Cúpula frustra Argentina e expõe ascensão da Colômbia

Países competem pelo posto de segunda maior economia regional; com postura concilidadora, presidente colombiano quer papel maior para o país.

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Por João Fellet
Atualização:

A 6ª Cúpula das Américas, que terminou neste domingo sem que os países participantes se entendessem sobre seus principais temas, expôs a ascensão regional da Colômbia e golpeou as expectativas da Argentina de endosso do grupo ao seu pleito pelas ilhas Malvinas (Falklands, para os britânicos). Ainda que o encontro não tenha produzido resultados contundentes - a principal decisão foi delegar à Organização dos Estados Americanos (OEA) a realização de um estudo sobre a política de combate às drogas da região -, o evento foi considerado uma vitória para os anfitriões colombianos. A algumas semanas da cúpula, a presença de vários líderes regionais importantes, como a presidente Dilma Rousseff, era tida como incerta. No entanto, só não compareceram ao evento os presidentes do Equador (Rafael Corrêa), Nicarágua (Daniel Ortega), Haiti (Michel Martelly) e Venezuela (Hugo Chávez) - os três primeiros faltaram em protesto pela ausência de Cuba no encontro, enquanto o último citou problemas de saúde. Segundo um diplomata brasileiro, a presença no evento dos líderes dos países mais poderosos da região, como Estados Unidos, Brasil e México, mostra o prestígio desfrutado atualmente pela Colômbia. Ele também diz que um dos grandes objetivos do país era mostrar que tinha condições de realizar o evento em segurança. O intento colombiano, segundo o diplomata, foi largamente alcançado. Apesar de algumas explosões em Bogotá e Cartagena, que não deixaram feridos nem produziram danos, não houve relatos de falhas mais graves na segurança. Protagonismo Desde que Juan Manuel Santos assumiu a Presidência, em 2010, ele tem reivindicado um maior papel para a Colômbia na região. Meses após tomar posse, Santos assumiu, ao lado de Chávez (desafeto de seu antecessor na Presidência colombiana, Álvaro Uribe), a liderança nas negociações para o retorno do ex-presidente Manuel Zelaya a Honduras, em 2011. Além de pôr fim às desavenças com governos esquerdistas de países vizinhos - sob Uribe, a Colômbia também se estranhava com Equador e com Cuba -, Santos desfruta de uma popularidade interna que beira os 80%, ancorada em vitórias militares contra as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e no bom momento econômico do país (o PIB colombiano cresceu 6% no ano passado). Arlene Tickner, professora da Relações Internacionais da Universidade de Los Andes, em Bogotá, diz que Santos tem se apresentado como alguém capaz de "fazer uma ponte entre norte e sul, leste e oeste". Para Tickner, trata-se de uma postura próxima à que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva mantinha na região e que, segundo ela, Dilma Rousseff não parece tão disposta a seguir. Ela afirma ainda que a ascensão de Santos preenche um vácuo de liderança na região, uma vez que os governos do Chile, México e Argentina enfrentam graves problemas domésticos e os da Bolívia, Equador e Venezuela "estão muito nos extremos para construir qualquer consenso". No entanto, a professora acredita que a Colômbia não tem um "poderio diplomático" capaz de sustentar as ambições de seu presidente. Além disso, Tickner afirma que a falha da Cúpula das Américas em produzir resultados mais concretos evidencia "a tarefa gigante" que Santos tem pela frente. "Há uma divisão tremenda na América Latina hoje. Não sei se Santos terá algum êxito em suas ambições", disse ela à BBC Brasil. Segunda maior economia As pretensões da Colômbia não se aplicam somente à diplomacia. No ano passado, Bogotá apresentou uma projeção dizendo que a economia colombiana seria a segunda maior da América do Sul em 2012, ultrapassando a Argentina. Na última Cúpula das Américas, à disputa com a Argentina pelo posto de segunda maior economia da região somou-se um estranhamento político. Em resposta a um jornalista, Santos disse que, após discursar a empresários no sábado, a presidente argentina, Cristina Kirchner, o procurou para indagar por que ele não se referira em sua fala ao pleito argentino pelas ilhas Malvinas. No domingo, Cristina decidiu não participar de uma reunião privada entre os presidentes e antecipou sua volta, atitude atribuída à falta de apoio à sua reivindicação sobre as ilhas. Santos, no entanto, disse que ela alegou "problemas na Argentina" para regressar mais cedo. Em seu discurso no final da cúpula, o colombiano afirmou que a maioria dos países apoiava uma solução pacífica para o impasse sobre as ilhas, mas não endossou o pleito argentino. Segundo diplomatas, Estados Unidos, Canadá e alguns países caribenhos se opuseram a uma declaração favorável à Argentina. A falha de Cristina em obter o apoio para a sua demanda ocorre no momento em que seu governo enfrenta um escândalo no alto escalão. A Justiça argentina investiga se o vice-presidente, Amado Boudou, intercedeu a favor de uma empresa em licitação para a emissão de moeda, o que caracterizaria tráfico de infulência. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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