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Cristina Kirchner usa e abusa da rede nacional de TV

Presidente argentina usou rede nacional onze vezes desde o início do ano

Por Ariel Palacios e correspondente em Buenos Aires
Atualização:

BUENOS AIRES - A presidente Cristina Kirchner usou a rede nacional de rádio e TV onze vezes desde o início deste ano. Destas, três ocorreram na semana passada. A lei argentina determina que a rede somente pode ser convocada para "situações graves, excepcionais, ou de transcendência institucional".

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No entanto, em metade das ocasiões desde janeiro a presidente aproveitou a interrupção nas transmissões da programação normal dos canais argentinos para falar sobre assuntos variados, como a exibição de "Cristinita" - uma boneca de pano com sua cara e com faixa presidencial, que está à venda no museu nos fundos da Casa Rosada - a inauguração de uma fábrica de tratores, a entrega de netbooks para estudantes, além de disparar críticas contra integrantes da oposição e jornalistas.

Nos 34 meses transcorridos desde outubro de 2009, quando Cristina obteve a aprovação parlamentar da Lei de Mídia, que determina a atuação dos meios de comunicação, recorreu à rede nacional em 43 ocasiões, equivalente a 1,2 por mês.

Nos outros países da região os presidentes são mais sóbrios com o uso da rede nacional. Esse é o caso do socialista José Mujica, do Uruguai, que somente usou uma única vez a rede, com o objetivo de comunicar um amplo plano de combate à criminalidade. Do outro lado da Cordilheira dos Andes, o chileno Sebastián Piñera também utilizou a rede nacional em uma única ocasião, em abril passado, quando anunciou uma reforma tributária de grande magnitude.

O uso ostensivo da rede nacional para transmitir seus discursos contrasta com a negativa da presidente Cristina em dar entrevistas aos meios de comunicação argentinos e estrangeiros. Entre as poucas entrevistas está uma conversa light concedida à modelo Naomi Campbell, publicada na revista britânica "GQ".

Assessores da presidente Cristina indicaram em diversas ocasiões ao longo destes anos ao Estado que ela carece de necessidade da imprensa para comunicar suas opiniões ou responder perguntas: "ela não precisa de intermediários, pois fala diretamente com a população desde sua tribuna". "O governo usa a rede nacional de TV porque não tem o que responder às perguntas dos jornalistas", afirma ao Estado o ex-embaixador Jorge Asís, um dos mais ácidos colunistas políticos do país e autor do livro "O pós-kirchnerismo".

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Repreensão

Cristina também usa a rede nacional de TV para disparar críticas contra todo tipo de pessoas ou instituições. Na semana passada, durante um discurso no município de General Rodríguez, ironizou sobre a calvície do ministro da Economia da Espanha, Luis de Guindos.

Exibindo a capa do jornal madrilenho "El País", afirmou: "esse careca aí". Cristina, que usa extensões capilares e tinge os cabelos (outrora negros) de acaju, também soltou um grito de repreensão a um cinegrafista que, por causa de seu trabalho, estava na frente de um grupo de pessoas do público: "ei! Você aí, ô psit! Mexe a câmera daí que (as pessoas) não podem me ver daí!".

Segundo a colunista política Susana Viau, do jornal "Clarín", "parecia mais o jeitão de uma dona de um cortiço do que da presidente de uma república".

CONTiNUA APÓS PUBLICIDADE

Há poucos dias a presidente divulgou informação confidencial sobre a receita federal, acusando o empresário imobiliário Jorge Toselli de fraudar o fisco. Toselli, na véspera, havia reclamado da política do governo sobre o dólar, que havia provocado uma queda abrupta nas operações imobiliárias. Horas depois, o CNPJ de Toselli era suspenso. A Ordem dos Advogados de Buenos Aires protestou: "o uso da rede nacional está sendo usada como instrumento de censura", já que a presidente está "utilizando esta modalidade para divulgar informação fiscal ou dados pessoais de um cidadão por ter exteriorizado uma opinião crítica".

Interação

No discurso que realizou na semana passada durante a inauguração de uma fábrica de tratores, Cristina interagiu com o público, perguntando várias vezes se em 2001 as pessoas haviam visto na mídia local anúncios sobre a iminente crise que derrubou o governo do então presidente Fernando De la Rúa. O público considerou que era uma pergunta retórica, pois ficou calado. Imediatamente, Cristina insistiu. O público, desta vez, respondeu com um "não!". Mais uma vez, Cristina voltou a perguntar: "viram algo sobre isso nos jornais???". O público, desta vez, respondeu com um sonoro "nãããoooooo!!!!".

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Claque

Uma das marcas dos discursos transmitidos em rede nacional por parte da presidente argentina é a presença sine qua non de uma claque de militantes que entoam cânticos partidários, interrompendo os discursos de Cristina nas pausas. Quando existe espaço, os militantes também levam faixas e cartazes com dizeres de respaldo à presidente. 

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