Coalizão contra terrorismo preocupa países árabes

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Por Agencia Estado
Atualização:

A determinação da administração Bush em formar uma coalizão internacional para lutar contra o terrorismo preocupa, neste momento, diversos Estados árabes, inclusive os que mantêm as mais estreitas relações com Washington. Esses países se opõem indiscutivelmente, é claro, ao terrorismo e, aliás, alguns deles, tais como o Egito e a Arábia Saudita foram alvo de atentados ou de graves manobras subversivas nos últimos anos. População civil Mas os dirigentes árabes hesitam em dar sua garantia antecipadamente (e hesitam, ainda mais, em se associar materialmente) a uma ampla ação militar, que correria um grande risco de ter como saldo inúmeras vítimas civis entre populações muçulmanas ? afegãs e outras ? sem necessariamente atingir seu objetivo declarado: ou seja, a eliminação do inapreensível Osama bin Laden, cabeça do terrorismo fundamentalista e suposto autor dos terríveis atentados do poder militar e financeiro dos Estados Unidos. Na verdade, essa hecatombe não poderia deixar de suscitar ebulições internas, talvez incontroláveis, no mundo árabe-muçulmano, dentro do qual o tio Sam já é bem impopular, devido ao apoio praticamente incondicional que dá a Israel, apesar da regra de imparcialidade (mesmo relativa) que lhe deveria exigir o fato de estar na qualidade de patrono do processo de paz do Oriente Médio. Duplo temor A essa crítica à qual se subscrevem, é útil salientar mais uma vez, até mesmo os mais moderados e mais pró-ocidentais dos árabes, somam-se outras que, aliás, se encontram nas mais variadas regiões do planeta: a globalização, entendida como um pretexto para a hegemonia da economia americana, uma política ambiental considerada egoísta, o apoio de Washington a regimes corruptos e muito pouco respeito aos direitos do homem etc. Logo após cometidos os atentados em Nova York e em Washington, os governos árabes foram tomados por um duplo temor: O primeiro era o de um amálgama entre terrorismo e islamismo, que se manifestaria, no Ocidente, por uma assimilação de todo o mundo árabe-muçulmano ao campo da ?barbárie? que se prepara para combater o ?mundo civilizado?. Inúmeros atos de agressão individual já foram assinalados em diversos países ocidentais, e só podemos nos alegrar com os esforços desenvolvidos pela administração americana para frear esse fenômeno de discriminação racista e religiosa, principalmente a visita que o presidente Bush fez, segunda-feira, ao centro islâmico de Washington. Em compensação, é deplorável que o chefe do Executivo americano tenha falado, na véspera, de uma ?cruzada? contra o terrorismo, termo que lembra, bem inoportunamente, as expedições cristãs da Idade Média contra os árabes. O segundo temor dos árabes foi o de ver Ariel Sharon explorar em benefício próprio o golpe dado nos Estados Unidos e tentar impor, impunemente, novos e graves fatos consumados à área. Ataques aos palestinos Na verdade, durante os poucos dias que se seguiram à tragédia americana, o exército israelense lançou violentos ataques contra os palestinos, enquanto as preocupações internacionais estavam voltadas para outros lugares, e Sharon desmarcou um encontro previsto entre seu ministro das Relações Exteriores, Shimon Peres e Yasser Arafat. No entanto, ao dar ?ordens estritas? de cessar-fogo a serem respeitadas por seu povo, o chefe da Autoridade Autônoma parece ter conseguido parar a engrenagem, já que, por sua vez, Sharon só poderia ordenar, sem dúvida a contragosto, a suspensão das operações militares. É verdade que o próprio Arafat, diante de uma poderosa máquina militar israelense girando a pleno vapor na mais completa indiferença internacional , não tinha outra escolha senão a de renunciar rapidamente às condições que impôs, há um ano, à instauração desse cessar-fogo. Exemplo Ao mesmo tempo, o líder palestino acaba de mostrar que aprendeu muito bem a lição da guerra do Golfo, durante a qual, apoiou-se imprudentemente no Iraque de Saddam Hussein. Arriscando-se a provocar a cólera de inúmeros palestinos, que se alegraram com a afronta sangrenta infligida pelo terrorismo à América, Arafat pôs ?todas as suas forças? à disposição dos Estados Unidos. A contribuição palestina não terá muito peso, sem dúvida, em termos de equilíbrio das forças militares, mas é revestida de uma importância política capital, no sentido de que o alinhamento do defensor da causa sagrada dos árabes (a Palestina) a Washington simplesmente poderá encorajar um grande número de países árabes a vencerem suas reticências e a se juntarem, por sua vez, à coalizão internacional. Árabes aconselham prudência e moderação Até o momento, esses mesmos países não se privam de preconizar a prudência e a moderação aos dirigentes americanos. ?Se um país é atacado por causa de um indivíduo, matam-se inocentes?, advertiu na CNN o presidente do Egito, Husni Moubarak, que escapou há poucos anos, em Addis-Abeba, de uma tentativa de assassinato financiada por Bin Laden. Em um estilo ainda mais direto, o rei Abdallah, da Jordânia, afirmou a George Bush, pelo telefone, que os atentados da semana passada não teriam acontecido se os Estados Unidos tivessem acabado com a crise do Oriente Médio. Exigência Aliás, esse mesmo argumento, essa mesma exigência de um sério esforço americano visando a colocar nos trilhos o processo de paz foram retomados em coro pelos reinos do Golfo que, proclamando ao mesmo tempo sua solidariedade com Washington, lembraram-lhes com insistência suas obrigações de garantir a paz entre os árabes e Israel. De qualquer maneira, os árabes não poderiam se esquecer de que, quando foi o caso de guerrear ao lado dos ocidentais contra um dos seus, o Iraque, eles exigiram ? e conseguiram ? uma iniciativa de George Bush pai visando a estabelecer a paz no Oriente Médio. Terão direito, desta vez, a um engajamento semelhante de Bush filho? E chegarão, como querem os árabes, a fazer uma distinção entre ?organizações palestinas? e movimentos de libertação?? Essas questões têm uma gravidade particular para um país como a Síria, que condenou firmemente os atentados do dia 11 de setembro, mas que continua a figurar na lista negra dos países que apóiam o terrorismo porque dá uma ajuda logística ao Hezbollah libanês e porque abriga em sua capital, Damasco, várias organizações radicais palestinas. A verdade é que, ao lembrar publicamente na terça-feira que ?há, no Líbano, organizações que figuram na lista americana?, o embaixador dos Estados Unidos em Beirute, Vicent Battle, parece ter confirmado a vontade de seu país, proclamada na última semana pelo secretário de Estado, Colin Powell, de conduzir ?uma ofensiva global? contra o terrorismo, uma vez que com isso se acabaria com Bin Laden. O diplomata americano acaba de remeter ao Ministério das Relações Exteriores libanês um memorando de seu governo exigindo não só a repreensão dessas organizações, mas também o julgamento e a extradição de culpados de atentados antiamericanos durante a década de 1980.

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