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Colômbia, o 'aliado mais próximo' dos EUA, se volta para a China

Um aguardado aumento do investimento chinês no país deverá aproximar Bogotá ainda mais de Pequim

Por Luis Fernando Mejia e Americas Quarterly
Atualização:

BOGOTÁ – Muito se falou nos 20 anos recentes a respeito de algo que continua verdadeiro: a Colômbia é um dos mais próximos aliados e parceiros estratégicos dos Estados Unidos na América Latina.

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Décadas de apoio bipartidário dos EUA resultaram em bilhões de dólares investidos no país latino-americano por meio de vários programas, incluindo o Plano Colômbia, assim como iniciativas mais recentes que deram apoio à implementação do acordo de paz com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc) e ajudaram Bogotá a lidar com quase 1,8 milhão de migrantes venezuelanos que vivem no território colombiano.

Os EUA são também o principal parceiro comercial e de investimento da Colômbia, o que é impulsionado por acessos preferenciais garantidos pelo acordo de livre-comércio firmado por EUA e Colômbia em 2012. O valor combinado das exportações e importações de mercadorias entre os dois países registrou uma média de US$ 27,6 bilhões anualmente ao logo da década recente.

Em imagem de 2012, o então embaixador da China para a Colômbia, Wang Xiaoyuan, concede entrevista em Bogotá; relações se estreitaram na última década Foto: Jose Miguel Gomez/Reuters

Dez anos atrás, as coisas eram completamente diferentes em relação à China, a principal rival dos americanos enquanto potência global. A Colômbia exportou em média meros US$ 500 milhões anualmente para a China durante a primeira década do século 21, enquanto importava cerca de US$ 2,3 bilhões. A China foi o 37.º destino mais importante para as exportações colombianas no ano 2000.

Mas esses números mudaram em ritmo acelerado ao longo da década recente. Atualmente, a China passou a ser o segundo maior parceiro comercial da Colômbia, com exportações médias anuais entre 2011 e 2020 (US$ 3,4 bilhões ao ano) quase sete vezes maiores do que na década anterior. Importações na casa dos US$ 9,9 bilhões, enquanto isso, representam agora quase um quarto do total das importações na Colômbia.

A crescente importância dos laços comerciais entre Colômbia e China foi particularmente valiosa durante a pandemia de covid-19. Apesar de a Colômbia ter sido a maior beneficiária das doações de vacinas dos EUA, recebendo 6 milhões das 38 milhões de doses doadas pelo governo americano, a chegada adiantada das vacinas Sinovac em fevereiro e março “salvaram o dia”, ao evitar milhares de mortes de idosos. De fato, no fim de março, das 3,5 milhões de doses que a Colômbia havia recebido, 2,5 milhões tinham vindo da China. Neste sentido, a diplomacia americana das vacinas en relação à Colômbia foi generosa, mas a China apareceu quando foi mais importante.

Em termos de investimento, a presença da China na Colômbia tem sido relativamente baixa, especialmente em comparação a vizinhos como Equador e Venezuela. O maior investimento da China na Colômbia ocorreu no ano passado, registrando US$ 64 milhões, que representam menos de 1% do total líquido de investimento estrangeiro direto no país. Mas aqui também as coisa parecem propensas a mudar rapidamente.

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Empresas chinesas firmaram contratos de mais de US$ 6 bilhões em investimentos, que incluem a construção da primeira linha de metrô em Bogotá, o maior projeto de infraestrutura do país nos próximos anos, assim como a construção de uma linha de trem de superfície que atenderá a região metropolitana da capital colombiana. Também há investimentos nos setores de mineração e energia com prospecto de aumento nos próximos anos.

O dilema sino-americano

Essas tendências agora ameaçam colocar a Colômbia, assim como muitos outros países latino-americanos, numa posição desconfortável. Dada a recente deterioração nas relações sino-americanas e suas implicações na geopolítica global, muitos estão se perguntando: a Colômbia deveria fortalecer ainda mais seus laços com os EUA ou seguir acelerando a integração comercial e de investimento com a China?

Exceto no contexto de um confronto militar em plena escala, que forçaria a Colômbia a “escolher o lado”, o país deveria continuar a fazendo ambas as coisas. Os EUA foram e continuarão a ser um forte parceiro e agirão estrategicamente para contrabalançar a crescente influência da China na região. Neste sentido, os EUA protagonizaram recentemente o lançamento da iniciativa Build Back Better World, para ajudar a pôr fim em um lapso de investimento de US$ 40 trilhões nos países em desenvolvimento, destinado diretamente para rivalizar com a Iniciativa Cinturão e Rota, da China, adotada a partir de 2013. A Colômbia deveria explorar prontamente essa oportunidade e garantir fundos para investimentos em infraestrutura, meio ambiente, saúde e tecnologia, entre outros setores.

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Em relação à China, a Colômbia deveria seguir o exemplo de alguns países da região, como Chile e Peru, e avaliar a possibilidade de se juntar à Inciativa Cinturão e Rota. Da mesma maneira, seguindo o exemplo de poderosos aliados dos EUA, como Austrália e Reino Unido, a Colômbia deveria considerar seriamente acessar o Banco Asiático de Investimento em Infraestrutura, um banco de desenvolvimento multilateral de US$ 100 bilhões, liderado pela China, que também poderia fornecer capital barato para diminuir lapsos de investimento em infraestrutura e desenvolvimento sustentável.

Apesar desses movimentos serem capazes de deixar algumas autoridades do governo americano apreensivas, a disponibilidade limitada de financiamentos baratos, especialmente em um mundo de taxas de juros mais altas, em que países ricos estão aposentando os estímulos de política monetária, vira um bom argumento para aumentar e diversificar futuras fontes de financiamento.

As coisas são um pouco mais complicadas em relação ao comércio. No lado das exportações, ainda há ganhos a serem obtidos, já que as exportações para a China (US$ 2,8 bilhões em 2020) representam menos de um terço do que as exportações para os EUA (US$ 8,9 bilhões). No lado das importações, porém, os números são praticamente os mesmos (US$ 10,5 bilhões em 2020).

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Uma preocupação é que a China ainda não atingiu o status de economia de mercado segundo a Organização Mundial do Comércio. Uma coisa é aprofundar a competição em mercados domésticos, outra coisa completamente diferente é fazer isso com preços subsidiados pelo governo contra os quais os produtores locais são incapazes de competir. A Colombia deveria, então, monitorar cuidadosamente suas importações da China, fortalecendo instituições que atuam segundo regras comerciais e agindo prontamente para proteger produtores locais de práticas desleais de comércio.

O que o futuro reserva…

Ainda é cedo demais para dizer se a China se juntará ou não aos EUA no panorama global enquanto segunda superpotência mundial. As eleições na Colômbia em 2022 também levantam o prospecto de uma mudança na política externa do país, caso alguma figura antiestablishment vença. O que é certo, porém, é a extensão da crescente influência econômica, tecnológica e política da China no mundo, assim como na América Latina.

O novo governo terá de equilibrar cuidadosamente sua abordagem entre ambos os países, intensificando sua relação com os EUA, seu mais importante aliado, mas ao mesmo tempo colhendo os benefícios de laços comerciais e de investimento, num cenário de orientação mercadológica, com um país como a China, que graças à magnitude de seu próprio crescimento e de sua classe média constitui uma imensa oportunidade para a Colômbia.

Mejía é diretor-executivo da Fedesarrollo. Ele foi vice-ministro de ministro do Planejamento na Colômbia entre 2014 e 2018, liderando o ministério na implementação de uma agenda de metas em desenvolvimento sustentável. Ele também ocupou o posto de diretor de políticas macroeconômicas do Ministério das Finanças colombiano e atuou como pesquisador no Banco Central do país e no Banco Interamericano de Desenvolvimento, em Washington. Siga-o no Twitter @LuisFerMejia