Cultivo da própria maconha cresce na Argentina

Em 2 anos, dobra o número de lojas especializadas em insumos para plantio ilegal, mas tolerado; em vigor há um ano, lei uruguaia influenciou mudanças

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Por Rodrigo Cavalheiro e correspondente
Atualização:

BUENOS AIRES - Um ano após o Uruguai ter legalizado o autocultivo da maconha, há do outro lado do Rio da Prata uma expansão de lojas especializadas em insumos e orientação para o plantio da erva. Os estabelecimentos estão dentro da lei, desde que não vendam a planta e sementes. O tipo de jardinagem que estimulam é ilegal, mas usual e em geral tolerado pela polícia.

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As chamadas “grow shops” já são cerca de 100 no país. Em meados de 2013 eram 50, segundo estimativa dos donos mais antigos. Já não vendem suas estufas, lâmpadas, fertilizantes e cachimbos em galerias ou lugares discretos, tática para evitar o enquadramento no crime de apologia. Algumas estão nos pontos mais caros dos maiores centros urbanos, à espera de agricultores sem muita intimidade com a terra, mas algum dinheiro sobrando e interesse em fumar apenas a parte mais pura da planta, a flor. 

O engenheiro Adrián, de 36 anos, há seis anos cultiva as próprias plantas, seca suas flores e chega a um produto que custa no mercado até 150 pesos (R$ 51) o grama. “Fumo 8 gramas por mês. Mesmo que me sobre algo não vendo, por princípio. Se um amigo está sem, dou. De cada dez amigos que fumam, seis plantam. Cultivo para ter algo melhor e me livrar do traficante.” 

Lojasem Buenos Aires apostam em insumos para plantio de maconha Foto: Rodrigo Cavalheiro/Estadão

A maconha prensada que ele começou a usar aos 18 anos, chamada “paraguaia” em razão da origem, custa 4 pesos o grama (R$ 1,30). Com a diferença de 40 vezes entre o valor da “industrial” e a artesanal, criou-se uma rede de tráfico em menor escala da droga mais sofisticada. 

“Quando não tenho nenhuma planta produzindo, pago 80 pesos (R$ 27) por grama a um cara que tem um sítio. Consigo esse preço porque ele faz descontos para grupos”, diz Bruno, vendedor de roupas de 32 anos. “Quando tenho de comprar maconha, gasto 800 pesos e não consigo chegar no fim do mês. Por isso estou tentando não fumar de segunda a sexta-feira. Além disso, afeta minha memória. Levanto para fazer alguma coisa, ando 10 metros e esqueço o que ia dizer”, comenta.

O aumento no plantio e do número de lojas significa que sementes entram ilegalmente no país. Em geral, elas vêm da Europa. Podem ser compradas em sites especializados de Holanda e Espanha, por exemplo, por 15 a 25 euros (R$ 52 a R$ 87). “A semente chega pelo correio, colocada em algum objeto. Mais ou menos metade fica na alfândega argentina”, estima Federico Álvarez, vendedor da Cannabis Club, no centro de Buenos Aires. Algumas lojas do ramo, especialmente as que estão começando no mercado e pretendem conquistar o cliente com o “pacote completo”, vendem sementes. Consultada pelo Estado, uma delas ofereceu três tipos, de valores entre 200 e 900 pesos (R$ 68 a R$ 310). “Aparecem 3 ou 4 novas lojas por dia no Facebook”, diz Álvarez.

Na opinião dele, a lei uruguaia que há um ano pôs nas mãos do Estado a produção, distribuição e venda da droga multiplicou a informação sobre o tema, algo decisivo para a febre dos agricultores urbanos.

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