PUBLICIDADE

Chávez aumenta cerco a opositores

Venezuela reprime adversários, mas ignora crimes de aliados

Por Ruth Costas
Atualização:

O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, continua gastando horas e horas de seu programa de TV semanal para negar que haja perseguição política na Venezuela, mas, segundo analistas, alguns fatos parecem falar por si. Quase todas as figuras de destaque da oposição e da dissidência estão sendo processadas ou tiveram prisão decretada. No total, 272 políticos estão impedidos de participar de eleições por 15 anos. Desde 2002, mais de 20 opositores e dissidentes ficaram detidos por até seis anos sem que fossem emitidas sentenças sobre seus casos, segundo a ONG Foro Penal Venezuelano. Também foram presos e estão impedidos de deixar o país mais de 200 estudantes que participaram de protestos. Enquanto isso, nenhum chavista de peso está sendo investigado, ainda que as denúncias contra aliados do presidente por corrupção, improbidade administrativa e evasão fiscal sejam tão ou mais numerosas que as dirigidas contra seus rivais. Ou a Venezuela é um caso único no mundo em que as "maçãs podres" só estão num lado do espectro político local, ou a Justiça, o Legislativo e a força pública do país estão usando parâmetros diferentes para lidar com denúncias quando seus alvos são chavistas e opositores. "Chávez está no poder há dez anos. Seus aliados ocupam todos os postos do governo central e a maior parte dos locais - é absurdo pensar que não há casos de corrupção entre eles", disse ao Estado o cientista político Sadio Garavini, da Universidade Central da Venezuela. "Até a família do presidente, no Estado de Barinas, é acusada de enriquecimento ilícito." Para o analista político Herbert Koeneke, da Universidade Simón Bolívar, Chávez está aumentando as ofensivas contra a oposição agora para garantir que não terá problemas políticos nos próximos meses, quando a crise econômica apertar, colocando em xeque sua popularidade. "Com o apoio do Judiciário e da Assembleia Nacional, chavista, ele está tirando de cena opositores que poderiam vencer eleições", diz Koeneke. O cerco contra os rivais começou a se fechar antes das eleições regionais de novembro, quando a Suprema Corte impediu os 272 políticos de se candidatar - 90% deles opositores e boa parte dos outros 10%, dissidentes. A justificativa foi o fato de eles serem "suspeitos" de corrupção ou terem participado do golpe fracassado contra Chávez, em 2002. Entre os que tiveram seus direitos políticos cassados está o ex-prefeito do município de Chacao, Leopoldo López, favorito na disputa pela prefeitura de Caracas - e cotado para as eleições presidenciais de 2012. Também o ex-governador de Yaracuy, Eduardo Lapi, que apesar de ter sido preso acusado de corrupção (ele fugiu da prisão em 2007) tinha mais de 50% das intenções de voto em seu Estado. Mesmo com as impugnações, os críticos de Chávez venceram em cinco Estados que concentram 45% da população e mais de 70% da atividade econômica venezuelana, além de nas duas maiores cidades - Caracas e Maracaibo. Em resposta, Chávez vem tomando medidas para esvaziar o poder de prefeitos e governadores opositores. Nos últimos meses, decretos e leis passaram dos governos locais para o central o controle de portos, aeroportos, hospitais, escolas e outros serviços e instalações públicas. Avançou na Assembleia a tramitação de uma lei criando uma autoridade sobre governadores e prefeitos, designada pelo presidente. E os processos e ameaças de prisão se multiplicaram. Hoje, quatro dos cinco governadores opositores estão sendo investigados. O caso de maior destaque é o do prefeito de Maracaibo, Manuel Rosales, candidato derrotado por Chávez na eleição de 2007. Rosales está sendo processado por suspeita de fraude em licitações quando era governador de Zulia e por não explicar US$ 68 mil em sua declaração de patrimônio. A promotoria pediu sua prisão e um tribunal decidirá no dia 20 se acata o pedido. Ontem, a Justiça congelou seus bens. Os governadores de Táchira, César Pérez Vivas, e o de Carabobo, Henrique Salas Feo, estão sendo investigados pela Assembleia. O governador de Miranda, Henrique Capriles, ficou preso por quatro meses por participar de um ataque à embaixada cubana em 2002 e responde a processo. As investigações também atingem militares, estudantes, empresários e jornalistas. O ex-ministro da Defesa, general Isaías Baduel, foi detido no dia 2 acusado de desviar fundos das Forças Armadas. Baduel rompeu com Chávez em 2007 denunciando sua "ânsia de poder". Acredita-se que suas críticas tenham influenciado o resultado do referendo sobre a reforma Constitucional. "Baduel esteve ao lado de Chávez quando ele tentou um golpe, em 1992, e mais tarde tornou-se seu secretário pessoal", diz Koeneke. "Por isso seu rompimento foi bastante significativo." Na segunda-feira, Carlos Giménez, ex-governador de Yaracuy acusado de corrupção, teve a prisão decretada. Dias antes a Assembleia abriu uma investigação contra o jornalista Teodoro Petkoff, que não teria declarado bens herdados em 1974. Recentemente, nove integrantes da Polícia Metropolitana de Caracas (tradicionalmente ligada à oposição) foram condenados a até 30 anos de prisão por sua atuação em confrontos entre chavistas e opositores, que deixaram 19 mortos em 2002. Em 2003, quatro policiais chavistas foram isentos de responsabilidade sobre as mortes dessa mesma jornada de protestos. A justificativa foi que "dispararam em legítima defesa" e para proteger o governo. Viraram "heróis da revolução".

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.