Corte chavista trava investigação sobre Odebrecht

Procuradora dissidente denuncia cerco às investigações durante reuniões de representantes de Ministérios Públicos latino-americanos

PUBLICIDADE

Atualização:

CARACAS - A procuradora-geral da Venezuela, a chavista dissidente Luisa Ortega Díaz, acusou ontem o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), alinhado ao chavismo, de impedir a condução das investigações de corrupção do caso Odebrecht. Na terça-feira, o Ministério Público intimou a mulher e a sogra de um ex-ministro chavista a depor sobre irregularidades em obras da empresa no país. 

“Intimamos pessoas sobre o caso da Odebrecht, e o TSJ ditou uma sentença para impedir que o Ministério Público exerça a acusação contra envolvidos no caso”, afirmou Ortega em telefonema à Assembleia Geral Extraordinária da Associação Ibero-americana de Ministérios Públicos (AIAMP), em Buenos Aires. 

Katherine Haringhtontentou, sem sucesso, entrar na sede do Ministério Público para tomar posse do cargo outorgado pela máxima corte, ocupado atualmente por um nome escolhido por Luisa Ortega Díaz (foto) Foto: EFE/Miguel Gutierrez

PUBLICIDADE

A declaração foi dada em resposta à decisão do TSJ que determinou que a procuradoria só pode intimar um acusado mediante a presença de um juiz. Pela lei venezuelana, no entanto, o Ministério Público pode indiciar um suspeito sem autorização judicial. 

A decisão do TSJ foi anunciada horas depois da convocação de María Eugenia Baptista Díaz e Elita Zacarías Díaz, mulher e sogra de Haiman El Trudi, ex-ministro dos Transportes e Planejamento nas gestões de Hugo Chávez e Nicolás Maduro. A audiência estava marcada para o dia 27. 

Troudi disse que o processo contra elas é uma “canalhice”. A procuradoria acredita que os suspeitos cobraram propinas de obras não realizadas. O dinheiro teria sido depositado em paraísos fiscais. 

Ortega não participou do encontro, em que se discutiu a situação do Ministério Público venezuelano, porque a Corte mais elevada do país lhe proibiu de deixar o país, enquanto avalia se ela será julgada por supostamente ter mentido ao afirmar que não aprovou a designação de 33 magistrados, que a funcionária considera ilegítima.

Katherine Harington, nomeada pelo TSJ como vice-procuradora e possível substituta de Ortega, tentou participar ontem da assembleia de procuradores, mas teve o seu acesso negado. Em uma videoconferência, Ortega lembrou que não pôde ir à assembleia porque está proibida de sair do país e denunciou o congelamento de suas contas bancárias. Os procuradores expressaram o seu apoio a sua colega venezuelana e repudiaram a “pretensão de remoção ilegal ou arbitrária” de Ortega.

Publicidade

Segundo Ortega, a ofensiva do TSJ contra a procuradoria é um atentado contra a independência dos Ministérios Públicos da América Latina. Designada pelo TSJ como vice-procuradora-geral e leal ao chavismo, Katherine Harrigton teve a entrada vetada na reunião da AIAMP. Estima-se que ela deve substituir Ortega quando a Justiça tirá-la do cargo. 

A procuradora garantiu que o TSJ bloqueia as ações do Ministério Público desde que, em 31 de março, ela se pronunciou contra sentenças que anularam funções do Legislativo, de maioria opositora. 

Em fevereiro passado, o MP congelou as contas e os ativos da Odebrecht na Venezuela e solicitou o código vermelho da Interpol para um dos envolvidos, sem especificar seu nome.  O ex-presidente da empreiteira Marcelo Odebrecht declarou que a Venezuela é o segundo país em que a empresa mais pagou propinas na América Latina, com US$ 98 milhões de dólares atrás apenas do Brasil.

Ortega rompeu com o chavismo em abril, depois que o TSJ anulou as competências legislativas da Assembleia Nacional, controlada pela oposição. Dias depois, a Corte anulou a decisão, mas ainda assim ela provocou a ira de milhares de venezuelanos, que saíram às ruas contra o governo. 

PUBLICIDADE

Desde então, Ortega tem criticado a repressão aos protestos, nos quais 93 pessoas já morreram, e a Assembleia Constituinte convocada pelo chavismo, que, segundo ela, é uma afronta à herança de Chávez. 

Depois do rompimento da procuradora-geral com o governo, o chavismo tem tentado, por meio do TSJ, limitar seus poderes. Numa outra medida, a Corte concedeu à Defensoria Pública o acesso a investigações em curso pela procuradoria, entre elas as relacionadas ao caso Odebrecht. Entre a cúpula chavista, a oposição mais ferrenha a Ortega vem do vice Tareck El Aissami e do deputado Diosdado Cabello. / AFP

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.