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Cresce impressão de que Hezbollah ganhou a guerra e Líbano perdeu

Resistência do Hezbollah levou o primeiro-ministro de Israel ao desgaste e a problemas políticos internos

Por Agencia Estado
Atualização:

O Governo israelense e a milícia xiita libanesa Hezbollah se consideram vitoriosos após um mês de guerra, mas cresce na região a impressão de que o Hezbollah foi um claro vencedor, com os prejuízos para um perdedor que só pode ser o Líbano. Parece evidente que Israel não pode cantar vitória. O primeiro-ministro israelense, Ehud Olmert, já começa a lutar pela sobrevivência política, diante de um Likud que tenta tomar o poder e um Exército divorciado da classe política. Pode parecer paradoxal ver como vencedor um movimento que viu todas as suas fortificações no sul do Líbano, no Vale do Bekaa e nos bairros do sul de Beirute reduzidos a escombros. Mas, com uma estratégia de guerrilheiros à moda antiga, ele conseguiu enfrentar o Exército mais potente do Oriente Médio, matar 118 militares, destruir um helicóptero e vários carros de combate. Israel volta para casa com a sensação de não ter atingido seus objetivos. Convém não esquecer que a guerra começou para resgatar os dois soldados israelenses capturados pelo Hezbollah em 12 de julho e com o objetivo declarado por parte de Israel de desarmar a milícia da Resistência Islâmica, braço armado do Hezbollah. Nenhum dos dois objetivos foi alcançado. Olmert vende agora como grande vitória o fato de que o Hezbollah será obrigado a ficar a norte do rio Litani, e seu lugar passará a ser ocupado por tropas internacionais e do Exército libanês. Mas enfrenta ceticismo em Israel. Verificar e garantir a retirada vai ser uma tarefa complicada. As milícias não se parecem em nada com um Exército regular. Suas fileiras se infiltram numa sociedade xiita que o Hezbollah domina como uma teia política, religiosa, econômica e cultural. Quem poderá desfazer essa teia? O secretário-geral do Hezbollah, Hassan Nasrallah, apareceu na segunda-feira na televisão para comemorar a "vitória histórica" de seu movimento. Ele deixou bem claro que não é o momento de discutir o desarmamento de suas milícias. Como vem sendo habitual nos últimos discursos, o líder xiita multiplicou os apelos à unidade entre os libaneses. Talvez para enfrentar os temores crescentes de uma cisão na sociedade libanesa, entre os xiitas (40% da população) e o resto do país. O próprio primeiro-ministro, Fouad Siniora, se queixou, e com ele vários de seus ministros, cristãos, drusos e sunitas, de que o Hezbollah se tornou um "Estado dentro do Estado". Em outras palavras, que ficou ingovernável. Uma das razões para isso é que as demais forças políticas são tão heterogêneas e personalistas que não conseguem manter o discurso unitário que chegaram a ter, por um breve período, após o assassinato de Rafik Hariri. Diante da confusão entre sunitas, cristãos e drusos, os xiitas obedecem em bloco às ordens do Hezbollah. E encontram ânimo para subir nos escombros de suas próprias casas com uma foto de Nasrallah e fazer o sinal da vitória. A um povo fiel até a última gota de sangue, o Hezbollah já prometeu reconstruir suas casas e pagar até um ano de aluguel. Mas quem pagará a reconstrução do aeroporto, dos portos, das 73 pontes, dos 630 quilômetros de estradas, das usinas elétricas? É uma imagem chocante a de Nasrallah falando de vitória histórica em meio a uma paisagem de escombros e ruínas. O Hezbollah pode ter vencido, mas o Líbano perdeu.

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