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Guaidó convoca greve geral e Maduro diz que opositor quer provocar guerra

Autoproclamado presidente interino do país convoca uma ‘greve progressiva’ a partir desta quinta-feira; em discurso a milhares de apoiadores, Maduro comemora ‘derrota’ da oposição e propõe ‘um grande plano de mudança’

Por Pablo Pereira
Atualização:

O autoproclamado presidente interino da Venezuela, Juan Guaidó, reapareceu nesta quarta-feira, 1º, em Caracas durante uma manifestação contra o governo de Nicolás Maduro e convocou uma greve progressiva na administração pública a partir de amanhã. “Amanhãcomeça a ‘Operação Liberdade Sindical’ rumo à greve geral (...) Amanhã vamos acompanhar a proposta de greve escalonada”, disse Guaidó.

O líder opositor Juan Guaidó lidera manifestação em Caracas Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

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Embora o líder opositor não tenha se referido ao fracassado levante de terça-feira, afirmou que continuará convocando protestos até conseguir o fim da “usurpação”, que é a forma como se refere ao mandato de Maduro.

“Esperamos que Bolsonaro nos ajude”, afirmou o engenheiro eletrônico venezuelano, que pediu para ser identificado somente pelo apelido “Chicho”, um dos manifestantes que protestavam hoje na Avenida San Juan de Bosco, altura da Praça Altamira, um dos pontos de reunião de opositores ao governo Maduro. Durante toda a tarde, Chicho e a irmã, dona de lavanderia em Las Mercedes, zona comercial de Caracas, acompanharam a manifestação que foi reprimida com bombas de gás lacrimogêneo, com avanço e recuo de policiais em motos e em carros blindados.

No fim da tarde, Maduro discursou para milhares de apoiadores em evento de comemoração do Dia do Trabalhador em Caracas. Ele acusou a oposição de querer “iniciar uma guerra civil”, e voltou a insinuar que os EUA poderiam ordenar uma invasão militar caso a tensão interna escalasse para um conflito armado.

“Se tivéssemos mandado tanques para enfrentá-los (os manifestantes), o que teria acontecido? Um massacre entre venezuelanos”, afirmou Maduro. “É isso que a oposição quer? Uma guerra civil entre compatriotas?”. Enquanto Maduro discursava, Guaidó usou as redes sociais para responder ao chavista. “O regime covarde trata de demonstrar com repressão um controle que já não tem”, acusou o oposicionista.

Durante o discurso, Maduro convocou os venezuelanos a desenhar “um grande plano de mudança” nos próximos dias 4 e 5. Maduro afirmou que a proposta inclui seu partido, governadores, prefeitos e o Congresso – sem especificar se ele se referia à Assembleia Nacional Constituinte liderada por seu aliado Diosdado Cabello, ou à Assembleia Nacional controlada pela oposição.

Maduro voltou a celebrar o que classificou como “vitória” contra “golpistas” nos confrontos de terça-feira, felicitando seus apoiadores pelo “dia em que a classe operária derrotou novamente um golpe de Estado” dos opositores. “Não puderam com (o falecido líder venezuelano Hugo) Chávez e tampouco puderam conosco”, afirmou Maduro sobre o que disse ser um “complô” da direita para derrubá-lo. “Eles esqueceram que há uma poderosa união cívico-militar que não se enfraqueceu.”

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Para Benigno Alarcón, diretor do Centro de Estudos Políticos da Universidade Católica Andrés Bello, a maior da Venezuela, Maduro está esperando o desgaste de Guaidó. “Essa é uma aposta que o governo sempre fez. Apostar no desgaste do tempo. E desta vez conta a favor dessa estratégia as ameaças feitas pelos EUA caso algo aconteça a Guaidó”. “Por isso, o governo tem evitado tomar medidas como tomou no passado, quando prendeu líderes da oposição.”

Uma mulher de 27 anos, identificada como Jurubith Rausseo, morreu no hospital nesta quarta-feira após ser atingida por um tiro na cabeça durante os protestos em Caracas. Na terça-feira, Samuel Méndez, de 24 anos, morreu no Estado de Aragua com um tiro na coluna e outro no abdomen. Segundo fontes médicas, pelo menos 46 pessoas ficaram feridas nos protestos contra o governo que ocorreram hoje em várias partes do país. Em Caracas, os confrontos começaram quando dezenas de opositores tentaram bloquear uma rodovia e lançaram pedras e coquetéis molotov contra a base aérea, onde um grupo de militares se rebelou na terça-feira contra Maduro.

Na avenida que margeia a Praça Altamira, onde se concentram os protestos, a empresária de lavanderia, que também não quis se identificar, gritava: “Até quando vamos com isso? Isso aqui é perigoso, senhor. Não estamos num país normal”, afirmou ao saber da reportagem para o Estado. “Como disse meu irmão, esperamos que Bolsonaro nos ajude a sair disso. É um absurdo o que estamos vivendo.”

A manifestante disse ainda, durante uma das ondas de correria por causa das bombas de gás e estampidos de tiros, que “não são venezuelanos que estão fazendo esses ataques às pessoas”, e emendou “isso deve ser cubano”, argumentando que “venezuelanos não têm essa índole de atacar o próprio povo”.

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No quarteirão logo abaixo, um grupo de jovens, com os rostos cobertos reunia pedras e coquetéis molotov para investidas periódicas contra o comboio policial que tentava desobstruir a via. Os mascarados comemoravam a cada fogaréu que se erguia dos blindados atingidos. 

Por outro lado, a manifestação pelo Dia do Trabalhador foi até o início da noite, quando teve a presença do presidente Maduro. Desde o início da tarde, carros do governo carregavam gente para a caminhada, que reuniu milhares de populares em desfile “bolivariano” pela larga avenida conhecida na cidade como autopista, que leva ao Centro, sempre defendendo o governo do presidente Nicolás Maduro.

Vigiados de perto por grupos de policiais postados nas principais esquinas da área central com barreiras que lhes garantiam a passagem sem contato com os manifestantes da oposição, passaram pacificamente pelas ruas até o local da concentração. Lá, ouviram discursos contra o “imperialismo” e em defesa da “revolução bolivariana”. E viram Maduro cantar e dançar músicas de mobilização bolivariana com o refrão “Gringo, Go home”, yanque, Go home” (Fora, Gringo, Fora, Ianque). E ser chamado de “el presidente obrero” (o presidente trabalhador).”

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Desde cedo, o movimento no feriado deixou a cidade esvaziada, à espera das manifestações da tarde. No Aeroporto de Maiquetía, o movimento de chegadas e saídas foi tranquilo. “Houve cancelamento de oito vôos”, disse uma fonte do aeroporto. “Principalmente para os EUA, Miami e Nova York, e de lá para Caracas também”, informou.

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino Lopez, disse nesta quarta-feira em Caracas, por meio de redes sociais, que a oposição quer manchar o país de sangue. Ele divulgou imagens da visita que fez ao coronel Alvarez, da Guarda Nacional, que seria um dos 8 militares feridos na onda de protestos na capital desde terça-feira. No vídeo,  Padrino diz que está na UTI do hospital militar em visita o Alvarez, “ferido por arma de fogo”, segundo Padrino.  E, dirigindo-se a Guaidó, questionou: “Este é o resultado das manifestações pacíficas, uma farsa, que você anda praticando”. E perguntou: “Até quando vai a tua impunidade?”.

Invasão. A casa de Leopoldo López foi invadida e roubada nesta quarta-feira por vários homens que testemunhas identificaram como agentes do Serviço Bolivariano de Inteligência Nacional (Sebin), órgão ligado ao chavismo. "Foi o Sebin, o Sebin mau, pois há agentes patriotas que querem a liberdade da Venezuela", disse em entrevista à agência EFE Lilian Tintori, mulher do opositor, pouco depois de entrar no imóvel. A família de López está refugiada na Embaixada da Espanha em Caracas desde terça-feira, quando ele foi libertado por militares e funcionários do Sebin da prisão domiciliar a que estava submetido. Lilian disse que reviraram a casa e jogaram livros, objetos e roupas no chão.

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