O novo secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, conquistou simpatia em Washington esta semana por sua franqueza em relação à guerra no Iraque. Mas os israelenses não gostaram nada de ver o indicado usar a mesma franqueza para dizer aquilo que os governos norte-americanos sempre evitaram: que Israel possui o único arsenal nuclear do Oriente Médio. Há que se admitir, porém, que a afirmação foi bastante indireta. Durante a audiência de confirmação de Gates no Senado, na terça-feira, ele falou dos motivos pelos quais o Irã pode estar buscando uma bomba atômica: "Eles estão cercados por potências com armas nucleares: o Paquistão ao leste, os russos ao norte, os israelenses a oeste e nós no golfo Pérsico". A declaração foi destacada no noticiário israelense, já que Israel adota a política de não confirmar e nem negar que possui armas nucleares. A rádio estatal afirmou que Gates pode ter infringido a política norte-americana do "não pergunte, não conte", que remonta ao fim dos anos 1960. "É inédito", disse um diplomata israelense aposentado à Reuters nesta quinta-feira, quando questionado sobre o depoimento de Gates. "Só posso imaginar que ele ainda não conhece bem os entendimentos que existem entre nós e os americanos". De acordo com documentos secretos recentemente mencionados pela revista Bulletin of the Atomic Scientists, durante o governo do presidente Richard Nixon os Estados Unidos sabiam que Israel tinha desenvolvido armas nucleares, mas preferiu não pressionar o aliado a esclarecer o que possuía e aceitar as normas internacionais. Israel alega que sua "ambigüidade estratégica" afasta inimigos numericamente superiores sem provocar uma corrida armamentista. Essa postura provoca profunda irritação nos árabes e no Irã, que alegam que os Estados Unidos usam dois pesos e duas medidas na região. Ao não declarar publicamente que possui armas nucleares, Israel também dribla a proibição norte-americana ao financiamento de países que tenham armas de destruição em massa. Assim, o Estado judaico pode receber a verba anual de mais de US$ 2 bilhões de Washington em ajuda militar. Embora Gates tenha sido indicado também para tentar revitalizar as perspectivas de paz em geral no Oriente Médio, ninguém chegou a propor que os EUA mudem sua política em relação à ambigüidade israelense. "Não sei de nenhuma mudança na política norte-americana para discutir Israel e sua capacidade nuclear", disse Stewart Tuttle, porta-voz da embaixada dos EUA em Tel Aviv. Shimon Peres, que ajudou a construir o principal reator atômico de Israel nos anos 1950, oficialmente para uso civil, e hoje é vice-primeiro-ministro, não parecia preocupado. "Esse anúncio não faz nenhuma diferença fundamental", disse ele à Rádio Israel. "Tenha ou não armas nucleares, o fato é que Israel é o único país ameaçado de destruição ... Israel não está ameaçando nenhum país. As armas não disparam sozinhas, elas são acionadas por pessoas", disse.