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Como o México pode reagir a Trump

Renegociação do Nafta será campo vital para governo mexicano tentar manter a estabilidade do país diante do novo líder americano

Por Eduardo Porter
Atualização:

De que maneira o México poderia infligir danos maiores aos EUA? Em tempos normais, essa pergunta não estaria em primeiro lugar na lista das preocupações dos estrategistas políticos mexicanos. Mas estes não são tempos normais. Enquanto o presidente Trump prepara a jogada de abertura de seu plano para renegociar o Tratado de Livre-Comércio para a América do Norte (Nafta) ou abandoná-lo, o objetivo mais estratégico para os mexicanos está se reduzindo a uma única palavra: dissuasão.

O México precisa convencer Trump de que, se ele destruir o acordo no qual os mexicanos depositaram suas esperanças de desenvolvimento, ligando sua economia de maneira ainda mais forte à dos EUA, os americanos também sofrerão. A pergunta crucial é se a ameaça conseguirá convencer. Seu principal desafio ao se confrontar com um governo hostil como o de Trump é a assimetria das relações. O fim do Nafta afetaria os EUA. Seis milhões de empregos americanos dependem das exportações para o México, segundo as autoridades mexicanas. Mas para o México, seria devastador.

Trump visita o Departamento de Segurança INterna em Washington Foto: AP Photo/Pablo Martinez Monsivais

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Os elementos da estratégia mexicana começaram a ser notados na segunda-feira, quando o presidente Enrique Peña Nieto declarou que as negociações sobre um relacionamento futuro com os EUA não se limitariam ao comércio. “Nós levaremos para a mesa de conversações todos os temas”, afirmou o presidente.

Sua esperança é que trazendo uma maior incerteza às relações bilaterais - dúvidas sobre a cooperação na luta contra o narcotráfico ou sobre impedir terroristas estrangeiros de usar o país como escala para os EUA - o México pode elevar as apostas o bastante para Trump reconsiderar a estratégia “America first” na área do comércio.

A visão do governo mexicano não é uniformemente sombria. Alguns analistas acreditam que existe potencial para uma situação em que um novo Nafta beneficiaria a todos. A convicção da existência de um aspecto positivo na hostilidade de Trump em relação ao Nafta também é popular em alguns círculos de Washington. De qualquer maneira, o acordo selado há 25 anos precisa de alguma atualização.

Muitos aspectos do Nafta poderiam ser incrementados, segundo especialistas da área de comércio, como, por exemplo, novas regras para a abertura de projetos governamentais aos candidatos dos três parceiros do acordo; permitir o ingresso das empresas de transportes internacionais do México e dos EUA nos respectivos mercados tornaria mais eficiente o comércio. 

É difícil, no entanto, conciliar a proposta de um pacto comercial mais eficiente, melhorado, na América do Norte com o quadro que Trump costuma pintar do comércio como um jogo de soma zero que inevitavelmente prejudica os EUA. Para ele, melhorar o Nafta parece ter como foco eliminar o excedente comercial do México e limitar investimentos de multinacionais americanas no país vizinho. Mas não se pode eliminar imediatamente um superávit de US$ 60 bilhões com um novo Nafta - a não ser que se estabeleça limites draconianos às importações que possam ser tão prejudiciais para o México quanto o fim do pacto.

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Muitos mexicanos temem que seja precisamente esse tipo de mudança draconiana que Trump tem em mente. Seria um sinal de intransigência endereçado à China - o concorrente que é o próximo na lista de Trump. Se o Canadá permanecer fora da briga, concluindo um acordo em separado com os EUA substituindo o Nafta, o México ficará sozinho numa batalha existencial por seu futuro. Nesse caso, ele talvez não tenha outra escolha senão aumentar as apostas e esperar até chegar à mesa de negociações com uma ameaça pelo menos tão crível quanto a promessa de Trump de sair do acordo.

É uma estratégia enormemente arriscada. Quando Trump entrou na corrida presidencial, o dólar valia cerca de 15 pesos mexicanos. Agora, vale 22. Um embate frontal com os EUA poderia elevá-lo a 40, temem as autoridades, alimentando uma fuga de capitais. A situação mais nefasta será os EUA exagerarem nas pressões fazendo com que o México - sua economia, seu governo impopular, sua ordem pública e estabilidade política - entre em colapso. / TRADUÇÃO DE ANNA CAPOVILLA

É COLUNISTA