Cronograma do papa em Cuba reflete caráter político do pontificado

Após ser recebido por fiéis e realizar missa campal na Praça da Revolução, Francisco se reunirá com Raúl Castro e visitará Fidel

PUBLICIDADE

Por Felipe Corazza e Havana
Atualização:
Preparativos para a visita do Papa Francisco, na Praça da Revolução, em Havana. Na foto, movimentação em frente à Catedral de Havana, onde será realizada a missa. Foto: EDUARDO NICOLAU/ESTADÃO

HAVANA -A recepção ao papa Francisco em sua chegada a Cuba no fim da tarde de ontem seria marcada pelo tom “inevitavelmente” político de seu pontificado, mas isso não substituiria “o essencial” - o lado pastoral -, avaliou o secretário executivo da Conferência dos Bispos de Cuba, monsenhor José Félix Pérez Riera. Em sermão proferido horas antes do pouso do avião papal, Riera pediu aos cubanos que acolhessem o chefe da Igreja Católica “como a multidão que se formava em torno de Jesus”. Após o desembarque na ilha, o papa seguiria para a Nunciatura Apostólica, sua hospedagem na capital Havana durante a visita. Para hoje, além da missa campal na Praça da Revolução, está previsto um encontro com o presidente cubano, Raúl Castro, no Palácio da Revolução e uma atividade com outros sacerdotes na Catedral de Havana. Ainda que não mencionado na agenda oficial de Francisco, um encontro com Fidel Castro estava previsto. Na tarde de ontem, ainda não havia confirmação, no entanto, se a visita ao líder da Revolução Cubana ocorreria logo após a chegada do pontífice à ilha ou seria feita durante o período sem atividades no cronograma de hoje, segundo apurou a reportagem. Após a intensa programação em Havana, o papa viajará amanhã a Holguín e, no mesmo dia, a Santiago de Cuba. A passagem pela segunda cidade simboliza as intenções eminentemente diplomáticas de boa parte do cronograma papal na ilha, na avaliação do teólogo Frei Betto. “É a cidade mais próxima da base naval de Guantánamo. Há, inclusive, trabalhadores da base que vivem em Holguín e vão e voltam todos os dias”, afirmou ao Estado momentos antes da coletiva à imprensa na capital cubana.  Pousar em Holguín sinalizaria o apoio do papa a uma das duas “reivindicações pétreas” do regime cubano no processo de normalização das relações com os EUA: a devolução do território da base naval americana e o fim do embargo econômico à ilha. Persistência. Presente à missa rezada ontem pelo monsenhor Riera em preparação para a chegada de Francisco, a fiel Natalia Marquez Mesa comemorava as mudanças no discurso da Santa Sé com o pontífice que substituiu Bento XVI. “É um papa muito revolucionário. Isso (a visita) só acontece porque Deus ama muito Cuba. Francisco traz o pensamento de Jesus para o século 21”, afirmou. “Antes, havia muito hermetismo, um discurso muito fechado. Francisco derrubou isso.” Com orgulho, Natalia conta que apoiou o movimento que levou à conquista de poder por Fidel em 1959, mas nunca abandonou a fé católica, apesar do banimento das religiões imposto pelo regime comunista. Intercâmbio. Durante a noite de ontem e o início da madrugada, centenas de pessoas fizeram uma vigília diante da Catedral de Havana, para onde o papa se dirigirá na tarde de hoje horas após a missa campal. Ouvindo músicas e leituras de sermões, os fiéis se abraçavam e davam graças em voz alta pela visita do pontífice. Entre o grupo, estavam jovens cubanos que viajaram ao Brasil para a Jornada Mundial da Juventude, em 2013, com Francisco, no Rio de Janeiro. Organizador da acolhida aos jovens em Niterói, o padre Luiz Cássio Moreira veio a Havana para “retribuir a visita”. “Três papas ajudaram a abrir essas portas (em Cuba) e Francisco deu um novo passo. Esse é um processo histórico. É uma política da continuidade do processo em relação à abertura das portas de Cuba”. A cubana Carmen Lidia Alvarez, de 27 anos, esteve no Rio de Janeiro para ver o papa e participava da vigília na Catedral. “Francisco será muito especial para a juventude cubana, uma juventude que precisa de uma mensagem de esperança.”

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.