11 de novembro de 2019 | 09h02
LA PAZ - A resposta para o vácuo de poder no qual a Bolívia ficou após as renúncias do presidente Evo Morales e das autoridades que poderiam sucedê-lo constitucionalmente está nas mãos da Assembleia Legislativa (o Parlamento do país) e terá que passar por um acordo político.
Evo e seu vice-presidente, Álvaro García Linera, anunciaram no domingo, em um vídeo transmitido pela TV estatal, que entregavam seus cargos. Os presidentes do Senado, Adriana Salvatierra, e da Câmara dos Deputados, Víctor Borda, ambos governistas, fizeram o mesmo. Entenda o que acontece agora no país.
Uma situação similar à de agora aconteceu na Bolívia em 2005, quando o então presidente Carlos Mesa renunciou em meio a graves conflitos sociais.
Ele havia assumido a presidência do país em 2003, após a renúncia de Gonzalo Sánchez de Lozada no chamado "outubro negro", uma revolta social contra a decisão governamental de exportar gás boliviano aos Estados Unidos através de um porto chileno.
Em meio à crise de 2005, renunciaram a seu direito constitucional de suceder Mesa os então presidentes do Senado, Hormando Vaca Díez, e da Câmara, Mario Cossío, e não havia um vice-presidente que pudesse assumir no lugar do então governante.
Quem ficou à frente da presidência foi o presidente da Corte Suprema de Justiça, Eduardo Rodríguez Veltzé, em junho daquele ano, para convocar em dezembro as primeiras eleições gerais vencidas por Evo Morales.
Esse cenário era permitido pela Constituição vigente até antes de 2009, mas a Carta Magna promulgada naquele ano por Evo não o contempla, afirmou o advogado constitucionalista Gonzalo Hidalgo.
O artigo 169 da nova Constituição boliviana estabelece a mesma linha sucessória em caso de renúncia de presidente, vice-presidente, presidente do Senado e da Câmara.
"Neste último caso, seriam convocadas novas eleições no prazo máximo de 90 dias", diz o texto. "Em caso de ausência temporária, assumirá a presidência quem exercer a vice-presidência, por um período que não poderá exceder os 90 dias."
Para Hidalgo, o mais importante agora é que as lideranças políticas do país tenham sensatez e não se afastem dos princípios estabelecidos na Constituição.
Por isso, o que deve ser feito agora é "esperar primeiro a aceitação da carta de renúncia do presidente" na Assembleia Legislativa, que deverá analisá-la em uma sessão. Até o momento, não há uma renúncia por escrito de Evo e nem de García Linera.
Diante da ausência dos presidentes do Senado e da Câmara, Hidalgo considera que a Comissão Mista de Constituição de ambas as casas deve convocar uma reunião de emergência e "definir como será formada agora uma estrutura de direção da Assembleia Legislativa", na ausência até mesmo de um vice-presidente.
Quem tem maioria no Legislativo é o partido de Evo, o Movimento ao Socialismo (MAS).
O advogado considera importante que em breve possa ser selado um acordo político, porque, embora as duas Câmaras estejam sem presidentes, "há uma representação soberana por meio dos congressistas, e eles têm que tomar uma decisão responsável, uma decisão constitucional".
"Será muito importante a responsabilidade assumida pelos políticos da Assembleia Legislativa até que se chegue a um consenso para uma saída constitucional", acrescentou.
Na manhã de domingo, Evo havia anunciado novas eleições, poucas horas depois de a Organização dos Estados Americanos (OEA) informar que encontrou, em uma auditoria, graves irregularidades nas eleições gerais de 20 de outubro, nas quais o agora ex-presidente se reelegeu para um quarto mandato em meio a denúncias de fraude por parte da oposição.
Depois de uma série de renúncias de parlamentares e ministros, Evo divulgou um vídeo no qual ele e García Linera anunciavam a renúncia de seus cargos. Os dois também denunciaram serem vítimas de um "golpe de Estado". No vídeo, o mandatário afirmou que a OEA tomou uma decisão "política", e não técnica.
Quando parecia que a renúncia de ambos poderia colocar um fim à crise que explodiu no dia seguinte ao pleito, grupos de opositores de Evo resolveram se manter em alerta, e coletivos ligados ao MAS promoveram ações de vandalismo em cidades como La Paz e El Alto. / EFE
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