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Congresso equatoriano é suspenso

Em sua primeira medida, Assembléia Constituinte pró-Correa determina paralisação do Legislativo por 6 meses

Por Renata Miranda
Atualização:

O presidente equatoriano, Rafael Correa, inaugurou ontem oficialmente a Assembléia Constituinte, um dia depois do fórum constitucional ter decidido suspender os trabalhos do Congresso. A Constituinte assumirá as funções legislativas até que os resultados do referendo sobre a aprovação da nova Carta do país - marcado para o ano que vem - sejam divulgados. Correa assegurou que chegou a hora de "ajustar as contas com a história". Investida de seus "plenos poderes", a Constituinte assumiu as atribuições e deveres do Congresso e decidiu que durante o recesso do órgão, que deve durar até agosto de 2008, os deputados não terão imunidade judicial nem nenhum tipo de remuneração. O partido de Correa não tem nenhum deputado no Congresso em razão do boicote à eleição legislativa do ano passado. Antecipando-se à decisão da Constituinte, o Congresso havia declarado na quarta-feira que entraria em recesso por um mês. A decisão do fórum constitucional intensificou a discussão no país sobre o alcance dos plenos poderes. Para o cientista político Simón Pachano, da Faculdade Latino-americana de Ciências Sociais (Flacso) do Equador, a atitude da Constituinte pode ser interpretada como um golpe de Estado. "O decreto de recesso não tem validade legal porque não está contemplado no estatuto convocatório da Constituinte", disse Pachano, por telefone, ao Estado. Segundo ele, o maior problema em relação aos plenos poderes foi a Constituinte ter eliminado, na prática, a vigência da Constituição no país. "Agora não há ordem constitucional e, por isso, não há vigência das garantias individuais." A socióloga Sofia Castellanos, assistente do Programa de Governabilidade e Gerência Política da Pontifícia Universidade Católica (PUC) do Equador descarta a tese de golpe de Estado, mas lembra que o governo será beneficiado na nova Carta por ter 80 das 130 cadeiras da Constituinte. "A vantagem para Correa é que, por possuir maioria, as decisões tomadas da Assembléia podem ter tendência governista." Um advogado ligado à coalizão governista Aliança País que não quis se identificar afirmou que a Constituinte tem base legal para assumir qualquer função do Estado. "A coexistência de dois organismos legisladores seria inconveniente para o governo e, por isso, foi decretado o recesso do Congresso", disse. "Essa suspensão serve apenas para evitar a duplicidade de funções." Com o voto de 110 dos 130 constituintes, a Constituinte ratificou sua condição de plenipotenciária em um projeto proposto pelo deputado César Rodríguez, da Aliança País. A medida, que recebeu o nome de Mandato Constituinte nº 1, estabelece que nenhuma autoridade pode descumprir as resoluções da Constituinte, e estabelece punições para quem desobedecer essa norma. Na mesma sessão, a Assembléia ratificou o presidente Rafael Correa no poder. Na quinta-feira, ele havia colocado seu cargo à disposição da Constituinte. Os deputados da Assembléia também decidiram dar por encerrados os mandatos dos chefes do Tribunal de Contas, da Procuradoria do Estado, da Promotoria, da Defensoria Pública e das superintendências de Telecomunicações, Bancos e Companhias. As autoridades da Corte Suprema de Justiça, do Conselho da Judicatura, do Tribunal Constitucional e do Tribunal Supremo Eleitoral continuarão em seus cargos. A socióloga da PUC, em Quito, Natália Sierra acredita que a decisão da Constituinte faz parte de uma estratégia do governo. "O recesso do Legislativo vai permitir ao presidente pôr em prática os projetos que ele quiser", disse Natália. De acordo com Pachano, a condição de plenos poderes da Constituinte é uma manobra de Correa para acumular poderes. "A Assembléia é dominada pelo partido do presidente e será Correa quem mais fará uso dos plenos poderes da Constituinte." Nos últimos dez anos, o Equador viu seu sistema político desmantelar-se em meio a crises que acabaram fazendo com que três presidentes eleitos não conseguissem chegar ao fim do mandato. A bandeira de campanha de Correa, um economista de 44 anos eleito no ano passado, foi a redação de uma nova Constituição para acabar com a corrupção no país. A Constituinte está instalada na cidade de Montecristi, 250 quilômetros ao sudoeste de Quito, e funcionará durante 180 dias - podendo ter seu prazo prorrogado por até 60 dias. Para aprovar os projetos, serão necessários os votos de pelo menos 66 deputados. Essa é a segunda Assembléia Constituinte da história recente do Equador, que modificará a Carta aprovada em 5 de junho de 1998. A nova Constituição será a 20ª do país.

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