branca para Bush em circunstâncias discutíveis -, o Senado aprovou por unanimidade uma resolução que autoriza Bush a "usar toda a força necessária e apropriada contra as nações, organizações e pessoas que tenham planejado, autorizado, perpretado ou ajudado os ataques terroristas... ou abrigado tais organizações e pessoas" responsáveis por tais atos. A Câmara deve aprovar a medida amanhã. Paralelamente, o Congresso aprovou, sem nenhum voto contrário, uma verba de emergência de US$ 40 bilhões - o dobro do que o Executivo pediu - para os trabalhos de resgate dos cadáveres, recuperação das áreas e negócios destruídos e assistência às famílias atingidas pela catástrofe, bem como para a mobilização inicial de recursos e forças para a guerra contra o terrorismo. Chamada à ativa No terreno militar, a mobilização começou nesta sexta-feira com a chamada à ativa de 35.000 reservistas, a maioria da força aérea (13.000) e do exército (10.000) para reforçar os dispositivos de defesa em 26 das bases militares do país. Na última vez que os EUA foram à guerra, há pouco mais de dez anos, no Golfo Pérsico, a resolução que autorizou a administração do pai do atual presidente, George H. Bush, a responder pela força à invasão do Kuwait pelo Iraque foi aprovada por uma margem de apenas cinco votos no Senado - 52 contra 47. É preciso voltar mais de meio século no tempo - a dezembro de 1941, quando o Japão atacou a base naval norte-americana de Pearl Harbor, no Hawaí - para se encontrar a mais recente declaração formal de guerra dos Estados Unidos. Embora dê plenos poderes a Bush, a resolução aprovada pelo Senado é mais limitada do que a que ele solicitou inicialmente. Na versão original do projeto de lei apresentado pela Casa Branca, o presidente pedia autorização para usar a força também de forma "preventiva", de modo a previnir atos terroristas. A demanda não foi bem recebida por legisladores democratas e mesmo por alguns republicanos. A versão aprovada permite que o presidente responda aos atos terroristas desta semana mas não lhe dá um cheque em branco. Estratégia agressiva "Há um tempo para falar e um tempo para agir", disse a senadora republicana Kay Bailey Hutchison, do Texas, em apoio à decisão do Senado. A medida, embora mais restrita do que a que Bush desejava, parece dar-lhe um mandato suficiente para executar a estratégia agressiva, abrangente e sem meios termos que ele concebeu para responder aos seqüestros dos aviões e aos mortíferos ataques contra o World Trade Center e o Pentágono. O vice-ministro da Defesa, Paul D. Wolfowitz, descreveu sem meias tintas os objetivos dos EUA nessa nova guerra. "Não se trata apenas de capturar pessoas, julgá-las e puni-las, mas também eliminar os santuários (dos terroristas), remover seus sistemas de apoio e acabar com Estados que apóiam o terrorismo." Segundo Wolfowitz, a campanha militar na qual o país está prestes a embarcar não se limitará às operações a distância, com lançamento de mísseis contra alvos a dezenas e centenas de quilômetros de distância, sem riscos para as forças americanas. Invasão O vice-secretário de Defesa indicou que a estratégia incluirá, se necessário, a invasão e a ocupação de nações distantes por forças terrestres dos Estados Unidos e de seus aliados. Para países como o Afeganistão, que abriga Osama bin Laden, o milionário saudita no topo da lista de suspeitos de Washington, ou Sudão e Paquistão, que têm relações com Bin Laden e seus protetores afegãos do Taleban, ou mesmo o Iraque, a escolha oferecida por Washington é clara: colabore com os EUA na campanha contra o terrorismo ou arque com as conseqüências. Na quinta-feira, quando falou ao país com os olhos marejados depois de conversar com o prefeito e o governador de Nova York, Bush advertiu os inimigos dos EUA a não confundirem a tristeza que a tragédia provocou no país com fraqueza ou hesitação. "Também somos duros e decididos e agora temos a oportunidade de fazer um favor a gerações (futuras), unindo-nos para açoitar o terrorismo", disse ele. Powell O secretrário de Estado, Colin Powell, a figura mais moderada do gabinete de Bush, que está empenhado na construção de uma coalizão global contra o terrorismo, usou linguagem reminiscente da Guerra do Golfo, quando comandou as forças armadas americanas e promoteu aniquilar o inimigo. Ele disse que, depois que Washington terminar o trabalho de coletar, montar e apresentar ao mundo as provas sobre o envolvimento de Bin Laden nos ataques contra o World Trade Center e o Pentágono, "iremos atrás de sua rede de apoio, daqueles que abrigaram e ajudaram" os terroristas. "Quando tivermos acabado com essa rede, continuaremos com um ataque global ao terrorismo em geral." Riscos Essa estratégia, que reflete os instintos políticos maximalistas e radicais da maioria dos membros da administração e do próprio presidente em matéria de segurança, contém óbvios riscos. Sem falar da natureza de um conflito entre um Estado organizado, que obedece a regras e depende de um sistema político e econômico aberto para existir, e fanáticos religiosos dispostos a ações suicidas e organizados em células terroristas em vários países, The New York Times lembrou nesta sexta-feira que o atrasado Afeganistão - o alvo mais óbvio de um primeiro ataque americano - foi "ao longo dos séculos, o campo de batalha e o túmulo dos interesses de grandes poderes". Por ora, porém, esses riscos não diminuem a ira dos norte-americanos nem seu clamor para que o governo desencadeie, o quanto antes, uma ampla ofensiva de ações punitivas contra Bin Laden, seus protetores e o terrorismo internacional. As pesquisas de opinião indicam que 70% acreditam que o país está em guerra, e, por margem de dois terços, dizem que estão dispostos a apoiar o governo nessa campanha militar mesmo que ela resulte em perdas no campo de batalha.

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