Criméia é novo foco de tensão entre Moscou e Kiev, dizem analistas

PUBLICIDADE

Por Renata Miranda
Atualização:

A retórica agressiva adotada pela Rússia após o conflito com a Geórgia no início do mês levantou dúvidas no Ocidente sobre quais seriam os próximos passos de Moscou com relação às ex-repúblicas soviéticas. Para analistas, porém, não há dúvidas: a região da Criméia, na Ucrânia, é o próximo alvo no tabuleiro geopolítico de Moscou. "A crise no Cáucaso deteriora as relações com outros Estados que faziam parte da União Soviética e o caso mais problemático é o da Criméia, na Ucrânia", afirmou ao Estado, por telefone, a cientista política Margarita Balmaceda, do Instituto de Pesquisas Ucranianas da Universidade Harvard. "A Rússia pode usar sua influência para criar hostilidade entre russos e ucranianos que moram na área", disse a especialista. A presença russa na Ucrânia é bastante forte - mais de 50% dos ucranianos falam russo e um quinto da população do país é de russos. A maioria vive na parte oriental do país, mais rica e urbanizada. Na semana passada, legisladores ucranianos começaram a investigar denúncias de que a Rússia estaria emitindo passaportes em massa para descendentes russos que morando na Criméia. Assim, Moscou poderia justificar uma intervenção militar na região para proteger seus cidadãos - exatamente como fez na Geórgia. A analista política Maria Lipman, do Instituto Carnegie Endowment para Paz Internacional, de Moscou, explica que a Criméia é de extrema importância estratégica para a Rússia por causa do porto de Sebastopol. "É lá onde está a Frota do Mar Negro da Rússia", disse Maria. "Apesar de a Criméia pertencer à Ucrânia, a influência russa lá é forte." A Criméia foi considerada parte da Rússia até 1954, quando, em um "ato de boa vontade", foi cedida a Kiev pelo líder soviético Nikita Kruchev, nascido na Ucrânia. No entanto, após o colapso da União Soviética, os dois países passaram a brigar pela posse do território. O conflito foi resolvido em 1997 por meio de um acordo no qual Moscou se comprometeu a pagar US$ 98 milhões por ano, até 2017, para poder usar a base de Sebastopol. Semana passada, o governo ucraniano disse que não renovará o acordo, gesto que irritou Moscou e agravou a crise. Outro motivo de tensão é a intenção da Ucrânia de fazer parte da Otan. "A Rússia deixou claro em várias ocasiões que não quer a expansão da aliança ocidental até suas fronteiras e a insistência de Kiev pode ser desestabilizador para as relações entre os dois países", afirmou Maria. Na última reunião da Otan, em abril, o então presidente russo e agora premiê, Vladimir Putin, advertiu o presidente americano, George W. Bush, que a Ucrânia poderia ser desmantelada pela Rússia se entrasse na aliança. Analistas, entretanto, acreditam que um conflito militar entre os dois países é pouco provável. "A Rússia sabe que se decidir se envolver em outra disputa na região, a reação do Ocidente pode ser mais forte", afirmou Margarita. "Se não formos cuidadosos, pode ser o início de uma nova Guerra Fria."

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.