Crise afeta equilíbrio de poder no Kremlin

Turbulência financeira estabeleceu disputa pelo controle das finanças estatais entre grupos rivais do primeiro-ministro e do presidente russos

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Por Tom Parfitt , The Guardian e MOSCOU
Atualização:

A crise financeira russa começa a desestabilizar o delicado equilíbrio de poder no Kremlin, com uma luta entre clãs rivais enfraquecendo a autoridade do premiê Vladimir Putin e agravando sua relação com seu protegido, o presidente Dmitri Medvedev, há um ano no poder. Há sinais crescentes de que um conjunto poderoso de militares e autoridades de segurança aliados a Putin esteja disputando com liberais econômicos chefiados por Medvedev o controle das finanças estatais, que estão em queda acelerada. O mercado acionário da Rússia caiu quase 80% em relação ao seu ponto máximo. Só os dez maiores bilionários russos perderam cerca de US$ 150 bilhões no ano passado. A evaporação súbita da recente riqueza da Rússia colocou os dois grupos do Kremlin em rota de colisão. Putin está numa posição incômoda. Como ex-agente da KGB (serviço de segurança da era soviética), ele é identificado com o grupo do serviço de segurança, conhecido como os siloviki, mas também tem uma forte lealdade pessoal a um pequeno grupo de liberais de sua cidade natal, São Petersburgo. Especialistas dizem que surgem fissuras na relação de Putin com Medvedev, com o premiê perdendo força na tentativa de conter o conflito entre as duas facções. "Putin costumava agir como um árbitro acima dos dois clãs principais - os siloviki e os economistas racionais", disse o analista político Dmitri Oreshkin. "Agora, ele está sendo arrastado para a luta e sob fogo de ambos os lados. Os siloviki dizem que ele é um fraco incapaz de impor sua vontade e colocar os economistas no devido lugar. Enquanto isso, os economistas estão se consolidando em torno de Medvedev." Medvedev, escolhido a dedo por Putin como seu sucessor entre acólitos leais, começou a emitir críticas veladas a seu mentor, levando alguns a acreditar que está usufruindo das prerrogativas do poder e se preparando para mostrar sua força política. Numa reunião recente com autoridades econômicas, Medvedev disse que as respostas à crise financeira estabelecidas por Putin como chefe de governo estavam "inaceitavelmente lentas". No mês passado, Igor Yurgens, diretor do Instituto de Desenvolvimento Contemporâneo, um novo think-tank criado por Medvedev, criticou Putin por restringir a liberdade de imprensa e ressaltou que "as opiniões mais honestas e independentes sobre os problemas da Rússia estão vindo da ala liberal, e não dos chamados patriotas estatistas." "Medvedev sentiu o cheirinho do poder e gostou", disse Mikhail Delyagin, ex-consultor de política econômica do governo. "Ele deu aprovação tácita para sua equipe entrar numa guerra de informação com o aparelho de Putin." O homem no centro da luta pelo poder no Kremlin é o ministro da Economia Alexei Kudrin, que advertiu os siloviki e as corporações nas quais eles têm interesses de que o Estado está limitando o resgate financeiro para grandes empresas. "Os siloviki estavam acostumados a dividir os espólios do Estado", disse Delyagin. "Eles querem se livrar de Kudrin, que não lhes dá dinheiro." A disputa interna provocou até rumores de que Putin, temendo se tornar um ponto de convergência do descontentamento público, considera a possibilidade de abandonar seu cargo.

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