13 de julho de 2014 | 02h00
Imigração sempre houve. A novidade nas Américas é a faixa etária do desterrados: alguns que fogem ainda com dentes de leite na boca. O fenômeno deixa os especialistas perplexos e as autoridades atordoadas.
Embora pequenos, os novos imigrantes já conhecem a lógica do bandido, que se movimenta sempre na sombra, longe do alcance da lei. Aprenderam cedo o duro jogo de colocar seu destino em jogo. Se conseguirem atravessar a fronteira, terão de reinventar a vida entre estranhos. Se forem presos, voltarão para onde fugiram com o rótulo de deportados.
Apenas nos EUA, 52 mil menores vindo clandestinamente da América Central foram detidos no primeiro semestre. A maioria será devolvida ao país de origem. O destino preferido dos refugiados é os EUA, que, apesar do crescimento medíocre da economia e da xenofobia em alta, ainda representam uma oportunidade de vida nova.
Milhares de outros fogem de um país para o outro na própria América Central, desviando da rota consagrada de fuga, que acenava sempre para o norte. O México, mais próspero e estável, virou não apenas fonte de emigrantes, como também destino de imigrantes. O México nunca deportou tantos ilegais como agora.
Ninguém sabe quantos são esses novos imigrantes, pois as fronteiras são porosas e a fiscalização, falha. Mas é difícil entender o que impulsiona essa nova enxurrada de imigração mirim e como fazer para administrá-la.
Miséria, não é. Desde 2000, a América Latina já antecipou várias das metas do milênio das Nações Unidas para vencer a pobreza até 2015. A região cortou pela metade o número de famintos, a pobreza extrema e a parcela da população sem acesso à água potável e ao saneamento básico.
Em outras áreas - grau de favelização e frequência escolar, entre elas - a região ainda deixa a desejar. Mas, como um todo, a região melhorou. E mesmo onde houve pouco progresso, nem sempre a miséria explica a fuga.
"Nicarágua é um dos quatro países mais pobres do hemisfério, mas não é um grande exportador de gente", diz Eric Farnsworth, estudioso da região e ex-assessor do ex-presidente Bill Clinton.
Entre os possíveis aceleradores de imigração, sobram dois. O primeiro é uma cláusula da complicada política imigratória americana, que acabou relaxando as normas para menores ilegais. Regulamentada em 2012, a boa nova da política afinal chegou aos grotões camponeses da América Central, onde a vida é dura e a fuga, uma promessa.
O segundo motivo é mais assustador: a violência. No ano passado, a América Latina ultrapassou a África e tornou-se a região com maior número de assassinatos no planeta. Mais de 1 milhão de latinos foram mortos entre 2000 e 2010. Pior, enquanto a taxa de homicídios caiu na África, na Ásia, na Europa e na América do Norte, a da América Latina cresceu 12% no mesmo período.
Por trás da onda de violência está o tsunami das drogas. Honduras, ostenta o pior índice de homicídios do planeta: 90 a cada 100 mil habitantes. Em El Salvador, a violência disparou com o fim de uma trégua entre gangues.
E aí está o elo entre o êxodo infantil e a sangria nas ruas. O crime consome jovens, arregimentando-os para se multiplicar e dominar suas frações de território. O resultado deixa os lares de cabeça para baixo, com pais optando por exportar seus filhos para salvá-los. E lá se vai o futuro latino-americano.
*Mac Margolis é colunista do 'Estado' e chefe da sucursal brasileira do portal de notícias 'Vocativ'
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