Bush reverteu agenda para a América Latina após atentados

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Por Agencia Estado
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O choque provocado pelos atentados de 11 de setembro contra Nova York e Washington, mais surpreendente do que o ataque a Pearl Harbor que levou os EUA a entrarem na Segunda Guerra mundial, foi também um duro revés para a América Latina, que passou do primeiro ao último lugar na agenda da administração Bush. Desde que assumiu o poder, o presidente George W. Bush melhorou as já ótimas relações com seus estreitos sócios no tratado comercial para a América do Norte (Nafta, em inglês), e de modo especial com o México, com cujo presidente, Vicente Fox, teve o primeiro encontro entre chefes de Estado de seu mandato. Esperava-se então que os EUA superassem definitivamente com o México numerosos assuntos pendentes, como a concessão definitiva da permissão de trânsito para os caminhões mexicanos em rodovias americanas, segundo prevê o Nafta. Além disso, esperava-se um acordo de permanência transitória para cerca de 3 milhões de mexicanos que residem ilegalmente nos EUA, talvez o principal tema da agenda de ambos os mandatários. E, em terceiro lugar, aguardava-se por um tratamento mais humano par as dezenas de milhares de imigrantes que a cada ano cruzam a fronteira sul dos EUA, em busca de trabalho e melhores condições de vida, e muitos deles terminam baleados pelas Patrulhas de Fronteira ou abandonados em zonas desérticas, à mercê do frio e do calor excessivos. Por isso, não surpreendeu o revés sofrido pelo presidente Bush, quando seu colega Fox cancelou poucos dias antes uma visita de Estado à fazenda no Texas do chefe da Casa Branca, em conseqüência da execução de um mexicano ao qual se haviam negado garantias consulares. Mas o aspecto comercial e econômico das relações dos EUA com a região é, para os analistas econômicos, o mais afetado. Desde o fim da Guerra Fria até 11 de setembro de 2001, a política externa dos EUA foi orientada quase exclusivamente para o comércio e os negócios. A meta estabelecida foi a abertura das fronteiras para o livre fluxo de pessoas, mercadorias e capitais, para o benefício das empresas americanas e a economia subjacente, e o exemplo mais patente disto foi constituído precisamente pelo Nafta. Foi na Cúpula das Américas no Canadá, em abril de 2001, que se lançaram os fundamentos para a formalização da projetada Área de Livre Comércio para as Américas (Alca), proposta na precedente Cúpula de Miami, em 1994. Mas em 11 de setembro os atentados que deixaram quase 3.000 mortos em Nova York, Washington e na Pensilvânia, transformaram essa política, fazendo da geopolítica uma prioridade. E a relação da Casa Branca com seus vizinhos e aliados melhorou notavelmente só nos aspectos de proteção sem precedentes das fronteiras americanas contra o terrorismo, mesmo quando as mesmas continuam sendo não tão seguras. Para Philip Anderson, um especialista em segurança interna do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais, "estamos muito longe de estarmos seguros". Em sua opinião, "também se distanciaram os pontos de vista em comum que haviam sido alcançados com canadenses e mexicanos tanto em assuntos comerciais como em assuntos geopolíticos internacionais, apesar da estreita colaboração para evitar as ameaças terroristas". Para analistas bancários, talvez o primeiro país que sentiu o novo curso econômico da administração Bush foi a Argentina, à qual em outubro foi enviado o primeiro sinal de que não iria receber um novo e decisivo empréstimo do Fundo Monetário Internacional (FMI). Um mês e meio depois, o governo de Buenos Aires caiu e anunciou o calote de sua pesada dívida de US$ 145 bilhões. E as ajudas e assistências financeiras tardias também envolveram países como Uruguai e Brasil. Este último país conseguiu um grande empréstimo financeiro de US$ 30 bilhões apenas quando o nervosismo pela turbulência da crise chegou a afetar o México. Há dois meses, o Congresso americano concedeu finalmente - e com ressalvas - o fast-track (via rápida) para que Bush negocie acordos de livre comércio com seus sócios da América Latina. Mas o novo curso imprimido a seu governo e a nova crise de confiança na liderança dos EUA abriram uma grande brecha que só o tempo e as políticas dirão quando e como se pode estreitar.

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