Liu Jin, de 27 anos, é o típico nacionalista com quem o presidente da China pode contar. Ele compartilha online fotos de Xi Jinping em uniforme de camuflagem e o chama de “tio Xi”. Mas Liu ficou desiludido quando ouviu que o Partido Comunista estava mudando a Constituição para permitir que Xi fique indefinidamente no poder. “Discordo”, escreveu Liu no microblog Weibo, citando exemplos de imperadores e autocratas. Censores do governo deletaram imediatamente o post.
Em cinco anos, Xi cultivou uma imagem de homem do povo ponderado e simpático que entra na fila com trabalhadores para comprar buns recheados de carne enquanto conduz a China ao seu destino de crescimento e potência global.
No entanto, sua investida para abolir o limite de mandatos, anunciada domingo, fez renascer medos na sociedade chinesa, que ainda tem na memória o culto à personalidade do fundador da China, Mao Tsé-tung, e o caos que esse culto provocou. Para impedir críticas, censores do Partido Comunista removeram da internet conteúdo considerado subversivo. A limpeza incluiu a proibição de imagens do Ursinho Pooh – às vezes, Xi é comparado ao desenho – e a busca por termos suspeitos, como “meu imperador”, “longa vida” e “insensível”.
Por um momento, até a letra ocidental “N” foi censurada, segundo Victor Mair, professor da Universidade da Pensilvânia, para impedir que cientistas sociais manifestassem matematicamente sua dissidência com a fórmula N >2, na qual “N” significa o número de mandatos de Xi.
A mídia estatal tentou reduzir a importância da mudança na Constituição na esperança de que os chineses não tomassem conhecimento dela. Quando ela ganhou o noticiário, os veículos oficiais disseram que a medida deveria permitir que os líderes continuem no momento em que a China desafia os EUA e ocupa seu lugar no cenário mundial. “A China não pode descansar”, disse o jornal Global Times.
Apesar da censura, têm surgido algumas fissuras na unidade em torno de Xi. Aposentados que sofreram o trauma da Revolução Cultural alertam sobre o retorno da ditadura. Universitários citam o discurso de despedida de George Washington. Executivos aceleram planos para se estabelecer em outros países.
Enquanto alguns comparam Xi a Mao, outros o comparam a Yuan Chikai, um senhor da guerra do início do século 20 que restaurou a monarquia por um curto período, assumindo ele mesmo a coroa. Mas, apesar do descontentamento, analistas dizem que é improvável que algo impeça Xi de ampliar seu poder.
Por um lado, a frustração se limita à elite urbana. Xi continua popular entre camponeses, operários e jovens nacionalistas, que o veem como arquiteto da ascensão da China no século 21. “O fim da limitação de mandato não é ruim se o líder tiver atributos sólidos”, disse um desses jovens apoiadores, Mou Yuxiu, de 19 anos. Muitos veem a obsessão de Mao pelo poder refletida em Xi, que colocou a lealdade ao partido no centro da vida cotidiana. Como Mao, Xi também encheu a sociedade de slogans políticos e usa a propaganda para se apresentar como o líder capaz de guiar a China.
Os críticos dizem que Xi está preparando a volta dos excessos e do fanatismo. “Muitos sofreram sob Mao e estão inquietos”, disse o historiador Zhang Lifan. Outros, porém, são nostálgicos da Revolução Cultural, lembrada como um tempo de grandeza e pureza ideológica. Eles afirmam que centralização é sinal de prosperidade. “Poder centralizado é só uma ferramenta. O que importa é quem o detém”, diz o analista Zhang Hongliang. / TRADUÇÃO DE ROBERTO MUNIZ