Canal de TV persa da BBC enfrenta restrições na cobertura da crise no Irã

Funcionários da BBC Persian também lidam com preocupação com familiares e amigos no país.

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Por BBC Brasil
Atualização:

Apenas cinco meses depois do lançamento do serviço de televisão persa da BBC (BBC Persian), aconteceram as eleições presidenciais no Irã, no último dia 12 de junho, que foram seguidas de protestos, violência e restrições ao trabalho da imprensa estrangeira no país. Desde então, a equipe da BBC Persian, formada em sua maioria por jovens iranianos que foram para a Grã-Bretanha para inaugurá-la, está trabalhando em turnos dobrados, a fim de produzir uma programação extra sobre os acontecimentos no Irã em um momento em que as informações estão cada vez mais difíceis de serem obtidas. Este trabalho está sendo feito com o peso extra da preocupação com amigos e familiares que estão no Irã. "Está sendo muito difícil para todos nós. É a nossa casa, nossas ruas, as pessoas com quem crescemos, os lugares onde brincávamos", diz Rana Rahimpour, uma repórter de 26 anos. Contribuições Nos dias que se seguiram às eleições de 12 de junho, a BBC Persian – que transmite notícias em farsi, mas já havia sido proibida de trabalhar no Irã – começou a sofrer interferências em seu sinal, o que forçou o canal a utilizar dois novos satélites para tentar driblar o bloqueio. Com a crise política no país, as imagens e vídeos enviados por agências de notícias se tornaram cada vez mais escassos, o que fez com que o canal tivesse que contar em grande parte com o material enviado por telespectadores e internautas. "O conteúdo gerado por usuários tornou-se, repentinamente, a principal fonte de informação", diz Sina Moutalebi, responsável por preparar os boletins de notícias do canal com o material enviado. Moutalebi afirma que, há alguns meses, o canal já estava estimulando os telespectadores a enviarem vídeos. "De repente, eles começaram a nos mostrar vídeos sobre os confrontos e as manifestações", diz. O material enviado inclui desde simples filmagens de manifestações ou atos até vídeos mais elaborados, como a entrevista com um proeminente crítico do regime, gravada com um telefone celular durante uma manifestação na semana passada. Com isso, todo material enviado passou a requerer cuidado redobrado - incluindo a comparação de imagens de um mesmo evento tiradas de vários ângulos diferentes. O fluxo de contribuições pelos usuários e a cobertura da crise como um todo deram um novo estímulo à BBC Persian. Embora a meta de 8 milhões de espectadores tenha sido traçada somente para 2011, a emissora acredita que já teve milhões de telespectadores até agora. Foram mais de 10 mil e-mails recebidos em um único dia e aproximadamente 3 milhões de cliques no website da BBC Persian no último sábado – dia em que pelo menos dez pessoas morreram durante protestos "Advogado do diabo" Pooneh Ghoddoosi, apresentadora de um programa interativo na emissora, afirma que está cada vez mais perigoso para as pessoas no Irã falarem com a BBC Persian para contarem suas histórias. "Mas, surpreendentemente, isso não as impediu de falar conosco", diz. Com as contribuições dos usuários, seguir os padrões de imparcialidade da BBC tem sido um desafio. Ghoddoosi conta que, antes das eleições, o programa recebia um número significativo de ligações de pessoas que se diziam partidários da oposição, mas que começavam a enaltecer Ahmadinejad assim que entravam no ar. Depois que Ahmadinejad foi declarado vitorioso, no entanto, seus partidários pararam de fazer ligações, apesar dos apelos de Ghoddoosi para que eles também contribuam. Outro apresentador, Enayat Faim, que mediava semanalmente debates políticos antes das eleições e passou a apresentar o programa diariamente, afirma que se sente atuando como "um advogado do diabo" ao debater com convidados partidários da oposição. Críticas Ao contrário das acusações do governo iraniano sobre as atividades da mídia estrangeira no país, o chefe da BBC Persian, Rob Beynon, afirma que o canal seguiu as práticas e padrões da empresa e noticiou as informações de uma maneira imparcial. Beynon também afirma que a equipe enfrentou um grande desafio ao noticiar a crise política do Irã, sempre com a atenção de deixar opiniões e preocupações pessoais de lado. "Estamos sendo muito cuidadosos para não cair na armadilha de nos tornarmos uma TV de oposição. Em nenhum momento nós dissemos que 'estas eleições foram manipuladas'. Nós estamos sendo tão moderados a ponto de sermos criticados por todos os lados", diz. Perigo A jornalista Rana Rahimpour afirma que não há notícias de que familiares de jornalistas da BBC Persian tenham sofrido qualquer tipo de represália no Irã, embora às vezes seja difícil fazer contato por telefone ou e-mail. "Tudo é possível, mas eu tento não pensar sobre isso", diz. "Embora meus pais apoiem completamente o fato de eu estar aqui, não quero colocá-los em problemas ou riscos por causa de minha decisão". Antes das eleições, alguns funcionários da BBC Persian haviam marcado viagens para o Irã, que tiveram de ser canceladas. "De repente, eles perceberam que pode ser perigoso voltar para o Irã", diz Sina Moutalebi, que foi preso por autoridades iranianas em 2003 por causa do conteúdo de seu blog e chegou a passar 23 dias em confinamento solitário. "Eles não sabem quando poderão rever suas famílias, mesmo assim, você tem que vir trabalhar às 7h da manhã e ser o mais objetivo possível", diz. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. 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