Casal Kirchner perde base de apoio

Em 16 meses, Cristina deixou escapar a maioria no Congresso, brigou com ruralistas e irritou a classe média

PUBLICIDADE

Por Ariel Palacios
Atualização:

A presidente da Argentina, Cristina Kirchner, conseguiu uma proeza em 16 meses de mandato: destruir a maior base parlamentar governista no país em mais de meio século. Ao tomar posse, em dezembro de 2007, ela tinha o apoio de 161 dos 257 deputados da Câmara. No Senado, tinha respaldo de 47 dos 72 senadores, além de 19 dos 24 governadores. A hegemonia, batizada de "hiper-presidencialismo", não existe mais. Atualmente, Cristina não tem mais maioria na Câmara - conta apenas com 111 parlamentares fiéis, além de outros 18 deputados pouco confiáveis. No Senado, empata com a oposição. Ali o voto de minerva depende do presidente da casa, o vice-presidente Julio Cobos, que no ano passado rebelou-se contra o governo. Entre os governadores, apenas 12 continuam kirchneristas. O único consolo do governo é que a oposição está dividida. Ao longo do último ano, Cristina radicalizou o discurso e bateu de frente com o setor agropecuário - motor da economia argentina. O primeiro confronto ocorreu quando ela baixou o chamado "impostaço agrário", um pacote de impostos de exportações de produtos agrícolas, que acabou sendo derrubado no Senado. Depois, ela decidiu restringir as exportações de carne e laticínios para conter o desabastecimento do mercado interno. CRÍTICAS O aumento da inflação e o surgimento de escândalos de corrupção envolvendo integrantes do governo levaram Cristina a perder o apoio estratégico da classe média, que ressuscitou os famosos panelaços da crise de 2001. De quebra, em vez de buscar o consenso, o casal Kirchner endureceu sua ação política por meio de reestatizações de empresas e de fundos de pensão. De janeiro para cá, a Confederação Geral dos Trabalhadores (CGT), fiel escudeira dos Kirchners desde 2003, começou a exigir participação em ministérios e indicações na lista de candidatos ao Congresso. Com isso, os líderes industriais, que apoiavam o governo em troca de medidas protecionistas, passaram a atacar Cristina. Até a Igreja Católica intensificou as críticas à presidente. REJEIÇÃO A fuga de aliados do casal Kirchners ocorreu de forma simultânea à queda de popularidade da presidente argentina, principalmente nos principais centros urbanos do país. "Cristina tem hoje índice de rejeição de 80% nas três maiores cidades do país, Buenos Aires, Córdoba e Rosário", disse ao Estado Mariel Fornoni, da consultoria Management & Fit. O ex-secretário de Comércio Raúl Ochoa acredita que a eventual derrota do governo nas eleições levará à necessidade de um consenso para poder tomar medidas contra a crise. "Deverá ter início uma economia ?pós-kirchnerista?, não há outra saída", disse Ochoa. "A situação econômica do país é delicada e deverá permanecer assim pelo menos até 2010, ano de pesados pagamentos da dívida pública. Nos últimos cinco anos, a economia caminhou de vento em popa. Agora, a lua de mel acabou."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.